As iniciativas adotadas pelo poder público para tentar conter a onda de violência em Goiânia ainda são vistas como ineficientes por especialistas, até porque o recorde histórico de 80 homicídios registrados no último mês de junho é um sinalizador evidente dessa situação, segundo eles. A saída seria tentar articular melhor as práticas desenvolvidas no âmbito da força policial, o que, por si só, não dá conta do recado, com outras relacionadas às ações sociais, culturais, esportivas e, até mesmo, discutir a educação e os valores repassados para a juventude.

O presidente da Comissão de Segurança Pública e Política Criminal da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Goiás (OAB/GO), Rodrigo Lustosa, expõe que o modelo de segurança adotado nas últimas décadas, na capital, tem se mostrado ineficiente, diante de índices de criminalidade que não param de crescer. “Não se pode pensar segurança pública só pela perspectiva do policiamento e da repressão. Pensar segurança de uma forma mais abrangente é algo que pode, sim, trazer resultados mais concretos”, diz ele, que cita o envolvimento da comunidade e a ocupação social de espaços públicos como exemplos de táticas que podem ajudar no combate à violência crescente.

Rodrigo cita, ainda, a existência de uma cultura da violência, que precisa ser identificada e combatida. É ela, segundo ele, que dissemina a prática violenta como a única alternativa para solucionar problemas. O professor de Sociologia da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás (UFG), Dijaci David de Oliveira, também aponta essa questão e detalha o hábito e o costume que sobrevive impregnado na sociedade brasileira de difundir ações e ideias que favorecem a atitude violenta. “A rixa e o desafio estão na cultura brasileira. A criança, por exemplo, é orientada sempre para não levar desaforo para casa e demonstrar que é forte, que é macho”, aponta.

Rodrigo e Dijaci mostram, com esse argumento, que, muitas vezes, a violência se origina na educação básica, nos ensinamentos de casa, o que mostra que a responsabilidade não parte de uma única frente, apenas. Mesmo assim, o professor também pontua a necessidade de se pensar melhor as táticas da atual política de segurança. “Essas tentativas de tentar assegurar um efetivo maior nas ruas, outras de tentar focar fiscalização em motoqueiros tem se mostrado ineficientes. Não há uma ação efetiva de desarmamento. As ações são muito esporádicas e falta uma política mais expressiva”, afirma.

LEGISLAÇÃO

O juiz da 1ª Vara Criminal de Goiânia, Jesseir Coelho de Alcântara, atua em julgamentos de homicídios na capital há 14 anos. Ele confirma a expressividade dos índices registrados recentemente e diz, que em todo esse período, nunca se matou tanto na cidade. Um fato que evidencia isso é a quantidade de inquéritos que são remetidos ao judiciário, em especial à vara onde ele atua. Consciente das críticas feitas à atual legislação, especialmente por parte do poder público, o magistrado reconhece as brechas e a benevolência de algumas leis, mas não acredita que esse seja o motivo essencial para explicar a criminalidade.

Um dos posicionamentos defendidos pelo governo estadual, por exemplo, é o de que a legislação penal precisa ser alterada com urgência, porque o índice de reiteração de criminosos é bastante elevado no Estado. Existem casos de pessoas que já foram presas mais de 30 vezes. Apesar disso, Jesseir acredita que existem outras questões para resolver, como criar uma política de prevenção ao uso e tráfico de drogas. “Embora exista muita crítica de que é bastante cômodo para a polícia justificar homicídios a partir do envolvimento da vítima com drogas, a realidade é essa. Não tem jeito. As estatísticas comprovam. De cada 10 inquéritos que pego, sete possuem relação com o tráfico”, expõe o juiz, que diz não identificar nenhuma política para prevenir essa situação.