Fim do processo gera expectativas

Especialistas acreditam que condenações de poderosos devem mudar a imagem da justiça brasileira

 

A condenação dos réus do caso mensalão e o início do cumprimento das penas impostas pelos ministros do Supremo Tribunal Federal terão uma função pedagógica: servirão de exemplo para outros criminosos do colarinho branco, exatamente aqueles que não têm o estereótipo do criminoso, que a população tem dificuldade em enxergar como criminosos. A avaliação é do procurador da República Hélio Telho, coordenador do Núcleo de Combate à Corrupção da Procuradoria da República em Goiás.

Telho, no entanto, acredita em um processo de evolução de mudanças. “Esse julgamento deve servir de parâmetro para outros casos, mas não me iludo de que vamos dormir em um país de impunidade e acordar em um país de aplicação rigorosa da lei”, pondera. O procurador diz que obviamente o julgamento terá efeitos, mas avalia que há muita expectativa nesse sentido. “O processo criminal ainda é muito burocratizado e nesse aspecto não houve nenhuma mudança”, afirma. Entre a chegada ao STF e o julgamento do mensalão, foram seis anos.

Agora, mesmo com a conclusão da fixação das penas dos condenados, a execução das sentenças ainda vai demorar um bom tempo (veja matéria na página 7). Telho destaca a jurisprudência que está se formando a partir do caso e que deverá ser usada em outros processos do próprio STF e de outros tribunais e juízos inferiores (veja quadro nas páginas 8 e 9).

Para o advogado criminalista Alex Neder, o julgamento tem uma grande importância não apenas histórica, mas social. “Embora seja uma atribuição do Supremo, pela primeira vez estamos vendo pessoas abastadas, que ocuparam cargos importantes, sendo julgadas e condenadas e tudo isso está sendo transmitido pela TV para pessoas que hoje têm uma postura de desânimo, descrédito em relação à classe política.”

Alex Neder entende que o julgamento do mensalão terá reflexos tanto na sociedade como no próprio Judiciário. Ele pondera que trata-se de um processo longo e complexo e que os ministros do STF tiveram de “descer” alguns degraus e analisar as condutas dos réus. “Percebe-se que todos estão bastante inteirados com o processo, eles se prepararam, os votos são bem fundamentados”, observa. Ele destaca ainda que o caso teve repercussão internacional, o que é fundamental para mudar a imagem do Brasil no exterior..

CONTATO DIRETO

O julgamento do mensalão também é visto como um marco pelo cientista social Pedro Célio Alves Borges, professor da Universidade Federal de Goiás (UFG). “Haverá alguma mudança. Não tivemos em absolutamente nenhum outro momento o acompanhamento pela imprensa de uma ação do Poder Judiciário dessa forma. Pela primeira vez, ele está sendo mostrado por dentro a partir de um evento que teve muita repercussão”, argumenta.

Pedro Célio ressalta que no senso comum o Judiciário é visto como um poder extremamente fechado, marcado por situações obscuras e intransponíveis. “É um poder republicano sem extração popular”, diz. “Essa ideia de ineficiência, privilégios e nepotismo deve ser alterada graças a essa exposição e até ao pendor performático de alguns ministros.” O professor chama atenção para o momento singular vivido pelo próprio STF, com a atuação de um juiz negro e de juízas mulheres.

Para o sociólogo Djaci David de Oliveira, também professor da UFG, haverá mudanças especialmente do ponto de vista jurídico. “O Supremo disse que não mais vai se omitir, que vai julgar. Vamos ver se esse comportamento vai se manter”, diz Djaci, citando casos semelhantes que aguardam julgamento, como os chamados mensalões do DEM no Distrito Federal e do PSDB em Minas. Ele observa a falta de grandes manifestações populares no julgamento e a ausência de repercussão eleitoral. “Os partidos diretamente envolvidos saíram das urnas em situação até melhor”.

Fonte: O Popular