A bandeira ‘capitalista’ do PT nacional

A campanha presidencial de 2010 foi mais um dos momentos da história do PT em que o partido defendeu, em discurso, a manutenção dos serviços públicos e de empresas federais nas mãos do governo, repudiando o termo privatização, que usou para desgastar a imagem da oposição. “É crime tentar privatizar a Petrobras ou o pré-sal”, disse a presidente Dilma Rousseff em vídeo divulgado na campanha, transferindo à oposição, em particular ao PSDB, o ônus de ter feito algumas privatizações nos governos de Fernando Henrique Cardoso (FHC) e “prejudicado” a economia do País.

A luta contra a privatização faz parte da história do PT, mas ações recentes do governo federal começam a distorcer o histórico em defesa do poder absoluto concentrado nas mãos do governo. A privatização de aeroportos, de estradas e o leilão do Campo de Libra no pré-sal surpreenderam a oposição e a sociedade, que bradou principalmente contra a venda do Campo de Libra. Na sexta-feira, a publicação de decreto presidencial elevando o limite de participação estrangeira no capital do Banco do Brasil (BB) de 20 para 30% foi mais uma das ações que sugerem que o PT mudou o posicionamento em relação ao termo privatização, e deve caminhar cada vez mais próximo de transferir outros compromissos do governo às empresas.

As últimas decisões do governo federal não agradam o PT de forma unânime. Ao contrário. Petistas históricos não recuaram em se posicionar contra algumas delas, mas, em defesa do partido, frisam que as privatizações foram decididas pelo governo federal, não pelo PT exclusivamente.

Em Goiás, a bancada do PT na Assembleia Legislativa é contrária a algumas das atitudes do governo. “Não posso falar pelo PT em si, mas a minha opinião é que os partidos políticos são eleitos para resolver os problemas, não para terceirizá-los. Nessa leva de privatizações, a única que se justifica para mim é a venda do Campo de Libra, que enxergo como uma parceria que o governo fez com empresas para que elas invistam, já que o governo alega não ter dinheiro. Agora, obrigações que são do governo, sou totalmente contra passar para frente”, afirmou o líder do PT na Casa, Karlos Cabral.

Ele reclama que o governo federal decidiu pelas privatizações sem promover discussão interna no partido. “O partido deveria se posicionar frente ao governo, como sempre fez, e ouvir a militância”, disse. O deputado Mauro Rubem se afirmou contrário às privatizações empreendidas pelo governo federal, mas atribui a mudança de posicionamento do governo à crise econômica que atinge o País desde 2008. “Não temos dinheiro suficiente para fazer investimentos, e o pagamento da dívida interna consome mais da metade do nosso orçamento. Mas temos de reconhecer que, apesar dessa mudança de posicionamento, é o melhor governo que o País já teve”, minimizou.

Nesse contexto, a oposição tem aproveitado o momento para transformar em bônus o ônus que sempre lhe foi delegado pelas privatizações e, ao invés de partir para o embate, adotou o discurso de congratular o governo federal pela mudança na atuação. “Parabenizo a presidente Dilma por compreender que as privatizações é que permitem as conquistas sociais. O pré-sal, por exemplo, só foi descoberto porque FHC teve a coragem de abrir para que as empresas pudessem explorar junto à Petrobras”, declarou o deputado Helio de Sousa (DEM). “Só acho lamentável que eles não assumam que estão privatizando e continuem a criticar o PSDB. Isso é uma forma de menosprezar a inteligência do cidadão brasileiro”, repreendeu.

‘O PT está caindo na real’, afirma cientista político

Cientistas políticos consultados pela reportagem consideram que a mudança de posicionamento do PT é um caminho natural diante de um País que não pode ficar preso à economia de estado em meio à crise econômica que enfrenta. “O PT está caindo na real. Ainda é uma privatização envergonhada, tímida, mas Lula e Dilma estão percebendo que não há como gerar riqueza sem a participação das empresas. Não há como menosprezar a economia de livre mercado”, argumentou o professor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) Wilson Cunha.

Para ele, o PT está percebendo que não há como confrontar a realidade. Professor aposentado da Universidade Federal de Goiás (UFG), Itami Campos tem a mesma opinião. “É indiscutível que o PT está fugindo do que sempre defendeu, mas diminuir a participação do Estado é fundamental para o crescimento do País. O partido está adotando a posição que tem de ser adotada, desde que haja controle, que não beneficie apenas determinados segmentos”, ponderou. (L.M.)

Fonte: jornal O Hoje