Movimento em apoio a estudantes da UFG presos reúne alunos e professores que lutam pelo direito de protestar

27/05/2014 19h20  Por Sarah Teófilo  Edição 2029

A intenção do protesto, que teve início na Praça Universitária, ia além do pedido de habeas corpus dos jovens estudantes da Universidade Federal de Goiás, Ian Caetano, Heitor Vilela e João Marcos

Às 14h, a praça Universitária estava cheia de policiais e com pouquíssimos estudantes. Pessoas questionavam se o movimento contra a criminalização da luta popular em Goiás, articulado fortemente nas redes sociais, teria muitas pessoas pedindo pelo direito de protestar. Com o tempo, bandeiras começaram a aparecer e pessoas a se aglutinar. A praça começou a encher de estudantes e professores, que logo tomaram as ruas. Um protesto que visava não só pedir pela soltura de Ian Caetano, Heitor Vilela e João Marcos, estudantes da Universidade Federal de Goiás (UFG), como também lutar pelo direito de protestar.

 O ato que movimentou tantos estudantes e professores pretendia levar uma lista com 1.500 assinaturas ao Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) pedindo pela soltura dos três estudantes e a revogação do mandado de prisão do estudante Tiago Madureira Araújo, como também um manifesto que foi elaborado em assembleia no último sábado (24/5). De acordo com um dos advogados dos jovens, Gustavo Sabino, do Centro de Referência em Direitos Humanos, o pedido de revogação da prisão preventiva foi negado na última sexta-feira (23/5), dia da prisão dos jovens. “Se não concederem o habeas corpus faremos tantos outros [pedidos] que forem necessários para soltar esses estudantes”, garantiu Gustavo.

 Vários professores da UFG estavam no local, como o educador de ciências sociais da UFG desde 2009, Nildo Viana, 49 anos. O professor acredita que toda essa revolta se iniciou em junho de 2013. Nildo afirma que com a atual conjuntura da Saúde, Educação e Segurança Pública, a revolta popular chega com força e não pára.

 O professor explica que a primeira reação que teve ao ser informado das prisões dos três alunos da universidade foi estranhamento. “Encaro isso como uma repressão preventiva para o pessoal não protestar durante o evento da Copa, como também depois dela.” Goiânia recebe na próxima terça-feira (3/6) a Seleção Brasileira de Futebol que terá um amistoso contra o Panamá. O professor acredita que um dos motivos desta repressão é que as autoridades temem que o evento e a imagem do país sejam prejudicados com as manifestações.

 Já o professor de Direito, Alexandre Santos, afirma que esta é uma ação que além de tentar intimidar a população que luta pelos seus direitos nas ruas, visa cumprir os desejos dos grandes empresários do transporte coletivo. Enquanto isso, os estudantes e professores gritavam nas ruas “É a máfia do transporte”. Muitos comentavam que a Operação R$ 2,80, que culminou na prisão dos estudantes, foi arquitetada pelas empresas de transporte coletivo. O descontentamento da juventude com sua pátria era tamanha que em um momento pôde-se ouvir do carro de som alguém convidando a todos que o acompanhasse cantando o hino nacional. Em seguida, vaias, e gritos de “não”.

 

O advogado Gustavo Sabino explicou que decisões do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) quanto a processos envolvendo integrantes do Movimento Sem Terra (MST) mostram que ações como a proposta contra os estudantes não tem fundamento. “Não se pode confundir atividade política com atividade criminosa. Tem o dolo, a intenção diferente.” Gustavo afirma que é realmente difícil controlar 500 pessoas em um protesto. “Isso não significa que a pessoa que chamou a população para as ruas é responsável por esses danos”, disse. O advogado explicou que não há motivo de prender pessoas que não apresentam riscos à sociedade. “A prisão no Brasil é a última instância, o último ato a ser feito.”

 Gustavo, que trabalha há cerca de cinco anos como advogado popular, afirma que esta atitude de prender estudantes sem prova significa uma ruptura do Estado democrático de direito. “Uma verdadeira ditadura”, afirmou, completando que a constituição brasileira garante ao cidadão o direito de manifestar.

