Povo rejeita empresários nas urnas

Enviado em 20/02/2014 às 20h29

Helton Lenine

 

Na história republicana do Brasil, nenhum empresário conseguiu eleger-se presidente da República, fenômeno que se representa, em quase sua totalidade, nos Estados brasileiros e nas prefeituras das capitais. Em Goiás, também não se registra vitória de empresário, nas urnas, para o governo nem para a prefeitura da Capital.

 

O povo brasileiro prefere colocar no Palácio do Planalto e nos governos estaduais políticos que tenham construído uma longa atividade na vida pública – profissionais liberais, servidores públicos, professores – menos empresários.

 

Depois de ocuparem outros cargos públicos – prefeito, deputado estadual e federal, senador, governador, esses políticos conquistam a simpatia popular e conseguem chegar à presidência da República pelo voto popular. Exemplos? Eurico Gaspar Dutra (general do Exército), Getúlio Vargas (advogado e ex-presidente da República), Juscelino Kubitschek (médico e ex-governador), Fernando Collor (jornalista e ex-governador), Fernando Henrique Cardoso (sociólogo e ex-senador), Luiz Inácio Lula da Silva (líder sindical e ex-deputado federal) e Dilma Rousseff (economista).

 

Nas eleições presidenciais, os empresários pegam carona, isto é, aceitam compor chapa como candidato a vice-presidente e o caso mais recente foi o de José Alencar, proprietário do Grupo Coteminas, indústrias têxteis em Minas Gerais, e que, por dois mandatos, esteve ao lado do sindicalista e político Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

 

Sem chances de chegar ao Palácio do Planalto e aos governos estaduais, os empresários brasileiros preferem abrigo no Congresso Nacional, elegendo-se senadores e deputados federais.

 

Para os cientistas políticos, a não presença de empresários na presidência da República e nos governos estaduais revela “desconfiança” por parte da população em relação ao que podem realizar no exercício do cargo, principalmente misturando os interesses “públicos e privados.”

 

Dois exemplos claros de desencontro entre as aspirações populares e os projetos políticos de empresários são Silvio Santos e Antônio Ermírio de Morais. O proprietário de um conglomerado de empresas ensaiou uma candidatura ao Palácio do Planalto, em 1989, pelo pequeno Partido Municipalista Brasileiro (PMDB), no lugar do candidato pastor Armando Corrêa. Chegou a pedir votos para o número 26, na propaganda política de rádio e televisão, mas suas trapalhadas e inexperiência política o levaram a afastar-se do pleito, por decisão do TSE, concentrando-se apenas nos negócios.

 

Antônio Ermírio de Morais (PTB), do Grupo Votorantim, um dos maiores industriais do País, aventurou-se, em 1986, a concorrer ao governo de São Paulo, sendo derrotado pelo ex-senador e político Orestes Quércia (PMDB). Durante esta experiência, o empresário ficou chocado com as manobras políticas e fisiológicas: todos que o abordavam pediam cargos para poder ficar sem trabalhar. Foi a frustração com a política que o levou a escrever peças teatrais, quando disse que “a política é o maior de todos os teatros.”

 

EM GOIÁS

 

Os goianos também não elegeram empresários para o Palácio das Esmeraldas. Os vitoriosos são políticos de carreira, como Pedro Ludovico Teixeira, José Feliciano Ferreira, José Ludovico de Almeida, Jerônimo Coimbra Bueno, Mauro Borges Teixeira, Otávio Lage Siqueira, Iris Rezende Machado, Henrique Santillo, Maguito Vilela, Alcides Rodrigues e Marconi Perillo.

 

O goianiense nunca apostou em empresário para a prefeitura da Capital e os políticos tradicionais se consagraram nas urnas: Venerando de Freitas Borges, João de Paula Teixeira Filho, Jaime Câmara, Venerando de Freitas Borges, Hélio Seixo de Brito, Iris Rezende Machado, Daniel Antônio de Oliveira, Nion Albernaz, Darci Accorsi, Pedro Wilson e Paulo Garcia. A maioria, portanto, médicos, advogados e professores.

 

Um dos empresários que amargaram derrotas em Goiás foi Luiz Antônio de Carvalho, de Anápolis, um dos fundadores do PT goiano, em 1980. Não conseguiu o apoio popular na disputa pela Prefeitura de Anápolis e para o governo de Goiás.

 

Também o empresário Sandro Mabel, do PMDB, tentou, sem êxito, chegar à Prefeitura de Goiânia, em 1992. Ocupa espaço apenas no Parlamento (foi deputado estadual e está no quinto mandato como deputado federal).

 

Cientistas políticos: empresários são mais voltados para si próprios

 

Luiz Signates, professor de Metodologia da Pesquisa e Ciências Sociais da UFG e PUC Goiás, diz que o eleitorado rejeita o empresário como governante em razão dos conflitos existentes entre o público e o privado. “Normalmente, o empresário está voltado para si próprio.”

 

Signates sustenta que o político tem maior sensibilidade para captar o “sentimento popular, suas vontades, seus desejos e suas preferências.” E acrescenta: “Há sempre uma visão de conflito entre governo e iniciativa privada, Diante disso, o empresário acaba perdendo terreno para o político profissional ao se expor numa campanha eleitoral.”

 

Para o cientista político, o interesse público nem sempre coincide com o que necessita a iniciativa privada. “Daí, a população dar preferência para o político, que, normalmente, compreende melhor o que pensa e que propõe o cidadão comum. A vida eleitoral do candidato/empresário fica dificultada exatamente pela não compreensão do que deve ser prioridade na gestão pública.”

 

Já o professor Itami Campos, de Ciências Políticas, da UFG e UniEvangélica, ressalta que o político leva vantagem sobre o empresário, nas campanhas eleitorais, exatamente por trabalhar melhor “a manipulação” das propostas a serem levadas à população. “Os políticos são mais hábeis ao expor suas propostas, os empresários são mais rígidos, menos flexíveis, o que dificulta suas campanhas e normalmente os levam às derrotas eleitorais.”

 

Itami Campos acredita que a tendência é a de a população mudar essa “cultura política” e assimilar os “discursos rígidos” dos empresários nas campanhas para presidente da República, governadores e prefeitos das Capitais. “Há certa saturação do comportamento dos políticos tradicionais na hora de apresentar suas propostas ao eleitor e, diante disso, é possível que, com o tempo e com novos pleitos, o empresário possa ter seu discurso mais palatável ao cidadão comum.”

Fonte: Diário da Manhã