A espera de Marinês é a de outros 11,5 mil pacientes

Há mais de 10 meses que a operária Marinês Pereira Gonçalves, de 45 anos, aguarda por uma cirurgia no ombro pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Desde que rompeu um tendão após uma queda em dezembro de 2012, ela vê sua vida limitada, sem poder fazer qualquer esforço com o braço. Na avaliação médica, a situação de Marinês não é um caso de urgência, apesar das dores que ela é obrigada a conviver no dia a dia e da incapacidade de voltar ao trabalho - ela depende da ajuda de amigos para complementar a renda que vem do benefício que recebe da previdência. Sem uma data marcada para a operação, a operária é mais uma em uma lista que atualmente está em mais de 11,5 mil nomes de pacientes que aguardam uma cirurgia eletiva.

Esse número já foi pior. Em março deste ano, conforme reportagem publicada pelo POPULAR na época, a espera atingia 16 mil pessoas, algumas há mais de 2 anos. Desde então, a Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia (SMS) e a estadual (SES) lançaram o programa Sua Vez, que contou com um aporte de R$ 13 milhões do Ministério da Saúde para atrair mais hospitais interessados em aceitar realizar cirurgias eletivas pelo SUS. Em quatro meses, foram atendidas 11 mil pacientes que estavam na lista. Neste período, 3 mil pacientes não foram localizados, seja porque o endereço ou telefone deixados não existiam, seja por não comunicarem mudanças nos contatos ou até mesmo por óbito.

Depois a fila voltou a crescer. É que a demanda que entra mês a mês é maior que o número de cirurgias que são realizadas pelo SUS em Goiás. São em média 3,7 mil novos pacientes que surgem a cada 30 dias, contra uma média de 2,3 mil cirurgias realizadas no mesmo período. A situação seria pior sem o repasse do governo federal. Antes, de agosto de 2012 a fevereiro deste ano, a média estava em 1.670.

Apesar do tamanho da fila, o responsável pela Diretoria de Regulação, Avaliação e Controle (Drac) da SMS, Cláudio Sousa Tavares, garante que o tempo médio de espera por cirurgia eletiva em Goiás é de um a quatro meses. Há exceções que em alguns casos ultrapassam os dois anos de espera. São, principalmente, as cirurgias de alta complexidade em ortopedia. “As cirurgias de otorrinolaringologia e ortopédicas são as de maior espera, seja pela demanda ou pelo reduzido número de prestadores de serviço”, diz.

Saber que a cirurgia pela qual precisa ser submetida está entre as de maior espera causa ainda mais aflição em Marinês, que teme que a lesão se agrave ou que fique com alguma sequela. Ela não tem condições de pagar pelo procedimento, que custa até R$ 5 mil. “Tenho consultas com frequência para pegar a receita dos remédios para dor, que são caríssimos. Quando pergunto sobre a fila, me dizem para confiar em Deus.”

Tavares comenta que a fila é “impossível de zerar” por causa do pequeno número de unidades de saúde públicas ou conveniadas que realizam os procedimentos. Em Goiás, as cirurgias eletivas pelo SUS são realizadas apenas na capital. Após o lançamento do programa Sua Vez, são 30 hospitais cadastrados. Apenas o Hospital Geral de Goiânia Alberto Rassi (HGG), o Centro de Reabilitação e Readaptação Dr. Henrique Santillo (Crer) e o Hospital das Clínicas (HC) da Universidade Federal de Goiás (UFG) realizam cirurgias de alta complexidade em ortopedia. “É impossível zerar a fila, mas ela é administrável. Nosso sistema permite remanejar para hospitais com maior capacidade”, diz Tavares.

 

“Estamos criando um exército de sequelados”

30 de dezembro de 2013 (segunda-feira)

Diretor do Sindicato dos Médicos do Estado de Goiás, o ortopedista Robson Azevedo alerta para as consequências da longa espera por cirurgias, mesmo que não sejam consideradas de urgência. “Estamos criando um exército de paciente sequelados. A natureza não espera a boa vontade dos gestores para gerar vagas e a demora para resolver o problema muitas vezes traz complicações definitivas”, afirma.

Azevedo acrescenta ainda que a correção de um problema ocasionado pela demora na realização de uma cirurgia no momento certo custa ainda mais caro para o governo. “A reabilitação, a correção da deficiência, a incapacidade desta pessoa para o trabalho e para a vida, custa ainda mais caro.”

Para ele, o aumento da frota de veículos e do número de acidentes de trânsito gerou um passivo muito grande de cirurgias ortopédicas. O ideal, afirma, é que pacientes com necessidade de cirurgia ortopédica pudessem ser operados num prazo máximo de três semanas, porque as fraturas se consolidam muito rapidamente.

Fonte: O Popular