Metade das pessoas tem sobrepeso

O Popular - 28/08/2010

Pesquisa do IBGE mostra que em 15 anos jovens brasileiros estarão tão obesos quanto os americanos

Maria José Silva

A população goiana está cada vez mais acima do peso. Uma pesquisa sobre o estado nutricional da população brasileira, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde, divulgada ontem, constatou que nas duas últimas décadas houve aumento considerável de peso em homens e mulheres residentes em diferentes municípios do Estado.

O estudo, denominado Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), constatou que excesso de peso atinge 51% dos homens e 45,6% das mulheres da Região Centro-Oeste, de todas as idades. Já a obesidade, considerada grave problema de saúde pública, foi verificada em 13,3% da população masculina e em 16,3% das mulheres que moram nos Estados do Centro-Oeste.

A situação predominante em Goiás e na Região Centro-Oeste segue uma tendência observada em todo o País. De acordo com o estudo, o excesso de peso e a obesidade são encontrados com grande frequência em todos os grupos de renda, de diferentes faixas etárias e em todas as regiões brasileiras.

Jovens - 
O professor de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), Carlos Monteiro, que atuou como consultor do IBGE, assinala que o mais preocupante é a tendência de aceleração, principalmente entre os jovens. "O peso das pessoas está aumentando mais nos últimos anos do que vinha aumentando antes. Fazendo uma projeção com o aumento de um ponto porcentual por ano, no prazo de 10 a 15 anos o padrão das crianças e adolescentes brasileiros será o americano."


A nutricionista Estelamaris Mônego, professora da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Goiás (UFG), acentua que o sobrepeso e a obesidade na infância, adolescência e idade adulta estão intimamente relacionados ao abandono do aleitamento materno pelas mulheres de todas as classes sociais nas últimas décadas. "Infelizmente, as mães, de maneira geral, têm oferecido aos seus bebês fórmulas e produtos que os fazem engordar", destaca. Ela cita como principais exemplos a farinha adicionada à mamadeira e o suco adocicado.

Estelamaris Mônego enfatiza que o leite materno tem todos os nutrientes que a criança precisa nos primeiros meses de vida. O fornecimento de alimentação inadequada, repara a nutricionista, prossegue com o crescimento da criança.

Os pais passam a oferecer aos filhos cada vez mais alimentos industrializados, com grande densidade de calorias como refrigerantes, bolachas recheadas e salgados em sacos em geral.

Hábitos modernos contribuem

O médico endocrinologista Nelson Rassi, preceptor de internato da Faculdade de Medicina da UFG e professor convidado da Universidade de Miami (EUA), vincula o sobrepeso e a obesidade às mudanças dos hábitos de vida, entre as quais as alterações na alimentação, avanço da tecnologia e mudança nas estruturas familiares.
"Nas últimas décadas, as pessoas de maneira geral e os jovens, em particular, passaram a comer de forma diferente e inadequada. Em vez de arroz, feijão, carne e salada, passaram a saborear a comida americanizada, rica em caloria, gordura saturada e carboidratos", sublinhou. A chegada dos fast food nas pequenas cidades, destaca o endocrinologista, é vista como sinal de progresso. Ir a esses locais passou a ser, nos últimos anos, programa de família.

Nelson Rassi assinala que tais alterações passaram a ser mais evidentes com o avanço socioeconômico rápido, ocorrido a partir do Plano Real e da estabilização da economia no País - a pesquisa revela, inclusive, que a renda está diretamente ligada ao sobrepeso (veja quadro). Pessoas das classes sociais mais baixas ingressaram de forma intensa no "mundo do supermercados" e passaram a ter acesso a iogurtes, bolachas recheadas e refrigerantes, entre outros itens.

O avanço da tecnologia e, em consequência, o uso cada vez mais prolongado de computador e da televisão, também têm interferido de forma significativa no sobrepeso e obesidade da população.
Nelson Rassi observa que as crianças passaram a brincar e a correr menos devido à presença cada vez maior dos eletroeletrônicos e produtos de informática em casa e à diminuição das áreas de lazer. Hoje, assinala o endocrinologista, crianças e adolescentes praticam esporte por uma hora, três vezes na semana. "O restante dos dias eles ficam em frente à TV e ao computador, comendo sanduíche e batata frita."

Excesso de peso também entre as crianças

Realizada em todo o País entre 2008 e 2009, a Pesquisa de Orçamentos Familiares constatou que uma em cada três crianças de 0 a 5 anos tem excesso de peso. Além disso, o estudo verificou que um quinto dos adolescentes está com peso acima do padrão internacional estabelecido pela Organização Mundial de Saúde.

Em Goiás, a pesquisa também apresenta resultados preocupantes. A média de peso das crianças de 6 anos do sexo masculino passou de 20,4 quilos em 2002 para 22,7 kg em 2008. Já os adolescentes de 14 anos, também do sexo masculino, passaram da média de 51,2 quilos para 56,5 quilos. Nas mulheres de 13 anos, o peso médio passou, no mesmo período, de 43,2 quilos para 47,4 quilos.

Aos 18 anos, a estudante universitária Paula Cristina Alves ostenta 93 quilos distribuídos em 1,60 metro de altura. Ela informa que é "gordinha" desde a infância, mais por fatores genéticos do que por alimentação inadequada. "Normalmente eu tomo o café da manhã, almoço e às vezes lancho à noite", acentua, enfatizando que não gosta de doces, de fritura nem de alimentos gordurosos.

Paula Cristina diz que não costuma fazer "dietas loucas" e que se sente bem no convívio social. "Não fico depressiva por causa da obesidade", destaca.

A jovem diz que tem uma rotina corrida. Pela manhã, ministra aulas em uma escola do ensino fundamental. À tarde, trabalha como atendente e durante a noite assiste aulas na faculdade.

Jovens têm problemas de saúde de gente mais velha

O médico endocrinologista Nelson Rassi, preceptor da Faculdade de medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG), destaca que o aumento de peso traz graves consequências à saúde. "Fatores de risco como a hipertensão e as altas taxas de colesterol e triglicérides e doenças como o diabetes, antes comuns em pessoas na faixa dos 50 anos e dos 60 anos, passaram a incidir entre os jovens", sublinha.

O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, observou que os dados sobre excesso de peso relatados na pesquisa são "preocupantes" e "acendem um alerta vermelho" em todo o Brasil.

"Excesso de peso, obesidade e falta de atividade física projetam hipertensão arterial, diabetes, enfarte, acidente vascular cerebral, câncer e afetam profundamente a qualidade de vida", disse o ministro, acrescentando que o Brasil se aproxima "perigosamente do mesmo nível dos Estados Unidos".

A nutricionista Estelamaris Mônego, professora da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Goiás, aponta a necessidade de uma mudança de postura alimentar por parte das famílias goianas e brasileiras. "É importantíssimo que pais e mães estimulem seus filhos a se alimentarem melhor", pontua.

A nutricionista também chama a atenção dos responsáveis pelas escolas, principalmente das particulares. "Nestes estabelecimentos a prática é bem diferente do discurso repassado aos alunos", destaca a professora, ao relatar que as lanchonetes dos colégios privados costumam vender com muita frequência refrigerantes, salgados e alimentos industrializados (Com agências).