Erosões em bordas de reservatórios

Data: 01/04/2016

Veículo: Canal Ciência

Link da notícia: http://www.canalciencia.ibict.br/pesquisa/0300_Erosoes_em_bordas_de_reservatorios.html

 

O que é a pesquisa?

O Brasil, por suas características geográficas, possui uma enorme quantidade de água doce superficial, distribuída em rios e lagos: aproximadamente 12% de toda a água doce do planeta, enquanto que toda a Europa só tem 7%. Se a quantidade média de chuva no mundo é de aproximadamente 800 mm anuais, na maioria dos municípios brasileiros a quantidade é quase o dobro disso.

A grande disponibilidade de água superficial no território brasileiro explica o porquê do abastecimento de água para a população, animais e para a geração de energia estar associado aos rios. Entretanto, esse volume de água e de chuvas não é constante ao longo do ano, e também varia de ano para ano. Daí surge a necessidade de se reservar a água do período mais chuvoso para ser usado nos meses que chove menos. Construímos grandes reservatórios de água para atender as necessidades humanas de forma equilibrada, evitando a escassez no período de pouca chuva. Mas será que cuidamos bem dos reservatórios? E o que a erosão tem a ver com isso?

Erosões provocam o desprendimento de partículas de solo que são arrastadas pelas chuvas para dentro dos reservatórios ou para cursos de água que deságuam nos reservatórios. Parte do volume de solo que chega ao reservatório fica em suspensão, deixando a água turva e com coloração marrom-avermelhada, e essa alta turbidez leva a uma diminuição da qualidade da água. Outra parte deposita-se no fundo do reservatório, processo conhecido como assoreamento. Com todo este aporte contínuo de sedimentos, os reservatórios vão perdendo sua capacidade de acumulação de água, o que reduz sua vida-útil. Um menor volume d’água acumulado pode afetar drasticamente vidas e serviços que dela dependem. Quem não se lembra da crise de água na cidade de São Paulo em 2015, ou do racionamento de energia elétrica no início dos anos 2000?

Atentos ao assoreamento de reservatórios de usinas hidrelétricas (UHEs) na região central do Brasil, pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG), com o apoio de Furnas Centrais Elétricas, observaram os processos erosivos presentes nas margens e áreas do entorno de reservatórios com o objetivo de compreender a dinâmica do processo de assoreamento, suas causas e consequências. Foram estudados três reservatórios com diferentes idades: UHE Furnas, no estado de Minas Gerais, construído na década de 1960, UHE Itumbiara, situada na divisa entre Goiás e Minas, construída nos anos 80, e UHE Batalha, também localizada entre os dois estados, obra concluída em 2012, cujo reservatório ainda não havia enchido quando a pesquisa foi iniciada.

Como é feita a pesquisa?

O primeiro estudo no âmbito da pesquisa abordou a geologiageomorfologiageotecniatopografia, uso e ocupação das áreas no entorno de cada reservatório, com o intuito de elaborar ‘mapas de erodibilidade’ dos solos’, os quais apresentam todas as características e informações obtidas ao longo do estudo e classificam as áreas com maior ou menor risco de erosão.

Em um segundo momento, foram utilizadas imagens aéreas dos reservatórios, nas quais era possível identificar casos de erosão. Os profissionais que trabalham nos reservatórios participaram dessa etapa identificando, nas imagens, os casos já conhecidos. Os locais mais atingidos pela erosão foram visitados e cadastrados. Em cada local foi possível fazer um diagnóstico preciso da erosão. Obras de recuperação de baixo custo foram implementadas nos locais afetados pela erosão, que passaram a ser monitorados ao longo de toda a pesquisa. Parte da equipe de pesquisadores dedicou-se ao levantamento da chegada de sedimentos aos reservatórios através de córregos. Outra parte da equipe estudou o impacto da energia das ondas geradas pelo vento nas margens dos reservatórios, que também podem provocar erosão, além da perda de áreas produtivas próximas. Em locais de maior probabilidade de ocorrência de ondas, foram instalados equipamentos submersos para avaliação da energia. Esses locais são monitorados periodicamente com um Laser Scanner, equipamento que faz rapidamente levantamento topográfico gerando imagens em 3D.

Várias ações de educação ambiental foram realizadas junto aos moradores do entorno dos reservatórios. Foram oferecidos cursos, palestras e oficinas em escolas e universidades, para divulgar os prejuízos da erosão e do assoreamento, bem como capacitar multiplicadores de todas as idades para ações positivas. Vasto material didático está sendo produzido pela equipe de pesquisadores, com base nos resultados obtidos com os estudos, como um livro técnico e duas cartilhas sobre os problemas relacionadas à erosão e a necessidade de colaboração de todos na manutenção  dos reservatórios.

Qual a importância da pesquisa?

A manutenção da capacidade de armazenamento e da qualidade da água estocada em reservatórios é fundamental para o futuro do país. Os recursos hídricos devem ser bem gerenciados. Um grande reservatório ou curso d’água totalmente assoreado traz muitos danos e prejuízos, como foi observado no recente derramamento de lama no rio Doce, MG.

O combate à erosão e ao assoreamento requer a contribuição de todos e não somente das empresas que operam hidrelétricas ou o abastecimento de água das cidades. Os maiores problemas decorrem da ocupação inadequada do entorno dos reservatórios.  Instalação de condomínios, atraídos pela beleza visual dos reservatórios, construção de novas estradas, cultivos e exploração da terra em áreas próximas às margens são algumas das principais causas geradoras de erosão que contribuem para o aumento de sedimentos que chegam aos reservatórios.

A metodologia desenvolvida na elaboração dos mapas de erodibilidade dos solos próximos aos reservatórios poderá ser utilizada nos estudos de implantação de novos reservatórios, na determinação prévia de áreas com maior potencial de geração de sedimentos e no  direcionamento de ações governamentais para minimizar o problema. Está clara a importância de se buscar alternativas de correção, aplicando materiais da região com baixo impacto ambiental e custo, pois a soma da extensão do perímetro somente destes três reservatórios é maior do que o comprimento da costa brasileira (mais de 9.000 km, já considerando as reentrâncias) e soluções tradicionais de tratamento de erosões em cidades nem sempre resolvem os problemas nos reservatórios.

Por fim, a maior lição apreendida pelos pesquisadores foi a da importância da educação ambiental. O combate à erosão é problema de todos e só pode ser enfrentado se for com a participação de todos. A manutenção dos reservatórios é responsabilidade de todos que deles necessitam.