Goiânia, a cidade mais desigual

Estudo da ONU aponta a capital como a cidade da América Latina com a maior concentração de renda

Estudo divulgado ontem pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) coloca Goiânia, mais uma vez, no topo do ranking das cidades mais desiguais da América Latina. Entre as dez metrópoles mais desiguais da região, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), cinco são brasileiras: além de Goiânia, integram o ranking Fortaleza (CE), Belo Horizonte (MG), Brasília (DF) e Curitiba (PR) (veja quadro). Há dois anos, outro estudo divulgado pelo programa já apontava a capital como a 1ª em desigualdade no País e a 10ª mais desigual do mundo.

A metodologia utilizada pelos pesquisadores para chegar aos resultados considera, como medida da desigualdade social, o Índice de Gini. O indicador varia de 0 a 1, sendo 0 a menor desigualdade e 1 a desigualdade total (veja quadro). No estudo da ONU, Goiânia aparece com Índice de Gini igual a 0,65, considerado extremamente elevado. Fortaleza, segunda cidade mais desigual da América Latina, tem Gini de 0,60.

Quatro fatores compõem o índice que define quão desigual é uma localidade: renda per capita, nível educacional, expectativa de vida e o índice de pobreza multidimensional – que leva em conta indicadores como acesso à saúde, qualidade de vida e de serviços de transporte, lazer, saneamento público, segurança, entre outros. O estudo traz ainda dados sobre urbanização dos grandes centros urbanos, habitação, meio ambiente, desenvolvimento econômico, entre demais indicadores de qualidade de vida.

MIGRAÇÃO

O geógrafo e professor do Instituto de Estudos Socioambientais da Universidade Federal de Goiás (Iesa-UFG), João Batista de Deus, destaca que Goiânia e Brasília, duas entre as cinco cidades mais desiguais da América Latina, segundo a ONU, estão inseridas numa região de grande fluxo migratório, sobretudo de pessoas das Regiões Norte e Nordeste do País. “A população que migra para a Região Central do Brasil é formada por pessoas de baixa renda, baixa qualificação e baixo nível educacional, o que reforça os índices de desigualdade”, frisa o geógrafo. No caso de Brasília, os altos salários pagos na capital federal, centro nacional do poder, de um lado, e os grandes bolsões de pobreza, de outro, justificam o alto índice de desigualdade detectado pela ONU. Já Goiânia se destaca como cidade-polo em Goiás e referência para as demais regiões das porções Norte e Nordeste do Brasil. “A capital é um centro regional de serviços e base de comando de muitas empresas nacionais e internacionais, o que leva à concentração de riqueza”, afirma o professor do Iesa.

Professor da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás, o sociólogo Dijaci David de Oliveira explica que o que acentua a condição de Goiânia como cidade extremamente desigual é a falta de distribuição de renda na capital. “Há cidades onde há muita riqueza, mas onde também há distribuição da renda”. No caso de Goiás, avalia o sociólogo, a força do agronegócio dificulta essa distribuição. Diferentemente de localidades altamente industrializadas, onde há, de acordo com o professor, natural distribuição de renda entre as carreiras, existentes em maior número e diversificação. O Produto Interno Bruno (PIB), o conjunto da riqueza produzida, nesses casos, sofre uma distribuição mais eficaz do que no caso de regiões voltadas para o agronegócio, reforça o sociólogo.

Do mesmo modo, cita, Goiânia é uma cidade com mercado imobiliário extremamente forte. “Mas é um mercado concentrado nas mãos de poucos”, ressalta. Por outro lado, afirma, há também na capital uma concentração acentuada dos serviços. “Esses serviços são acessados por uma parcela pequena da sociedade, o que reduz qualidade de vida e consequentemente contribui para a redução da renda.”

OUTRO CENÁRIO

O professor João Batista de Deus cita o investimento em instituições de ensino capazes de formar as atuais e futuras gerações para o mercado de trabalho como uma saída para o desfavorável cenário apontado pela ONU para Goiânia. “É preciso encontrar mecanismos de se qualificar a população que veio em busca de melhores condições de vida em Goiás, bem como os filhos dessa geração, para que elas possam trilhar um outro caminho”, frisa. O geógrafo chama a atenção também para a necessidade de investir em melhoria dos serviços urbanos, como infraestrutura de saneamento e acesso à saúde de qualidade.

O sociólogo Dijaci de Oliveira destaca que o cenário apontado pela ONU obriga os gestores a olharem para o desenvolvimento do Estado de Goiás, promovendo investimento maciço nas cidades médias. “Não se pode voltar os olhos apenas para Goiânia. Se a capital continuar a atrair tanto assim as pessoas, daqui a dez anos teremos um quadro ainda pior”, destaca. Para ele, há de se promover a expansão de serviços públicos, gerar condições para que as famílias possam trabalhar e melhorar suas rendas em suas próprias localidades.

Fonte: O Popular