10 cordas pelo mundo

Data: 12 de setembro de 2015

Fonte/Veículo: O Hoje

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Bandolinista mundialmente conhecido, Hamilton de Holanda traz a Goiânia todo o virtuosismo de suas composições em apresentação única nesta noite

Adalto Alves

O verão na Europa foi quente para Hamilton de Holanda. Em julho e agosto, ele realizou 21 shows numa turnê de 45 dias por 12 países. “A maioria com o disco Bossa Negra, meu projeto com Diogo Noguei­ra”, disse ele em entrevista para O HOJE. “Estive em Portugal, França, Holanda, Alemanha, Bélgica, Finlândia, Suíça, Noruega,  Suécia”, enumera. O bandolinista, um dos músicos mais sofisticados e inventivos do Brasil, se apresenta hoje no Centro Cultural da Universidade Federal de Goiás (UFG). A turnê de lançamento do seu disco mais recente, Pelo Brasil, vem de São Paulo e segue para 12 destinos com apoio do programa Petrobras Cultural. Ele está sozinho no palco, vou logo avisando. O que não significa nenhum tipo de limitação. Hamilton de Holan­da é um homem-banda. Seu desempenho, muitas vezes, despende a energia de um show de rock. A direção de Marcos Portinari abre espaço para interferências sonoras e lunáticas de Frango Kaos, Marina Stoll, VJ Boca e Fernando Salles. A surpresa é uma constante, na audição dos 28 discos lançados em 18 anos e nas andanças empreendidas por inúmeros quadrantes, com formações diversas. “Mi­nha missão é tocar em todos os lugares possíveis”, disse ele na entrevista. “Quero mos­trar a beleza da música instrumental brasileira, dos nossos grandes compositores, músicos como Pixinguinha, Jacob do Ban­do­lim, Ernesto Nazareth, Raphael Rabello, Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti. O Brasil tem uma história muito forte.” Ainda bem que, para Hamilton de Holanda, todos os lugares quer dizer de Goiânia a Timbuktu. Aproveite, não é todo dia.

Viajar com um bandolim é o máximo de economia numa turnê?

Eu toco bandolim desde pequeno. Em determinado momento, fiquei com vontade de tocá-lo como se fosse um piano, um acordeon, um violão. Poder fazer os três elementos da música ao mesmo tempo, melodia, ritmo e harmonia. Ou seja, a polifonia no instrumen­to. Isso tem 15 anos, quando mandei fazer o primeiro bandolim com dez cordas. Não sei se é econômico porque tem uma equipe gran­de comigo. São seis pessoas mais a produção viajando juntas.

Tem projetos com outras formações em andamento?

Tem O Baile do Almeidinha, no Rio de Janeiro, uma vez por mês, com banda, para as pessoas dançarem. Lancei o disco há pouco tempo. Tem o trio, que é o arroz com feijão. Com ele, venci as categorias de Melhor Disco Instrumental e Melhor Solista no Prêmio da Música Brasileira. Tem um duo com o pianista italiano Stefano Bollani. Este ano, a gente foi para a Austrália e uma porção de lugares. Tem os duos esporádicos, com Yaman­du Costa, André Mehmari. E um disco em fase de mixagem, com músicas infantis, que gravei com a Orquestra Sinfônica de Mato Grosso.

Inspiração ou transpiração? Qual o melhor momento do dia para compor?

A transpiração é fundamental. Mas, sem inspiração, não tem como. Eu não sei calcular as medidas. Se são 99/1, 95/5 ou 90/10. A transpiração é maior. A gente aproveita a inspiração para trabalhar bastante e criar algu­ma coisa legal. O melhor momento para com­por é qualquer hora. Eu componho subindo a escada, no elevador, no carro, na sala com meus filhos brincando, de madrugada em silêncio total, no avião.

Como é que se dá nome a uma composição instrumental?

Às vezes, quero homenagear uma pessoa. Às vezes, um acontecimento. Às vezes, vem um nome primeiro. Às vezes, a música tem cara de sol ou é amorosa. É como se fosse um retrato da realidade. O nome depende da inspiração e do que acontece.

A Escola e a Bola leva à seguinte pergunta: qual seu time do coração?

Torço pelo Flamengo. Ele está melhorando no Brasileirão. Vamos ver se pega um G4. Mas o nome dessa música é um desejo de que o professor seja tão valorizado e tenha tanta importância quanto um jogador de futebol. Adoro o esporte, mas acho essa correção necessária. Um professor é muito mais importante e mais desvalorizado.

