Até onde vai a desarticulação política de Dilma

Data: 12 de abril de 2015

Veículo: Jornal Opção

Link direto para a notícia: http://www.jornalopcao.com.br/reportagens/ate-onde-vai-desarticulacao-politica-de-dilma-32741/ 

 

Cezar Santos

É, não é fácil o trabalho de fazer a articulação política do governo Dilma Rous­seff. Que o diga o vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB-SP), que quase fracassou na primeira missão com menos de 24 horas depois de ser colocado na função. No dia seguinte à nomeação, que se deu na terça-feira à noite, o colunista Lauro Jardim, na coluna Radar, divulgou que Temer ligou para os senadores Luiz Henrique (SC) e Roberto Requião (PR), pediu que ambos retirassem suas assinaturas da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e social (BNDES) e ouviu dois “nãos”.

A recusa dos dois senadores ao pedido de Temer foi ainda mais significativo por que ambos são do PMDB que ele, Temer, preside, e que é o principal aliado do PT. Feliz­mente, para o governo, no dia se­guinte os senadores do PSB tiraram o nome do requerimento. Se fosse instalada e levada em termos minimamente sérios, a CPI poderia revelar um atoleiro de corrupção com potencial de colocar o mensalão e o petrolão no chinelo. A oposição promete reapresentar o requerimento.

O episódio é exemplar do que se tornou o setor de articulação do governo Dilma Rousseff. Lembrando que no início da semana passada, ocupava o posto o petista gaúcho Pepe Vargas. Esquerdista dogmático, Pepe não conseguia articular nada e parecia travar uma luta feroz com o colega Aloizio Mercadante (PT-SP), da Casa Civil, para ver quem complicava mais a situação para o governo.

Aconselhado por Lula a trocar Mercadante e Pepe Vargas, Dilma achou muito e optou por defenestrar apenas o gaúcho. Mas a presidente tentou fazer essa substituição com a inabilidade que lhe é peculiar. Con­vidou o peemedebista Eliseu Padilha (RS), secretário da Aviação Civil. A notícia vazou, Pepe Vargas ficou sabendo pela imprensa, magou-se e teve um assomo de hombridade, pedindo demissão.

Aqui, cabe rememorar um episódio que confirmou a condição de ine­pto de Pepe Vargas. Após sair da articulação política, chama a imprensa pa­ra dizer que estava indo para o Mi­nis­tério dos Direitos Humanos. Em meio à entrevista, atende telefone da presidente Dilma, fica sabendo que nada havia sido confirmado, volta aos jornalistas e recua. Depois, a nomeação foi confirmada.

Dilma só agora deu o braço a torcer e lembrou-se de um aliado que ela sempre tratou com desprezo, a ponto de nunca ter convidado para reuniões políticas desde a reeleição, o vice Michel Temer. Lula já havia recomendado a Dilma que colocasse o ex-presidente da Câ­ma­ra na articulação. Convidado a­gora, o vice aceita. E imediatamente ele foi à luta com a missão de enterrar a CPI do BNDES. O que aconteceu está contado no início deste texto. A oposição, claro, fez troça.

 

“Renúncia branca”

O senador tucano Aécio Neves (MG), registou em sua página no Facebook: “Quero fazer apenas um comentário em relação a essas últimas movimentações do governo, e acho que a presidente Dilma Rousseff introduziu algo novo na vida política do Brasil: a renúncia branca. Há, hoje um interventor na economia, que pratica tudo aquilo que ela combateu ao longo de todo o seu primeiro mandato, e agora ela delega a coordenação política ao vice-presidente da República, a quem ela desprezou durante todo o seu primeiro mandato. Já é hoje refém das presidências da Câmara e do Senado na condução da agenda legislativa. E a grande pergunta que resta é: que papel desempenha hoje a presidente da República? Acredito que praticamente nenhum mais.”

O papel da oposição é esse mesmo: apontar contradições, meter o dedo na ferida. E de preferência se colocar como alternativa viável à situação. Aécio e seu PSDB até que têm apontado contradições do governo Dilma, que faz talvez o pior governo da história da redemocratização. Quanto a se apresentar como alternativa, o eleitor brasileiro vai conferir depois, se Lula não tomar do PSDB o papel de oposição. Mas essa é outra história.

