MPF investiga cobrança de taxa e remédio em fertilização in vitro

MPF investiga cobrança de taxa e remédio em fertilização in vitro

Laboratório de reprodução humana do HC não fornece medicamentos e cobra taxa para equipamentos

Vinicius Jorge Sassine

O tratamento para infertilidade no Hospital das Clínicas (HC) da Universidade Federal de Goiás (UFG), nas situações em que os casais dependem da fertilização in vitro, custa pelo menos R$ 5 mil a homens e mulheres que não conseguem ter filhos, apesar do custeio do tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Ministério Público Federal (MPF) em Goiás abriu dois inquéritos civis públicos para investigar a cobrança pelo HC de uma taxa de R$ 1,3 mil, dinheiro que seria utilizado para o pagamento de instrumentos necessários à fertilização em laboratório, e de cerca de R$ 4 mil por medicamentos que estimulam a ovulação da mulher.

Quatro mulheres que fazem o tratamento no Laboratório de Reprodução Humana do HC – único no Estado a oferecer atendimento para infertilidade pelo SUS – procuraram o MPF no fim do ano passado, separadamente. Elas relataram que o HC cobra a taxa para o custeio de equipamentos e não fornece os medicamentos, em especial o Lupron, o Gonal e o Ovidrel. Os remédios são importados e, para uma única tentativa de fertilização in vitro, custam cerca de R$ 4 mil.

A partir dos relatos apresentados pelas quatro mulheres, o MPF instaurou os dois inquéritos civis públicos. O procurador da República Ailton Benedito de Souza, da área de Direitos do Cidadão, cobrou explicações do HC e do Ministério da Saúde, em ofícios já enviados à diretoria do hospital e ao secretário executivo do ministério. O que o MPF investiga é a suposta ilegalidade da cobrança da taxa e a necessidade de os pacientes comprarem os medicamentos exigidos. Ailton Benedito quer que o Ministério da Saúde informe se o SUS tem a obrigação legal de fornecer os remédios.

“O prazo estipulado nos ofícios para o fornecimento das informações é de dez dias”, afirma o procurador. O POPULAR ouviu três das quatro mulheres que fazem o tratamento no Laboratório de Reprodução Humana do HC e que decidiram procurar o MPF diante da cobrança pelos medicamentos e pelos equipamentos usados na fertilização in vitro. Todas elas dizem não ter os R$ 5,3 mil necessários para a compra dos remédios e dos instrumentos usados na técnica de laboratório. Para essas mulheres, que tentam há anos engravidar, o tratamento está interrompido.

À espera
A história de uma das quatro pacientes, a feirante Lionice Maria Cruz, de 40 anos, foi mostrada ontem pelo POPULAR. Reportagem do jornal revelou o resultado de pesquisas inéditas, que associam o consumo de álcool e cigarro à infertilidade masculina. Outros estudos indicam fatores genéticos como causa da infertilidade. As pesquisas foram feitas pelo Grupo de Genética Molecular da Pontífica Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), com base em amostras de sangue de pacientes do HC.

Lionice já está na quarta tentativa de engravidar por meio da fertilização in vitro. Em cada uma das tentativas, gastou pelo menos R$ 4 mil. “Eu só procurei o Ministério Público porque não tenho mais dinheiro. O próprio médico falou que essa era minha única saída”, diz a feirante.

Depois de engravidar de forma natural por três vezes, e perder o bebê nas três ocasiões, a dona de casa Eliene Caldeiras de Souza, de 32, procurou auxílio no Laboratório de Reprodução Humana do HC. O marido de Eliene, Delismar, é costureiro, e não tem dinheiro para um tratamento de fertilidade particular. No HC, o casal também não conseguiu a gratuidade integral do tratamento.

“Só os medicamentos custam R$ 4 mil, mais a taxa de R$ 1,3 mil. Nós não temos esse dinheiro”, diz Eliene. “O tratamento está parado e o tempo, passando.” Eliene e Delismar tentaram garantir os medicamentos a partir da representação ao MPF.
A dona de casa Sirlene Rodrigues de Melo, de 34, teve a mesma iniciativa. Sem dinheiro para comprar a injeção de hormônio que estimula a ovulação, necessária para a fertilização in vitro, Sirlene espera que a Justiça garanta o fornecimento do medicamento. Antes de partir para a fertilização in vitro, ela tentou a técnica de inseminação, sem êxito. A primeira técnica custa R$ 1,3 mil no HC, além dos medicamentos. A segunda, R$ 160, segundo Sirlene.

A dona de casa iniciou o tratamento de reprodução assistida há três anos, em razão de uma endometriose (doença a partir do útero que provoca infertilidade feminina).

 

Dinheiro vai para conta de fundação

Vinicius Jorge Sassine

Os casais que dependem da fertilização in vitro (os chamados bebês de proveta) para ter filhos e que procuram o Hospital das Clínicas (HC) da Universidade Federal de Goiás (UFG) são informados sobre a necessidade de um depósito de R$ 1,3 mil na conta da fundação do hospital, além do custeio de medicamentos fundamentais para o êxito do tratamento. De acordo com o diretor do Laboratório de Reprodução Humana do HC, Mário Approbato, o dinheiro é utilizado para a compra de material de insumo de uma empresa em São Paulo. É esse material que garante a realização da técnica em laboratório.

“A compra é feita por meio da Fundação do Hospital das Clínicas. Não há como os pacientes comprarem diretamente da empresa de São Paulo”, diz Mário Approbato. Segundo o diretor do laboratório, o Sistema Único de Saúde (SUS) não custeia nenhum procedimento de reprodução assistida, o que inclui os equipamentos utilizados para a técnica e os medicamentos necessários para o êxito da fertilização.

A compra dos medicamentos – injeções de hormônios que fazem aumentar a quantidade de óvulos na mulher – também é intermediada pelo HC, em alguns casos. Segundo o diretor do Laboratório de Reprodução Humana, a negociação garante 40% de desconto na aquisição dos remédios.

Por meio da assessoria de imprensa, o Ministério da Saúde (MS) confirmou que os medicamentos Lupron, Gonal e Ovidrel não são custeados pelo SUS. Essas injeções de hormônio são as mais caras, como relataram as quatro mulheres que procuraram o Ministério Público Federal. O MS informou que o SUS cobre alguns procedimentos de reprodução humana.