Há ecos lusitanos na faixa Calliandra Flor? A quantas anda sua carreira lá fora?

O som do bandolim lembra a guitarra portuguesa e a herança do fado. Mas Calliandra foi pensado na secura, na flor do Cerrado, que é felpuda e bonita. A carreira internacional vai bem. Tenho bastante atividade lá fora, todo ano. Para mim é muito importante. Um orgulho, na verdade. Tenho cinco discos sen­do lançados na Alemanha por um selo de jazz, o MPS. Meu fuso horário é muito doido.

Qual o perfil do seu ouvinte? Já é difícil ouvir música instrumental no Brasil. O bandolim solitário não dificulta a absorção?

Eu toco para todo mundo. Se meu filho de 8 anos e meu pai de 80 gostarem, é sinal que vai dar certo. Espero que crianças, jovens, pessoas experientes e idosos gostem da minha música. Eu toco para quem estiver a fim de ouvir. Agora, depende do show. O Baile do Almeidinha tem mais jovem. No teatro é misturado. Penso em gravar sempre para o Brasil e para o mundo. Sou brasileiro, mas do planeta Terra. O que eu fizer aqui tem que ter um nível internacional. A busca do artista pelo público é eterna e meu objetivo é acarinhar os ouvidos. Um vizinho me disse, uma vez, que não sabia que pessoas sentavam para assistir um show que não tem cantor. O bandolim não é um instrumento muito conhecido, mas é o meu instrumento e não tem essa dificuldade de ser solitário. O importante é a be­le­za chegar ao coração.

Sua linguagem é universal por ser, aci­ma de tudo, nacional?

Podemos dizer que sim. A essência da minha linguagem é o chorinho. Com samba, moda de viola, maracatu, frevo, xote, baião eu tenho contato desde a infância. É tudo isso junto. Quem é brasileiro se reconhece nesses elementos. Mas eu ouço a música do mundo. Viajo, tenho parcerias com artistas estrangeiros. Isso me coloca numa perspectiva universal, como você disse.

Você tira sons inusitados do bandolim em Caboclinho Caipira. Que renovador de linguagem você toma como parâmetro, na hora de experimentar coisas assim?

Nenhum. Isso vem da busca pela beleza. Quero sempre encontrar alguma coisa que eu não fiz. Misturar algum elemento que eu conheça com outro que eu não conheça ou que já tenha conhecido. Daí aparece uma síntese, alguma coisa nova. O bandolim, apesar de pequeno, é ilimitado. Tem timbres e sonoridades que a gente não imagina. Eu acor­do pensando em um som novo, uma com­posição nova, uma parceria nova.

Você explora os graves em Pelo Brasil. É um modo de ampliar sua paleta de cores?

É um modo de colocar o bandolim mais interessante, mais completo e cheio. Um modo de fazer o instrumento soar polifônico. Destacar a diferença entre acorde, melodia, contraponto e ritmo. O grave ajuda muito nisso. É a diferença do meu instrumento para os outros. O bandolim de dez cordas tem uma cor­da mais grave em relação às outras.

Ainda vale a pena gravar CD? Você tem intimidade com as redes sociais?

Não existe apenas uma mídia para o registro. Eu gravo CD, o que ainda é bom. Eu gosto. Fora do Brasil, em show, o pessoal compra bas­tante. Mas os discos estão disponíveis em todas as plataformas digitais. Uso muito as re­des sociais para fazer divulgação. Não tem co­mo trabalhar sem elas.

Yamandu Costa vai gravar um disco cantando. Já pensou em algo semelhante?

Fiz um show, semana passada, em que cantei algumas músicas. Não me vejo como cantor, mas a voz é um instrumento que posso usar. Não sei se vou gravar um disco inteiro cantando, mas posso gravar solando uma música. Não me fecho para nada.

Andando pelo Brasil mais uma vez em crise, como vai seu humor com a política?

Nem otimista, nem pessimista. Realista e esperançoso. No momento, existe uma dis­puta de poder que leva o Brasil para o buraco. Precisamos de certa serenidade geral, dos governantes e da população, para resolver os problemas. Bater cabeça não adianta. O Brasil passou por outras crises e conseguiu superá-las. Desejo que as pessoas que mandam tenham serenidade para encontrar um ponto de equilíbrio.

Hamilton de Holanda

Quando: Hoje (12 de setembro)

Onde: Centro Cultural UFG (Avenida Universitária, nº 1.533 – Setor Universitário – 3209-6251)

Horário: 21 horas

Ingresso: R$ 40 (R$ 20 a meia)