Historiador lança edição ampliada

Professor da UFG, o baiano de Alagoinhas Romualdo Pessoa Filho, 55 anos, radicado em Goiás há 40 anos, primeiro em Morrinhos e depois em Goiânia, relança Guerrilha do Araguaia – A Esquerda em Armas, numa edição revista e ampliada. Segundo ele, o conteúdo da primeira edição, publicada com 220 páginas pela Editora da UFG, em 1997, era sua dissertação de mestrado, defendida em 1995, fruto de pesquisas iniciadas em 1992 em torno do movimento guerrilheiro na região do Bico do Papagaio.

“Quando eu defendi a dissertação, era muito difícil obter depoimentos e encontrar documentos, mas mesmo assim a história oral das pessoas que viveram na região possibilitou um trabalho que foi referência como primeiro estudo acadêmico do assunto sobre a revolta de origem popular”, lembra o ex-militante do PCdoB e que já foi diretor da UNE.

Formado em História em 1988 pela UFG, Pessoa se interessou pela guerrilha depois de morar em Araguaína, onde lecionou no ano de 1989. “De lá até Xambioá são apenas 120 quilômetros e pude conviver com pessoas que estiveram ligadas ao conflito, cuja existência foi negada durante muito tempo”, diz. Na nova obra, de 340 páginas, o autor lembra que a Guerrilha do Araguaia foi encarada por anos como uma pequena revolta de terroristas e que demorou muito até que as execuções dos guerrilheiros pelas Forças Armadas fossem admitidas publicamente. Conforme o autor, a guerrilha começou a ser planejada em 1968, quando chegaram os primeiros combatentes no Norte Goiano, hoje Tocantins. O primeiro confronto da guerrilha ocorreu em abril de 1972 e o movimento armado durou até 1974.

“Com esta obra, eu quis mostrar a história da guerrilha e enfatizar que, se há democracia, não existe luta armada. O leitor verá como a falta de democracia é capaz de inibir a organização da sociedade para a participação do processo político e como era a perseguição a essas pessoas que confrontavam e exigiam direitos e melhorias de vida”, opina.

Segundo Pessoa, a nova edição da obra é enriquecida por documentos e relatos a que ele teve acesso depois que foi convidado, em 2009, para integrar um grupo de trabalho do Ministério da Defesa formado para investigar a história de guerrilheiros e realizar expedições a locais do conflito onde possam estar enterrados os corpos de desaparecidos. “Com isso, a obra surge com um olhar atual que também dá voz para populações que vivem na região dos conflitos, muitos camponeses e pessoas que de alguma forma tiveram suas vidas vinculadas à guerrilha”, acrescenta.

Um dos personagens desnudados na obra de Pessoa é Miqueias Gomes, o Zezinho do Araguaia, que tem 70 anos e hoje mora em Goiânia. “Ele é um dos poucos sobreviventes e recebeu treinamento na China. Este guerrilheiro era amigo do Divino Ferreira, morto depois de lutar na guerrilha.” Em seu livro, Romualdo Pessoa descreve o processo de localização e de identificação do corpos de guerrilheiros como a paulista Maria Lúcia Petit, morta na primeira fase do conflito, e do cearense Bergson Gurjão, ambos enterrados em um cemitério de Xambioá.

LENTIDÃO

“O processo para localizar corpos é muito lento e ganhou aceleração somente quando a juíza Solange Salgado obrigou o Estado a dar resposta aos familiares sobre o paradeiro de corpos das vítimas. Isso seria possível se o Estado tivesse preservado seus arquivos, mas tudo ainda é muito lento e vários corpos estão em Brasília à espera de identificação”, diz o historiador.

Outro personagem retratado no livro é o major Curió (Sebastião de Moura), acusado de ser um dos principais perseguidores e torturadores dos guerrilheiros. “Ele foi prefeito, deputado federal, interventor em Serra Pelada e até deu nome a uma cidade: Curionópolis”, lembra o historiador. Sobre a condenação do ex-deputado federal José Genoíno, que lutou na guerrilha, no processo do mensalão, Pessoa faz a seguinte avaliação: “O que ele fez não deixa de ser crime, mas não utilizou dinheiro público para enriquecimento pessoal. Sua atuação condenável, por ele ter dado aval ao esquema de transação de dinheiro público para bancar apoio, é decorrente de um sistema eleitoral deficiente. Acho que vários outros precisavam ser punidos.”

Fonte: O Popular