O fascínio das estrelas

Data: 08 de setembro de 2015

Fonte/Veículo: O Hoje

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Fundado há cinco anos, o clube amador de astronomia Gunstar cresce em adeptos  

José Abrão

Morando em uma cidade movimentada, baru­lhen­ta e cheia de luzes como Goiânia, é raro nos pegar olhando para o céu. Toda noite, contra o veludo azul do firmamento, lá elas estão: as estrelas. Estão lá há milhões, bilhões de anos e nós raramente prestamos atenção. O céu fascina cientistas, astrônomos, ufólogos e curiosos há milhares de anos. Descobertas incríveis vieram da observação das estrelas, como a Teoria da Relatividade e os buracos negros ou até que a Terra gira em torno do Sol e não é o centro do universo, ideias que custaram a vida de Copérnico e a liberdade de Galileu.

O espírito científico e a curi­o­sidade estão impregnados em todos nós, embora às vezes a gen­te pense que é algo muito dis­tante, fora da realidade ou complexo, caro, inacessível. Com isso em mente, surgiu o Gunstar, primeiro clube amador de astronomia de Goiás, com a intenção de mostrar que as estrelas podem estar ao alcance de todos. “As pessoas acham que é coisa de outro mundo, não sabem nem por onde começar a procurar a astronomia e nosso grupo está levando isso às pessoas para que parem de ter vontade e possam participar”, conta o bacharel em Direito e professor de História Lamartine Brasil. “A linguagem do clube é muito simples, bem popular mesmo”, completa o microempresário Clayton dos Santos.

Ambos são fundadores do Gunstar, projeto que surgiu dentro de um outro em Cromínia, a 80 km da capital. Clayton conta que eram proprietários de uma terra que transformaram em reserva em um projeto chamado Santuário Ecológico “Como a cidade tem o céu mais escuro que o de Goiânia começamos o programa do Gunstar de observação astronômica. Ele teve tanta repercussão que o santuário ecológico acabou e ficou a observação”. Lamartine conta que os primeiros encontros começaram entre amigos – inclusive de onde veio o nome, Gunstar, inspirado em Gunstar Heroes, um clássico do MegaDrive. “Começou com um grupo fechado de amigos, mais ou menos vizinhos que foi se aprimorando e se organizando. Conforme aumentamos a divulgação, mais gente foi chegando e o grupo foi ganhando corpo. Mais pessoas se interessavam. Como a astronomia é pouco divulgada e há muitas pessoas isoladas que gostam de observação,  passamos a abrigar essas pessoas”. Com encontros que reuniam cerca de 15 pessoas, em pouco tempo já estavam reunindo 50.

A paixão dos dois pelas estrelas começou cedo. No caso de Clayton, era fascinado pelo cometa Halley. “Os shoppings tinham toda a decoração, a televisão toda hora falando”. Já Lamartine só não virou astrônomo profis­sional por falta de oportunidade. “Sempre fui aficionado por astronomia, não me tornei astrônomo profissional por não ter essa graduação em Goiás”. Mas ele não se sente menos realizado. Conta que a maior parte dos amadores é autodidata e compartilha o conhecimento. O Gunstar também é o único grupo amador do Brasil que promove aventuras ecológicas, ou seja, além da observação, os participantes podem ter um contato mais próximo com a natureza. “A astronomia vai vir sempre junto com um passeio”, afirma Clayton.

O grupo está associado ao Astrônomos Sem Fronteiras, grupo da Nasa que incentiva a astronomia ao redor do mundo. “Todo evento que é certificado, registrado emite um certificado”, conta Lamartine. Com esse monitoramento, Clayton ressalta conquistas. “No mês global da astronomia, em 2013, a gente fez mais eventos que todos os grupos do Brasil, foram nove observações”, relata.

Preço astronômico

Uma das principais barreiras para os astrônomos é o alto custo dos equipamentos. Como tudo é importado, um produto barato hoje pode estar fora de questão amanhã. “Aumento do dólar, inflação, valor de entrega. Al­go que custava R$ 1,5 mil hoje sai por R$ 4,5 mil, afirma Clayton. Tudo do Gunstar foi comprado do próprio bolso dos fundadores. Para contornar os custos, eles agora estão criando um CNPJ e esperam formalizar o clube, com diretoria e mensalidade para ajudar a custear os eventos e telescópios e esperam conseguir patrocínios e se inscrever em projetos governamentais de incentivo à ciência e à cultura.

Daí o objetivo deles: popularizar a astronomia. “Aspessoas têm muito medo, acham que é uma coisa elitizada. Nosso objetivo é tornar a coisa mais acessível para as pessoas que não têm acesso a esse conhecimento e têm vontade de participar,mas acham que é algo fora da realidade deles. Nós queremos levar os astors isso para todos”, disse Lamartine. Até lá, eles contam com apoio e parcerias: “A primeira parceria que fizemos foi com os professores do Planetário. Eles nos deram nosso primeiro voto de confiança. Nos disseram que outras pessoas tentaram, que sempre começavam o movimento, mas se dispersavam após algum tempo”, conta Clayton.

Eles agora realizam eventos grandes no Planetário com o apoio dos professores da UFG. “O planetário abriu as portas para a gente com espaço para fazer observação. Promovemos shows de rock, e os telescópios ficam no pátio, com sessões de observação na cúpula. Não somos ligados ao planetário nem à UFG, mas eles nos dão esse apoio. Praa eles, é uma alegria,  porque é uma área muito pouco procurada”. Além disso, há observações em vários pontos ao redor da capital e no interior. Recentemente, estiveram no Fica, na Cidade de Goiás para observar uma chuva de meteoros. Segundo Clayton e Lamartine, o evento durante o festival de cinema atraiu 2,5 mil pessoas.

Agora eles também contam com o apoio de pessoas em diversas cidades e membros interessados: “Sempre a gente tem parceria, como em Aragoiânia, São Jorge, Alto Paraíso, Goiás Velho, vários locais. Somos referência para tudo que é ligado ao ambiente e a questões astronômicas. A própria mídia passou a divulgar mais sobre esses fenômenos. Aí as pessoas se aproximaram para buscar mais conhecimento. Ficam impressionados, até mesmo nós nos impressionamos a cada observação. É uma experiência única. Cada observação é diferente. Todo astrônomo amador é um astrônomo, que pela observação pode descobrir alguma coisa”, disse Lamartine.

E pra quem quer começar, dá pra ver alguma coisa no céu de Goiânia? Eles garantem que existem alguns pontos bons na capital, como o Morro do Além e o Morro do Menda­nha, e que dá, sim, para ver alguns fenômenos, mas não muito. “Visibilidade para planetas e para a lua é melhor nesses lugares. Objetos de céu profundo, como galáxias, nebulosas, aglomerados de estrela, esses alvos mais escuros, precisam de mais escuridão. O ideal é zona rural. A 40 km de Goiânia já se vê bastante”, assegura Clayton. Agora é só pegar seu telescópio e testar.

Mas... e os aliens? Os dois dizem que é muito comum observar coisas estranhas, mas perfeitamente explicáveis. O problema é que se você não sabe para o que está olhan­do, é muito fácil se assustar: “Vimos a nave Soyuz que estava para cair, passando pelo céu de Goiás Velho antes do dia da queda. Sem saber, ia pensar que era o fim do mun­do. As vezes o objeto está eclipsado, aí ele surge do nada e desaparece” disse Clayton.“É difícil garantir o que você está vendo. Vai que dá a sorte de a Estação Espacial passar e você a vir? Você sai correndo. Eu sairia”, brinca Lamartine.