Negros morrem mais

Os negros morrem em maior número que os brancos. Essa é a principal constatação do estudo divulgado pelo relatório A Cor dos Homicídios no Brasil. Se por um lado essa constatação nos permite visualizar quais são os grupos vulneráveis, por outro lado ele nos obriga a fazer uma reflexão mais detalhada sobre o problema. Ou seja, como podemos reverter esse cenário desfavorável para os negros?

Os estudos foram realizados pela equipe do Mapa da Violência e da Central de Atendimento à Mulher – o Ligue 180 já detectou que os homicídios se concentram em alguns grupos sociais tais como os jovens, as mulheres e os negros. Em relação à mulher, o Disque 180 destacou que 60,4% das agressões à mulher ocorrem dentro de casa.

Sendo assim, políticas de segurança que se proponham a reduzir a violência contra a mulher e, consequentemente, os homicídios femininos, devem pensar em formas de ampliar e qualificar os serviços de atendimento às mulheres vítimas. Mas, para além, pensar em formas de articulação da segurança com outros segmentos em busca de formas mais expressivas de prevenção e desmantelamento das práticas sexistas.

De acordo com o Mapa da Violência, os jovens permanecem como grupo altamente vulnerável. Nada menos que 73,2% dos jovens brasileiros morrem por causas externas, enquanto que os não jovens não ultrapassam a casa dos 10%.

Se formos olhar apenas os homicídios, eles correspondem a 38,6% das mortes dos jovens, contra 2,9% dos não jovens. Portanto, se quisermos salvar os jovens, as políticas de segurança devem colocá-los como foco e não como sujeito a ser vigiado e encarcerado. Se já tínhamos os jovens e as mulheres entre outros como grupos vulneráveis no campo da segurança, temos agora dados que evidenciam mais outro segmento social, os negros.

De acordo com o relatório A Cor dos Homicídios no Brasil, para cada branco morto, morrem 2,3 negros. Mas se tomarmos a situação de alguns estados em particular, a situação se torna ainda mais delicada. Em Alagoas, por exemplo, a taxa de homicídios por 100 mil habitantes é de 4,4 para brancos, mas assustadoramente de 80,5 para negros.

No Estado de Goiás, a situação não é melhor. Se a taxa de homicídios de brancos é de 15,4 por 100 mil habitantes, a taxa de homicídios de negros é quase três vezes maior. Ou seja, corresponde a 42,8 homicídios por 100 mil.

Se a situação não é nada confortável para o Estado de Goiás, o cenário é ainda mais deprimente no chamado Entorno. Seis das cidades dessa região figuram entre as 60 que mais registram homicídios contra negros. Valparaíso de Goiás, por exemplo, chega a apresentar uma taxa de 102,7 homicídios de negros por 100 mil habitantes, enquanto que os brancos correspondem a 15,6 por 100 mil.

Não há soluções mágicas como já disse o novo Secretário de Segurança. Mas há compromissos. No caso específico dos negros, não é possível reduzir os homicídios sem enfrentar o racismo. Negros morrem muito mais, mas não por mero acaso. Morrem porque o racismo está incrustado na sociedade. Apesar dos recentes movimentos em favor de mais acesso dos negros ao sistema educacional técnico e superior, o racismo deve ser enfrentado em todos os campos. A Segurança deve dar uma boa mostra de que vai enfrentar esse problema e isso, certamente passa pelos processos de formação de suas polícias que, em muitos lugares, ainda vê o negro não como cidadão, mas como suspeito.

 

Dijaci David de Oliveira é doutor em sociologia pela Universidade de Brasília (UnB) e professor de Sociologia da Faculdade de Ciências Sociais (FCS) da Universidade Federal de Goiás (UFG)