Classe média retorna à escola pública

Data: 06/03/2016

Veículo: O Popular

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Crise financeira é apontada como motivo, mas educadores citam melhora na qualidade do ensino e sistema de cotas em universidadesA description...

 

 

Até o ano passado, a recepcionista Edna Santos, de 43 anos, mantinha os dois filhos em uma escola particular. Agora, Erik e João Marcus, de 9 e 10 anos, frequentam um colégio da rede estadual de ensino. A opção de Edna está longe de ser um caso isolado e reflete o movimento de volta da classe média para a escola pública.

Uma estimativa da Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen) aponta que a rede privada encolheu 12% no ano passado, em comparação a 2014. O índice corresponde a uma perda de 1 milhão de alunos em todo o País. Em Goiás, essa perda teria sido de 28 mil alunos nos últimos dois anos. A migração, iniciada em 2014, tem a crise financeira como causa principal. Mas especialistas apontam que o sistema de cotas nas universidades para estudantes das rede pública e a melhoria do ensino como aspectos que também contribuem para a mudança.

Entre os fatores que motivaram a decisão de Edna estão a perda do poder aquisitivo e a necessidade de colocar as crianças em uma unidade de tempo integral. "Eu ganho o salário e comissão. Com a crise, ficou mais difícil bater a meta e receber o valor adicional. Gastava R$ 580 só com a mensalidade, mas também pagava transporte escolar e alimentação", conta.

Para escolher a nova escola, Edna optou por uma unidade de ensino perto de onde trabalha. Assim, ela consegue levar os filhos de manhã e buscar no período da tarde sem precisar pagar um transporte escolar.

A recepcionista diz que tanto ela quanto as crianças aprovaram a mudança. "Estava com muito medo de colocá-los na rede pública, mas fiquei surpresa com a qualidade e a atenção das professoras. Tem mais atividades que eu precisava pagar, como futsal e xadrez. Aqui as crianças também ajudam a cuidar de uma horta e meus filhos estão encantados com o projeto", elogia.

Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (UFG), a doutora em educação Geovana Reis diz que o fenômeno pode repetir o cenário ocorrido entre as décadas de 1940 e 1960, quando a classe média tinha grande presença na escola pública. “A partir da década de 70, começa o movimento em direção à escola privada", relata.

Geovana defende que o retorno da classe média à rede pública não se dá apenas pela perda do poder aquisitivo das famílias. Para ela, também há um processo de melhora da qualidade. “Considero um equívoco achar que toda escola pública é ruim e toda particular é boa. Na rede municipal de Goiânia, mais de 90% são professores têm pelo menos uma especialização."

Entretanto, a auxiliar administrativa Adriana Aparecida Caetano, de 34, nota diferença na qualidade dos dois modelos de escola. Mãe de Kassio Caetano Franco, de 14, ela compara: o colégio particular informa bem mais sobre a situação do aluno e os pais são chamados mais a participar. É uma atenção diferente".

Até o ano passado, o filho de Adriana havia estudado apenas em escolas privadas. No 9º ano do ensino fundamental, agora frequenta um colégio estadual no Setor Maísa.

Adriana diz que a despesa ia além da mensalidade. Livros caros, gastos mensais com o lanche e transporte impactaram no orçamento da família. Agora, o filho estuda perto de casa, vai à escola de bicicleta e se alimenta com a merenda escolar.

Quando se deu conta que teria de economizar o dinheiro que usava para manter o filho em uma instituição privada, Adriana passou por um período de sofrimento: "Chorei muito. A mãe sempre quer o melhor para o filho", relata.

Conseguir uma vaga na rede pública não foi tarefa fácil. Adriana diz ainda que, após conseguir a concorrida vaga, sequer conseguiu escolher o horário.

Segundo Adriana, o filho sente falta do escola antiga e planeja: “Quando eu tiver condições, quero colocá-lo em um colégio melhor".