Legado do mestre

Apesar das especulações em torno de outras obras, só três projetos são de autoria comprovada de Oscar Niemeyer em Goiás

As linhas sinuosas de Oscar Niemeyer sempre foram sonho de consumo de muitas cidades, mas realidade efetiva de poucas. Com a morte do arquiteto na terça-feira, aos 104 anos, muitas das que almejavam entrar para o seleto grupo também se entristeceram. Estima-se que 30 municípios do País tenham obras que saíram da caneta do ícone da arquitetura moderna.

Em Goiás, Goiânia e Luziânia são as duas únicas cidades em que um projeto certificado do artista foi realizado. Na capital goiana, com o já famoso e controverso centro cultural que leva seu nome, e na cidade do entorno de Brasília, com o Centro de Cultura e Convenções, presente pessoal de Niemeyer a dona Sebastiana Silva, moradora da cidade e antiga empregada de sua casa em Brasília.

Na área rural também do município de Luziânia, a cerca de 13 quilômetros do centro urbano, também está o único projeto rural esboçado pelo famoso arquiteto que se conhece. É a Fazenda JK, propriedade que pertenceu a seu patrono, o presidente Juscelino Kubitschek. O imóvel até se tornou centro de disputa entre o herdeiros do último proprietário. Além dessas obras, nada de concreto se tem sobre outros projetos em solo goiano do profissional reconhecido internacionalmente, apesar das suspeitas.

A principal está focada em Anápolis, na casa que pertenceu a Anapolino de Faria (leia texto abaixo). Especulações mais genéricas também sempre circularam sobre imóveis modernistas construídos em Goiânia, mais especificamente um conjunto habitacional no Setor Sul, próximo à Praça do Cruzeiro, e no Setor Coimbra, próximo ao Lago das Rosas.

MITOS URBANOS

Para especialistas em arquitetura e história consultados pelo POPULAR, nada há de palpável que permita afirmar que houve projetos de Niemeyer em conjuntos habitacionais de Goiânia ou de Anápolis. “Não é possível afirmar categoricamente nada sobre Niemeyer em Goiânia, a não ser sobre o Centro Cultural. Pela semelhança da escola modernista na cidade, muito se especula sobre ele aqui e tudo acaba se tornando mito urbano”, explica a arquiteta e professora da UFG Márcia Metran Coelho, que fez mestrado e doutorado sobre a arquitetura modernista na capital.

Arquiteto e mestre em História, Gustavo Neiva Coelho, professor na PUC Goiás, também nunca se deparou com evidências de projetos de conjuntos habitacionais de Niemeyer em Goiânia, mesmo ao pesquisar os imóveis da Rua 84, no Setor Sul, a que muitos atribuem ao projetista carioca. “Oscar Niemeyer jamais projetou uma residência em Goiânia. Sempre se confundiu na cidade a construção de algumas casas no Centro feitas por Niedermayer, por estas obedecerem a certos princípios consagrados na arquitetura dos anos 50”, completa Azor Ferro, também pesquisador e professor da PUC.

Em Anápolis, estudiosos da UEG também fizeram levantamento de residências construídas sob conceitos modernistas e nada foi encontrado. “Acredito que essas especulações nasceram do fato de que muitos dos trabalhadores que atuaram na construção de Brasília possivelmente tiveram contato direto com Niemeyer”, pondera a pesquisadora Celina Manso. Doutoranda da UnB e docente da UEG, Maíra Teixeira Pereira complementa que é difícil obter documentos da época que possam apontar autoria de projetos: “Em Anápolis sempre houve a suspeita do projeto da casa (referindo-se ao imóvel de Anapolino), mas nada pôde ser checado.”