Michel Temer, professor de Direito Cosntitucional, é reconhecidamente um político de diálogo, lhano. Muitos analistas o consideram o homem certo no lugar certo, embora na hora errada, por causa da impopularidade do governo Dilma. Como dialogar é sua especialidade, ele já tratou de negociar apoios e acena com cargos para os aliados, o que fez imediatamente após receber da presidente Dilma a tarefa de fazer a articulação política do governo com o Congresso. A missão de que está investido agora é distribuir cargos de segundo escalão em estatais e ministérios aos aliados, principalmente ao seu PMDB.

Na quinta-feira, Temer correu para “despachar” com Lula a indicação dos cargos, o que dá bem uma mostra do que é o governo petista. Em reunião com líderes aliados, foi assinado um documento para que deputados e senadores apoiem o ajuste fiscal. Temer também vai discutir a reforma política com os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique.

Mas, afinal, porque Dilma Rousseff não conseguiu até agora dar um mínimo de racionalidade nessa área? Afinal, ela tem um verdadeiro rolo compressor no Congresso Nacional, com a maioria absoluta dos parlamentares oficialmente governistas. A resposta (ou respostas) é simples e já foi explicitada por muitos analistas: ela não sabe e não gosta de fazer política.

E o pior é que sem gostar e sem saber fazer política, e autossuficiente, a presidente coloca pessoas tão “destraquejadas” quanto ela na função. Lembrando no primeiro governo foram Ideli Salvatti, Gleisi Hoffmann, Luiz Sérgio, entre outros. No segundo governo, Aloizio Mercadante — a quem Lula conhece e justamente por isso nunca o colocou em nenhum posto em seus dois governos — e Pepe Vargas. Agora, com Michel Temer, há um político que conhece o ofício. Se vai ter sucesso ainda é cedo para avaliar, porque depende de até onde Renan Calheiro e Eduardo Cunha vão se deixar controlar.

 

PMDB quer pasta com recursos financeiros

O professor Francisco Tavares, coordenador do mestrado em Ciência Política da Universidade Federal de Goiás (UFG), não tem dúvida em apontar a inabilidade da presidente como o fator mais contundente na crise de governo porque passa a gestão de Dilma Rousseff nos primeiros dias de mandato. Falta, diz ele, habilidade do governo em manter ou trazer o PMDB como uma força minimamente disciplinada na sua base de sustentação.

O acadêmico desvenda rapidamente a “alma” do aliado governista PMDB para explicar a causa da crise. Ele afirma que o movimento de convidar Eliseu Padilha para a articulação política foi pouco perspicaz no sentido de dar maior estabilidade, no que tange ao PMDB, como base do governo. “Tudo que o partido quer e quis na história recente do País é aparelho de governo, cargos, recursos, influência. E todo o mundo sabe que a articulação política é uma pasta sem orçamento, sem recursos, então não é um atrativo interessante para o PMDB.”

O professor lembra uma frase dita pelo líder do PMDB na Câmara, deputado Leonardo Picciani (RJ), ao expressar que a articulação é uma pasta em que o político pode ser “queimado”. Na verdade, a hipótese Michel Temer na articulação política já vinha sendo cogitada antes.

Mas luminares do próprio partido diziam que Temer já estava articulando politicamente era o governo, como no caso da tabela do imposto de renda e no meio de campo com o partido no pacote do ajuste fiscal do ministro Joaquim Levy. Esses peemedebistas achavam que não seria o caso de assumir mais um campo nessa área de articulação que, é “pepinosa” num governo que perde popularidade a cada dia.

Segundo Francisco Taveira, trazer agora o Michel Temer para essa função pode ser interessante para o governo, porque vai corresponsabilizar o PMDB com suas medidas. Ou seja, fica mais caro para Renan Calheiro e Eduardo Cunha obstruir a agenda de Dilma, na medida em que para fazer isso eles terão de criar um problema no partido, desautorizando e entrando em rota de colisão como Temer. “Digamos que esse é o trunfo da presidente, mas que comporta também um risco, porque se nem o Temer conseguir controlar o PMDB, aí definitivamente, o partido sai da base e o governo de Dilma perde o controle das ações políticas.”