Gado curraleiro pé-duro trazido pelos portugueses resiste ao tempo

Data: 06/05/2016

Veículo: O Popular

Link da notícia: http://www.opopular.com.br/editorias/noticias/economia/gado-curraleiro-p%C3%A9-duro-trazido-pelos-portugueses-resiste-ao-tempo-1.1081365

 


Seleção natural ao longo dos séculos adaptou a raça a condições climáticas, sanitárias e nutricionais precárias

Considerado um patrimônio da genética bovina nacional, o gado curraleiro pé-duro entrou em processo de extinção durante o século 20 com a crescente expansão das raças zebuínas. A raça é descendente dos bovinos trazidos pelos portugueses no período colonial e ao longo dos séculos esses animais se adaptaram às condições climáticas, sanitárias e nutricionais precárias, com escassez de alimentos e água, adquirindo características como rusticidade, resistência a parasitas e a plantas tóxicas consideradas mortais, a exemplo do cafezinho.

A professora Maria Clorinda Soares Fioravanti, pró-reitora de Pesquisa e Inovação da Universidade Federal de Goiás (UFG), foi convidada em 1996 pela Associação Brasileira de Gado Curraleiro a ajudar no projeto de reconhecimento da raça junto ao Ministério da Agricultura. O registro obtido em 2012 abriu novas perspectivas para a raça e para produtores interessados em criá-la.

Projeto de reintrodução da raça foi feito em comunidade calunga situada no município de Cavalvante

Em 2004, segundo a professora, o Ministério da Integração Nacional concedeu o primeiro aporte de recursos e a professora pôde fazer um levantamento dos animais espalhados em Goiás e no Tocantins. “Visitei mais de 20 fazendas e fizemos um primeiro documento, um relatório do rebanho e sua caracterização sanitária em Goiás e no Tocantins.”

Em 2006, a equipe da UFG liderada por Maria Clorinda foi convidada para reintroduzir o gado curraleiro no território Calunga, remanescente de um quilombo localizado em Cavalcante (GO), a pedido da própria comunidade, e intermédio do Ministério da Integração Nacional. “O primeiro ano foi um desafio. Uma seca causou a morte de muitos animais.”

Hoje o rebanho na comunidade soma 180 animais. Todo ano é feito um controle dos animais. A cada dois nascido, um é da família criadora e o outro do projeto, que forma novos lotes, que são repassados para uma nova família.

Em 2010, conta a professora, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) lançou um edital que permitiu a formação da Rede Centro Oeste de Pós-Graduação, Pesquisa e Inovação – Pró-Centro-Oeste, de estimulo à biotecnologia. “Isso proporcionou um avanço na pesquisa de duas raças, curraleiro pé-duro e pantaneiro, um primo do pé-duro do Piauí, duas raças bovinas tipicamente brasileiras”, diz Maria Clorinda.

Em 2011 foram aprovados nove projetos, totalizando recursos de R$ 2 milhões, em que também estavam embutidas a formação de recursos humanos, com novos mestres e doutores. “Os projetos contemplam a caracterização genética, do leite dos animais, das carcaças, aspectos de resistência a doenças e a intoxicações.”

A primeira etapa da Pró-Centro-Oeste foi realizada em um ciclo de cinco anos de trabalho. Em 2013, foram liberados mais R$ 1 milhão em recursos, o suficiente para mais três anos. “O triste é que a rede acabou. Agora estamos num trabalho de convencimento para tentar a reedição.”

Da situação de vulnerabilidade extrema em que se encontrava, o curraleiro pé-duro evoluiu bastante. Foi reconhecido como raça, já conta com uma sólida literatura científica e com interesse pelo seu valor genético e histórico. “Hoje as pessoas têm orgulho de dizer que são criadores da raça e isso já nos deixa satisfeitos.”