É viável o voto facultativo?

Data: 04/10/2014

Veículo: Diário da Manhã

Link Direto: http://www.dm.com.br/texto/193048-e-viavel-o-voto-facultativo 

Analistas políticos dizem que permitir que o eleitor decida se quer ou não votar pode ser um risco para o sistema eleitoral brasileiro. 78% da população é contrária ao voto obrigatório

A discussão acerca da obrigatoriedade do voto ou não nas eleições brasileiras não é uma pauta nova, visto que a cogitação de uma reforma política que inclua a questão vem sendo abordada há algum tempo. Não obstante, durante o período eleitoral, principalmente em âmbito nacional e estadual, o tema vem à tona promovendo debates que até o momento ainda não definiram posicionamento concreto. 

As manifestações, inclusive no meio on-line, mostram que a rejeição ao voto obrigatório tem relevantes apoiadores. Levantamento do Instituto Datafolha divulgado em maio deste ano aponta que 61% dos eleitores são contra a imposição. A mesma pesquisa ainda mostrou que 57% dos eleitores brasileiros não votariam se não fosse obrigatório. No Brasil, a Constituição Federal prevê o voto compulsório, ou seja, facultativo, para analfabetos, idosos com mais de 70 anos de idade e jovens com 16 e 17 anos. Em Goiás, 4.331.733 milhões estão aptos a votarem e cerca de 7% são facultativos, que correspondem aos eleitores na faixa etária de 16 a 17 anos e mais de 70 anos.

Conforme avaliado pela pesquisa, é elevado o número de rejeição contra a obrigatoriedade do voto dos jovens. Entre a faixa etária de 16 a 24 anos, a rejeição é de 58%, enquanto os mais adultos, entre 45 e 59 anos somam 68%. Referente aos eleitores com ensino superior o resultado ainda é maior, 71% de rejeição.   

Doutor em Sociologia e professor da Universidade Federal de Goiás, Flávio Sofiati considera que o voto é ao mesmo tempo um direito e um dever, portanto não pode ser facultativo. "Trata-se de uma obrigação do cidadão no contexto de democracia representativa". Como este tipo de democracia é limitado, o sociólogo pondera que se deve caminhar para um modelo de democracia participativa, na qual há presença decisiva do cidadão nos principais temas do Estado.

Caso o voto se torne facultativo, Flávio Sofiati acredita que haverá um retrocesso no processo de qualificação da nossa democracia, visto que caminharemos na contramão de um tipo de educação política que exige a participação efetiva de todos. "A maturidade política do Brasil só será alcançada com mais participação social. Isso é possível com a ampliação das formas de representatividade para além do voto. Se o voto se torna facultativo, diminuem as chances de ampliarmos os canais de democracia direta".

Mestre em Filosofia e professor de Ciências Políticas na PUC- GO, Sílvio Costa afirma que os sistemas econômico, social e político existentes no Brasil, como em diversos outros países, comportando o voto facultativo como o não obrigatório, dependendo da correlação de força e interesses organizados existentes na sociedade.

Outro ponto que o cientista político ressalta corresponde à concepção de mundo que predomina na sociedade. "Discutir essa questão do voto facultativo ou obrigatório por si só leva a um equívoco e uma contraposição enganosa, o voto é uma série de consequências econômico-social e na política a forma de organização político-eleitoral".

Indagado sobre a maturidade do eleitorado brasileiro em se adaptar ao voto facultativo, Sílvio Costa pondera que há um equívoco porque fica um debate bizantino. "Quer dizer, um debate que da forma que está sendo apresentado é equivocado".

O cientista político considera que uma das concepções se refere ao neoliberal, onde concentra a visão em prevalência e absoluta no individualismo que age a partir dos seus interesses, ou seja, há uma mercantilização da sociedade. "Quando se fala em voto facultativo é uma forma enganosa da liberdade do indivíduo em escolher e tenta contrapor o papel do Estado como elemento intermediador do desenvolvimento". Conforme frisa Sílvio Costa, qualquer discussão que se faz do voto facultativo da forma de organização político-eleitoral se deve discutir a partir das concepções e consequências que traz para si mesmo.

Sílvio Costa relata que o voto pode ser fator de transformação social, porém, com a imposição do voto facultativo se objetiva retirar a maioria da população do processo eleitoral. "Percebe-se que há manipulação clara nessas tentativas". 

Caso contrário, o voto não obrigatório poderia ser prejudicial para o Brasil na concepção do cientista político. "Induz o eleitor a decidir mediante uma falsa liberdade que teria que analisar a concepção de mundo onde as propostas são vinculadas. Da forma que está sendo conduzida contribui para a desinformação do eleitor". 

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