Vai aumentar, mas não melhorar

Data: 05 de Fevereiro de 2016

Fonte/veículo: O Popular

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Aumento do valor da passagem de ônibus não virá acompanhado de pacotes de melhorias, como em anos anteriores

                                           

 05/02/2016 06:00    Sebastião Nogueira   

                                                                                                                                          Terminal Praça da Bíblia: incerteza em relação ao horário de chegada dos ônibus prejudica e afasta usuário do sistema                                                                                                                                

 

A tarifa do transporte coletivo da região metropolitana de Goiânia vai aumentar de R$ 3,30 para R$ 3,70 amanhã, mas as próprias empresas admitiram que não haverá investimentos para melhorar a qualidade das viagens ou reduzir o tempo de espera. Este ano, o anúncio sequer veio acompanhado de promessas. As autoridades públicas e os empresários foram taxativos: não estão previstas mudanças. A alegação é de que o valor do reajuste não cobre o déficit atual das operações e por isso é insuficiente para investimentos.

 

Desde maio de 2014, a Câmara Deliberativa de Transportes Coletivos (CDTC) só se reuniu duas vezes e, em ambas, para definir o reajuste tarifário. O colegiado formado por representantes da Prefeitura de Goiânia, governo de Goiás, Assembleia Legislativa, Câmara de Goiânia e prefeituras da região metropolitana não se encontrou para discutir qualquer outro tema, como propostas de melhorias. E assim o sistema vai perdendo passageiros, indignados com a falta de qualidade, ônibus lotados e atrasados.

 

Especialista em transportes, o professor do Instituto Federal de Goiás (IFG) Marcos Rothen afirma que isso é uma falha de planejamento das empresas concessionárias. “É possível melhorar independentemente da tarifa. Temos um sistema de péssima qualidade e mal operado”, afirma.

 

Segundo Rothen, os erros são básicos e chegam ao cúmulo de colocarem ônibus nos horários errados e viagens equivocadas, de modo que dois veículos de uma mesma linha cheguem juntos a um mesmo ponto, quase sempre um lotado e outro vazio. Nos horários de pico, passam até dois lotados. “As pessoas vão ficando transtornadas com isso, você passa nos pontos e isso é visível, elas chegam a andar mais para ir a um ponto anterior e conseguir pegar o ônibus, é um absurdo.”

 

Até por isso, o professor indica que a tarifa tem valor secundário na decisão dos usuários: “O problema é a qualidade”. Rothen considera uma falácia condicionar a melhoria da qualidade ao aumento da tarifa. “Tudo que colocam como problema está calculado na tarifa, o usuário é quem paga por tudo. Fala-se das gratuidades, da distância percorrida, mas tudo é colocado no cálculo para se chegar na tarifa. Não melhoram não é por culpa da tarifa”, diz.

 

O preço, então, é condicionante apenas para o usuário, mas não para o restante do sistema. Isso interfere apenas na continuidade do círculo vicioso, já que faz perder usuários e aumentar o valor. Esses usuários vão usar transporte privado, aumentar o tráfego, causar congestionamento, os ônibus vão se atrasar, outros usuários vão deixar o sistema e assim continuamente.

 

“A experiência do transporte coletivo extrapola o serviço de transporte coletivo. Por isso é tão difícil e complexa sua melhoria. Quando se fala que o transporte precisa ser prioridade da gestão pública para ter qualidade, não estamos falando só dos órgãos de transporte e trânsito”, sintetiza a arquiteta e urbanista e professora da Universidade Federal de Goiás (UFG), Erika Cristine Kneib. Ou seja, para ela, é preciso mais do que tarifa para se iniciar a melhoria, a começar por dar prioridade aos ônibus nas ruas.