 O professor Alexandre afirmou que não existe fundamento para uma prisão preventiva neste caso, e que isso demonstra a criminalização da juventude e da politização. “Os jovens não apresentam ameaça nenhuma, estão apenas tentando se politizar”, defendeu.

 Funcionários do administrativo da UFG, que estão de greve há quase dois meses, e outros servidores da Educação municipal também estavam no local prestando seu apoio aos estudantes e reivindicando seus direitos negados. Raquel Salomão, professora do município, vê as prisões como uma forma de arbitrária de tentar intimidar quem está na luta. “Adoram dizer que prezam pela democracia mas têm atitudes como estas”, critica.

 Sobre os três alunos presos, o professor Nildo sustenta nunca ter visto nenhuma atitude que pudesse justificar minimamente a atitude contra os estudantes. “São garotos exemplares. Aliás, se todos os meus alunos fossem tão politizados assim, os movimentos populares estariam com ainda mais força.”

Reunião no Tribunal de Justiça

 Durante a manifestação, o reitor da UFG, Orlando Afonso Valle e o advogado Francisco Nata, um dos representantes dos estudantes, estavam reunidos com o presidente do TJGO, Ney Teles de Paula. Quando o movimento chegou na porta do Tribunal, o presidente recebeu Giovanna Rosa, namorada de Heitor que estava representando o movimento estudantil, a mãe de Ian, Ledina Lopes, e os advogados Bruno Pena, Francisco e Nathália Oliveira.

 Em seguida, o grupo de advogados subiu ao gabinete da desembargadora Avelirdes Almeida para levar a carta de manifesto e a lista de assinaturas pedindo pela soltura de Ian, Heitor e João Marcos. Entretanto, a desembargadora já havia saído. A advogada Nathália informou que na próxima quarta-feira (28/6) irão voltar ao local para receber a decisão da juíza quanto ao habeas corpus.

 

O desespero familiar

 Ledina Lopes, mãe de Ian, não conteve as lágrimas e a expressão de desespero. “Não sei se consigo conceder entrevista”, disse com a voz embargada e os olhos vermelhos. A mãe do jovem preso disse que sempre apoiou o filho em todas as manifestações que comparecia. “Nunca pedi para ele não ir. Ele não fazia nada de errado, não colocava fogo em ônibus, nunca quebrou um vidro”, e completou: “Dizem que meu filho está incitando a violência. Quem está incitando é o Estado, com essas condições de transporte, saúde, não meu filho”

 O advogado Gustavo Sabino informou ao Jornal Opção Online que os estudantes presos estão bem no Centro de Prisão Provisória (CPP). Entretanto, recentemente reclamaram de um clima hostil entre os presos, que afirmaram que os jovens estavam sendo tratados de forma diferenciada.

 

Estado repressivo

 O professor de Ciência Sociais, Nildo Viana, explica que a política do governo atual é repressiva. “Uma política problemática que ameaça a própria continuidade das lutas pacíficas.” De acordo com ele, quanto mais aumenta as repressões mais aumenta a insatisfação e resistência por parte da população. “Se não há um canal de discussão dentro da esfera da democracia o que sobra é a violência”, afirmou.

Sobre questões referentes a depredação de patrimônio público e privado, Nildo explicou que nas manifestações não há uma homogeneidade de pessoas que comparecem. “Têm aqueles que chamam, pessoas politizadas, mas sempre têm pessoas que chegam ao movimento e manifestam da sua forma, às vezes depredando patrimônios”, e completou: “As mais diversas pessoas aderem aos movimentos, mas isso não quer dizer que foram as pessoas que fizeram o convite da manifestação as responsáveis pelos atos que ocorrem durante o protesto.”

 O professor Alexandre chama a atual conjuntura de “criminalização da juventude e da politização”. “Tivemos um jovem que perdeu os dentes da frente por agressão policial. Foi ele que que motivou a agressão, ou é um processo de criminalização da juventude?”, questionou.

Fonte: Opção