Estudos na UFSCar analisam ação de metais no tratamento de câncer e doenças parasitárias

Data: 25/04/2016

Veículo: Jornal Dia Dia

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Katia, Legna e Batista desenvolvem pesquisas com metais de transição. Foto: Enzo Kuratomi

Pesquisas do Departamento de Química da Universidade desenvolve moléculas que apresentam propriedades de interação com estruturas celulares e tecidos biológicos

Compostos metálicos têm diversas aplicações na Medicina, tanto no diagnóstico, quanto no tratamento de doenças. Por exemplo, complexos de zinco e alumínio são utilizados como antiácidos, complexos de cobre atuam como fungicidas, complexos de platina são utilizados no tratamento do câncer e complexos de gadolínio são utilizados como agentes de contraste para exames.

Nesta linha de atuação, estudos realizados no Departamento de Química (DQ) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) sintetizam e avaliam a ação de compostos de metais de transição e o seu potencial no desenvolvimento de fármacos contra câncer e doenças negligenciadas causadas por parasitas, como malária, tuberculose e Doença de Chagas.

Estas pesquisas são coordenadas pelo professor Alzir Azevedo Batista, do DQ, e contam com participação de alunos do Programa de Pós-Graduação em Química da Universidade, bem como com colaboradores de outros departamentos da UFSCar, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Unesp de Araraquara e Universidade Federal de Goiás, Instituto Fiocruz de Salvador e a Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Os estudos coordenados pelo professor Batista se concentram no desenho e obtenção de compostos de metais de transição que possibilitem sua interação com moléculas biológicas, como DNA, topoisomerase, albumina e paredes celulares de parasitas, por exemplo, com maior eficácia e menor toxicidade ao paciente.

Os compostos de metais de transição são factíveis de serem facilmente modulados para formar outros, com propriedades desejadas, com atividades farmacológicas expressivas e promissoras. “Um aspecto interessante que vale a pena mencionar é que quando estes compostos têm em suas estruturas moléculas que já apresentam propriedades farmacológicas, estas propriedades podem ser potencializadas, tornando-as mais eficientes.

Em alguns casos, os compostos em si funcionam apenas como carregadores destas moléculas, entregando-as a determinados alvos, para que aí desenvolvam suas propriedades farmacológicas. Em resumo: estes compostos apresentam propriedades químicas ricas”, explica o docente.

No Departamento Química da UFSCar são realizados os processos de síntese, purificação e caracterização dos compostos. Os principais estudos orientados pelo professor Batista envolvem os metais de transição cobre, paládio, platina e principalmente o rutênio. “Procuramos testar esses compostos contra células tumorais e parasitas e também analisar como eles atuam no organismos. Destes metais apenas o cobre é um elemento essencial, mas o rutênio apresenta características semelhantes ao ferro, por isso é bem tolerado nos sistemas biológicos”, aponta o docente.

Dentre as propriedades farmacológicas dos compostos metálicos estão a capacidade de inibição da divisão celular, por diversos mecanismos e danos às estruturas dos parasitas.

Batista explica que metais de transição podem assumir cargas variadas e isso possibilita uma grande variedade de compostos que podem ser sintetizados, com diferentes composições e estruturas, portanto, com variadas propriedades físico-químicas e farmacológicas.

O docente conta que o uso de metais de transição já é amplamente utilizado na produção de fármacos. A cisplatina, por exemplo, é formada por um metal de transição, a platina, que apresenta grande afinidade com o DNA e inibe a divisão de células tumorais. É um dos principais quimioterápicos usados no tratamento de vários tipos de câncer.

Os estudos orientados pelo professor Batista analisam a ação biológica de compostos com o metal rutênio, por exemplo, que apresenta um conjunto de evidências sobre suas propriedades antitumorais, com menor efeito tóxico por agirem mais especificamente contra as células tumorais.

Estudos desenvolvidos por Katia Mara de Oliveira, por exemplo, aluna de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Química da UFSCar, analisaram a ação antitumoral de um composto formado por rutênio e outros dois compostos orgânicos, o lapachol e a lausona, extraídos, respectivamente do Ipê roxo e da hena.

Durante o mestrado, Kátia verificou que a adição do rutênio em compostos orgânicos aumentou em mais de mil vezes a ação do composto orgânico, em linhagens celulares tumorais. “O lapachol e a lausona não tiveram atividade nas linhagens celulares avaliadas em concentrações de 100 micromolar, entretanto, os compostos contendo rutênio, e estas moléculas, apresentaram atividade bem elevada em concentrações na ordem de 60 a 90 nanomolar.

No doutorado, aprofundamos os estudos, com síntese de novos compostos e fizemos testes em linhagens de células de câncer de mama, próstata e pulmão e os compostos foram mais ativos em células de câncer de mama”, conta a doutoranda. Katia explica que os compostos apresentaram resultados laboratoriais promissores no processo de apoptose das células tumorais, que é o mecanismo celular de morte programada que não estimula ações inflamatórias, nem necrose tecidual.

Além disso, os compostos também apresentaram maior seletividade, com ações mais direcionadas contra células tumorais, além de inibir a migração celular que pode causar a metástase. Os estudos têm continuidade e vão analisar os mecanismos envolvidos no processo de apoptose e como os compostos de lapachol e lausona, com adição de rutênio, atuam contra a célula tumoral.

Além de estudos com câncer, as pesquisas realizadas no Laboratório também analisam a ação dos compostos metálicos no tratamento de doenças parasitárias, como tuberculose e malária, por exemplo. Os estudos são desenvolvidos pela doutoranda do PPGQ, Legna Andreina Colina Vegas. “Avaliamos que os compostos organometálicos foram muito efetivos contra o parasita da malária, com a vantagem de serem seletivos e não provocarem danos às células normais.

Agora estamos avaliando a ação em outros parasitas e temos resultados promissores contra Tripanossoma cruzi e leishmânia”, conta a pesquisadora.

O professor Batista destaca a importância das parcerias com outras universidades e centros de pesquisa para o desenvolvimento dos estudos, além de estudantes vindos de outras universidades. “O nosso trabalho envolve várias interfaces.

O desenvolvimento de um fármaco envolve uma gama de experimentos que exigem pesquisadores de várias áreas, como químicos, biólogos, farmacêuticos e matemáticos, por exemplo. Por isto, sempre procuramos colaborações com diversificados pesquisadores que possam contribuir e enriquecer nossas pesquisas e avançar rumo ao desenvolvimento de um fármaco que possa atender às necessidades de nossa população”, conclui o professor, acrescentando que para a realização dos estudos também há colaboração de colegas da Universidad de La Habana, em Cuba.