Torcedor rival ficou sem eira nem bandeira

Data: 04/11/15

Veículo: O Popular

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Relíquia que rodou o mundo desaparece durante jogo no Serra Dourada

04/11/2015 19:39Arquivo Pessoal

Narinho Costa com a bandeira na Espanha

Fabrício Cardoso

 

Não foi só o direito de disputar a decisão da Série C que o Brasil de Pelotas perdeu no Serra Dourada. Houve também uma perda de inestimável valor sentimental, pelo menos para o torcedor Narinho Costa, gaúcho radicado há 11 anos em Brasília. Naquela noite de Finados, enquanto triturava as unhas à espera dos pênaltis, Narinho viu um colorado saltar do anel inferior para pegar a bandeira do clube, fixada pelo peso dos copos de cerveja no parapeito da arquibancada. Atônito, Narinho se recompôs em tempo de avistar o sujeito desaparecendo em meio à maior multidão registrada num estádio goiano em 2015.

- Ainda derrubaram a nossa birita – lastima Narinho, tentando minimizar a dor que lhe acompanha desde então.

Não foi um pano qualquer, este furtado no Serra Dourada. Comprada no final dos anos 90, antes portanto da migração do dono para o Centro-Oeste, a bandeira adquiriu status de estimação. Era um elo concreto com a terra natal deixada para trás. Além de acompanhá-lo nos jogos do Xavante, serve de vestimenta nas viagens de turismo. Porque os torcedores do clube gaúcho se comportam como missionários, pregando a paixão para um público, na maioria das vezes, desinteressado destas loucuras.

Certas férias, Narinho ameaçou desistir de visitar a Sagrada Família, em Barcelona, um portento da inteligência humana, depois de o guarda da igreja sugerir o confisco da bandeira.

- Aquele trapo vale mais do que o Gaudí – disse sobre o arquiteto catalão, dedo em riste, para desespero da mulher, Marione, que não esconde uma ponta de ciúme da bandeira.

Foram tantas as histórias colecionadas com o manto que ele adiou o retorno a Brasília logo após a derrota para o Vila. Pernoitou mais uma vez em Goiânia para, num dia útil, conversar com a administração do Serra Dourada. Lá, recebeu palavras de incentivo e a promessa de esforço para que um pavilhão do Rio Grande do Sul com um distintivo do Brasil de Pelotas não seja confundido com lixo – que seria a interpretação mais razoável de parte da turma de limpeza do estádio.

A gerente do Serra Dourada, Izabella Maia, confirma a orientação de cuidado no sentido de achar a bandeira perdida. Porém, como a faxina do estádio é terceirizada para presidiários, num convênio com a Secretaria de Segurança, o balanço do que foi eventualmente encontrado é realizado uma vez por dia. Até o fechamento desta edição, nenhuma notícia capaz de acalmar a alma de Narinho surgiu nos lados do Jardim Goiás.

Com o coração em frangalhos, o xavante retornou à capital federal, mas liga diariamente para o Serra Dourada. Também pediu apoio dos torcedores xavantes residentes em Goiânia. Professor de Museologia da Universidade Federal de Goiás, Pablo Lisboa é fundador do núcleo “Xavantes de Goiás”, a Xagô. Lisboa prometeu ajuda no resgate da relíquia.

- Diferente destes clubes milionários, que estimulam o descartável lançando uma camisa por semestre, nós humanizamos os objetos, nos damos alma a eles através do convívio. Sei que o torcedor do Vila também é assim. Por isto temos esperança de reencontrar a bandeira.

Arquivo Pessoal

Narinho e a bandeira pelo mundo