 

Mesmo que o preço da passagem influencie a decisão de continuar ou deixar de ser usuário dos ônibus, Erika acredita que dois outros fatores são mais prejudiciais ao sistema, ao serviço e à mobilidade. Um deles é a segurança pública, o que inclui o tempo desde a saída da residência, a chegada e a espera no ponto de embarque e mesmo a dificuldade de acesso. O outro ponto é a ausência de políticas que desestimulem o uso dos veículos particulares. Atualmente, utilizar um carro próprio é uma opção sedutora e fácil.

 

O fato é que, sem esses cuidados, os usuários vão deixando os ônibus. Aqueles que ficam, por absoluta necessidade, alimentam o sonho constante de conquistar um carro ou uma motocicleta.

 

E a situação cria um círculo vicioso: com a perda de demanda, o serviço vai ficando cada vez mais caro e menos eficiente. E mesmo com menos pessoas, os veículos continuam lotados e sem pontualidade.

 

Para Erika Kneib, o rompimento do círculo ocorreria com a criação da infraestrutura prioritária para ônibus, o planejamento da cidade para facilitar o transporte coletivo e mesmo o financiamento deste por parte da sociedade e/ou do poder público.

 

PODERIA MELHORAR?

 

Diversos aspectos do sistema de transporte contribuem para queda na qualidade do serviço

 

- Tarifa: A passagem é considerada cara pelo serviço oferecido e faz com que os usuários busquem formas alternativas de transporte

 

SOLUÇÕES

 

  • Gratuidades são pagas pelos usuários, mas poderiam ser assumidas pelo poder público

  • Fraudes também encarecem a tarifa. As concessionárias deveriam investir na fiscalização e os usuários ajudarem

  • O poder público poderia diminuir a tarifa aos usuários pagando subsídios, como é feito no Eixo Anhanguera

 

 

 

- Confiabilidade: A dificuldade em ter a certeza de que o ônibus vai passar no horário definido e chegar na hora necessária ao destino prejudica o usuário do transporte coletivo

 

SOLUÇÕES

 

  • Aprimorar o planejamento das planilhas de horários, com pesquisas de origem e destino, de modo a não gerar atrasos e lotações

  • Fiscalizar o cumprimento das planilhas realizadas, pelos horários e quantidade de veículos

  • Concessionárias também devem fazer a operação seguindo as planilhas e fornecer dados para aperfeiçoamento

 

- Pontos e terminais: Um dos principais pontos de reclamação dos usuários são os locais de espera dos ônibus e a falta de segurança neles

 

SOLUÇÕES

 

  • Terminais são de responsabilidade das empresas e devem melhorar com relação à informação aos usuários

  • Já os pontos de rua são de responsabilidade da CMTC e muitos deles devem ser reformados e até construídos

  • Se há segurança privada nos terminais, falta segurança pública nas ruas; soma-se a isso a iluminação das vias e a roçagem de lotes baldios

 

- Planejamento urbano: Empresas culpam o trânsito pelo descumprimento de planilhas, mas falta de qualidade no transporte faz aumentar número de veículos

 

SOLUÇÕES

 

  • Transporte coletivo deve ser prioridade no trânsito, de modo que passe a ser mais confiável usá-lo do que o veículo privado

  • Prefeituras devem propor infraestrutura, como corredores preferenciais e regras priorizem os ônibus

  • O espraiamento da cidade faz com que se locomova por maiores distâncias, elevando custo do transporte, tempo de espera e lotação dos terminais

 

- Sistema metropolitano: A presença de 18 cidades torna o processo político de admissão das responsabilidades mais complicado

 

SOLUÇÕES

 

  • Há um problema de troca de responsabilidades entre Estado, Prefeitura de Goiânia e demais Prefeituras, que deveriam agir em conjunto

  • Sem responsáveis, há pouca discussão sobre o sistema metropolitano, tanto que há dois anos os gestores só se reúnem para reajustar a tarifa

  • A discussão está em torno de criar tarifas alternativas, dependendo da distância percorrida. Ajuda quem mora no Centro, mas prejudica moradores das periferias e de fora da capital

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