Professora relata agressão de aluno em sala: “Deu soco no meu rosto”

Data: 29 de setembro de 2015

Veículo: G1 Goiás

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Série de reportagem do JA1 mostra dificuldades e problemas na profissão. Muitos têm o pedido de licença por aprimoramento negado, em Goiás.

 

Professores da rede pública de Goiás relatam que enfrentam diversas dificuldades para conseguir ensinar os alunos. Além do baixo salário e da dificuldade de conseguir uma licença para se aprimorar na carreira, alguns docentes revelam que já foram até agredidos dentro de sala de aula. Em um dos casos, o estudante bateu na professora por conta de uma lapiseira. “Ele deu um soco no meu rosto, no meu olho direito, e vários chutes na minha perna direita”, disse.

Sem querer se identificar, a professora disse que dava aula de matemática para adolescentes do 9º ano do ensino fundamental quando a agressão aconteceu. “Uma aluna me pediu pra ajudá-la porque um aluno tinha tomado a lapiseira dela e estava xingando. Eu pedi pra ele trocar de lugar e ele não quis. Quando coloquei o material dele em outra carteira, ele pulou em cima de mim”, relembra.

Durante os socos e chutes, a docente caiu sobre uma carteira. Devido a isso, ela tem feito acompanhamento médico com um fisioterapeuta, pois ficou com ferimentos na coluna. Mesmo machucada, chegou a ir trabalhar durante cinco dias, sem contar para familiares do que aconteceu.

“Eu estou com medo de acontecer coisas piores. Eu não esperava passar por isso, mas, infelizmente, eu não vou conseguir voltar para uma sala de aula”, disse chorando a professora, que trabalhou durante 30 anos na rede de ensino.

Formação

Além das agressões, a categoria alega que tem que recorrer à Justiça para ter direito à licença remunerada durante o período em que fazem cursos de aprimoramento, como mestrado, em Goiás. Os educadores relatam que têm o direito negado por falta de professores.

Por lei, quando um professor da rede pública escolhe fazer um mestrado, por exemplo, ele tem direito a uma licença por aprimoramento. Ele continua recebendo o salário normalmente, mas fica afastado para se dedicas aos estudos pelo tempo que durar o curso. Atualmente, 95 docentes estão em processo de qualificação em Goiânia, Aparecida de Goiânia e também na rede estadual. De acordo com o Sindicato dos Professores, a maioria desses profissionais teve o pedido de licença negado.

O professor Renato Reges do Carmo foi um dos que teve o benefício inicialmente negado. Ele trabalha nas redes estadual e municipal de Goiânia. Somando as duas áreas, ele recebe um salário de R$ 4,5 mil. Ele passou no mestrado em educação pela Universidade Federal de Goiás, mas só conseguiu a licença remunerada após procurar a Justiça.

“Dei entrada pra ter licença aprimoramento na rede estadual e municipal e as duas foram negadas. Não há estimulo algum, e quando o professor consegue, ele ainda tem barrado esse direito o que é ilegal. Eles tentam negar com base em portarias que de forma alguma vão estar acima dessa legislação que já está prevendo a licença”, disse Renato.

A pedagoga Rosenei Abadia Damásio trabalha nas redes estadual e municipal de Aparecida de Goiânia. Ao entrar com o pedido de licença, também teve o benefício negado sob a alegação de que faltam professores em sala de aula, por isso não poderia se ausentar.

Professora teve pedido de licença por aprimoramento negado, em Aparecida de Goiânia, Goiás (Foto: Reprodução/TV Anhanguera)

Professora teve pedido de licença por aprimoramento negado (Foto: Reprodução/TV Anhanguera)

Assim como Renato, a pedagoga recorreu à Justiça. Porém, o pedido foi negado em primeira instância e agora ela aguarda o recurso. “Sempre foi um sonho me aperfeiçoar, fazer um mestrado na minha área. Quando passei na seleção, fui na secretaria para dar entrada na licença por aprimoramento. Para minha surpresa, foi negado”, relata.

Mesmo sem a licença, Rosenei começou a fazer o mestrado, que tem uma mensalidade de mais de R$ 1,8 mil. E para deixar a situação ainda mais crítica, ela tem o ponto cortado todas as vezes que vai ao curso.

“Minha situação é muito complicada porque eu não posso me ausentar da escola pra fazer o mestrado. Eu estou tendo um gasto, eu estou pagando um mestrado e ainda estão cortando o meu ponto porque estou me aprimorando. Está mais fácil desistir, mas não vou. Gosto muito do que faço. Talvez por isso eu esteja lutando tanto. Porque eu acredito muito na educação”, disse.

Exemplo

Apesar de ter o pedido de licença por aprimoramento negado e enfrentar diversas barreiras para se qualificar, a professora Silvia da Luz, de Senador Canedo, na Região Metropolitana da capital, não desistiu. Ela trabalha na rede municipal e estadual de ensino. Para fazer o mestrado, precisou pagar do próprio bolso.

“Sala de aula pra mim é muito mais do que um emprego. É um espaço de pesquisa. É um laboratório de experiências. É saber que estou contribuindo com esse Brasil, que realmente pode ser melhor”, relata.

Professora pagou mestrado sem conseguir ter licença e ganhou dois prêmios nacionais, em Senador Canedo, Goiás (Foto: Reprodução/TV Anhanguera)

Professora ganhou dois prêmios nacionais pelo trabalho desenvolvido (Foto: Reprodução/TV Anhanguera)

E todo esforço foi compensado. O Ministério da Educação reconheceu os projetos desenvolvidos por Sílvia e deu a ela o Prêmio Professores do Brasil em 2013 e 2014. Porém, essa não é a maior realização da docente.

“O maior premio é saber que estou sendo reconhecida não no prêmio. Eu estou sendo reconhecida na minha cidade. Porque eu tenho alunos aqui que as mães ficaram na fila de espera, pedindo a vaga na minha sala, porque queriam que o filho fosse aluno da professora Sílvia”, conta com lágrimas nos olhos.

 

Temporários

Para quem é servidor temporário, a situação é ainda mais crítica. Muitos precisam trabalhar em dois empregos cara conseguir ter um bom salário. O piso salarial da categoria é de R$ 1.917,78. Porém, os docentes contratados sem concurso chegam a receber R$ 1,5 mil.

Segundo um professor que não quis se identificar, os contratos temporários são constantemente rompidos e renovados para evitar que se crie o vínculo trabalhista e para que recebam uma remuneração melhor.

“A gente que estuda, faz graduação, faz especialização, nosso objetivo era ganhar melhor. Mas não vou ganhar mais por isso”, desabafa o docente.