Mercado à espera do parque

Data: 1º de dezembro de 2014

Veículo: O Popular

Mesmo sem data para ser construído, espaço público já explorado pelo setor imobiliário

Vandré Abreu

Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma) ainda finaliza o estudo topográfico da área do Parque do Cerrado, no Setor Park Lozandes, cujo projeto apenas se inicia. Não há nem previsão para sua construção, mas o parque já é usado por construtoras para venda e valorização de imóveis ao seu redor. Um vídeo da construtora Euroamérica convida investidores para empreender o Europark, que deve ficar em frente ao Parque do Cerrado, numa distância de 300 metros. O investimento inicial já chega a R$ 5 milhões.

O vídeo afirma que o Park Lozandes, atualmente longe de equipamentos públicos e do lado oposto da BR-153 em relação à Região Sul, a mais rica de Goiânia, deve mudar com a construção do Parque do Cerrado. O discurso é que o desenvolvimento ocorreria como foi no Jardim Goiás, com o Parque Flamboyant, ou parte do Setor Bueno, com o Parque Vaca Brava. O Parque do Cerrado já foi instituído por decreto pela Prefeitura e o montante para seu investimento virá da desafetação de áreas públicas definidas em lei do final de 2013.

Há quatro áreas públicas, segundo a lei de desafetação, para serem vendidas à iniciativa privada no Park Lozandes, além daquelas que foram ou serão doadas para equipamentos públicos, como o Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO) e Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás (TCM-GO). Estas áreas também estariam a uma distância de, no máximo, 300 metros do parque. O Paço ainda não definiu quando as áreas serão leiloadas e nem quanto será o valor inicial pedido.

O mercado imobiliário sabe, no entanto, que o valor sem a construção do parque é bem menor do que depois que o equipamento estiver pronto. Como o investimento municipal no parque depende da desafetação das áreas, o mais provável é que o mercado adquira as áreas sem esta valorização, mas tendo a certeza de que o investimento vale o risco. Agentes do mercado ouvidos pelo POPULAR confirmam que não há nada, em Goiânia, que valorize mais uma área do que um parque.

VALORIZAÇÃO

Coordenador de vendas da Euroamérica, Edmilson Borges elaborou estudo abrangendo os cinco parques mais valorizados de Goiânia, como Vaca Brava, Areião, Bosque dos Buritis, Lago das Rosas e Parque Flamboyant. No levantamento, ele verificou que um empreendimento de mesmo porte realizado atualmente em comparação com outro realizado antes do parque ou há dez anos tem uma valorização no metro quadrado que chega a 520% no Lago das Rosas, por exemplo. “Os números mudam muito, até mesmo no quarteirão, entre os prédios com vista para o parque e os que não possuem”, afirma.

Borges revela que os goianienses gostam muito de utilizar o parque, não se restrigindo apenas à vista, mas que esta unidade da onde se vê totalmente o parque chega ao ápice da valorização. “Nada em Goiânia valoriza mais um imóvel do que um parque; é algo comparado ao mar em uma cidade litorânea, mas como não temos o mar, as pessoas elegem o parque como melhor equipamento.” Sobre o Europark, ele revela que se trata de uma valorização ao investidor, que não é cobrada dele. “O parque numa região é como uma pedra jogada em um rio, vai fazendo uma onda em que quanto mais próximo mais valorizado fica.”

Mesmo sem a opção de ter a vista diretamente para um parque, um imóvel próximo continua sendo valorizado por se tornar uma opção de lazer. Fernando Razuk, vice-presidente de Incorporação, Pesquisas e Estatísticas da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Goiás (Ademi-GO) afirma que os parques são utilizados com frequência pelos moradores vizinhos, até por se tratar de uma opção democrática, que abrange todos os gostos e pessoas, além de ser gratuita. “Você vê crianças brincando, idosos praticando exercícios, tudo pode ser feito.”

 

 

Urbanista cita necessidade de estudos

 

Arquiteto e urbanista e membro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAU-GO), Álvaro Fernandes de Oliveira explica que os projetos dos parques em Goiânia não condizem com a vizinhança que possuem. Segundo ele, as dimensões dos equipamentos urbanos devem ser diferentes se ocorrem em locais de condomínios horizontais ou verticais. Neste último, o estudo deve ser mais complexo por conter mudanças ambientais e sociais.

Do ponto de vista urbano e paisagístico deveria ocorrer um melhor estudo, pois vemos parques lotados em determinados horários porque são muitas pessoas morando e utilizando o local. No caso, as calçadas são muito curtas e os pedestres são obrigados a conviver com os ciclistas”, explica Oliveira. Além disso, no caso dos empreendimentos verticais, quanto mais altos são, maior será a sua fundação e isso faz um rebaixamento do lençol freático na mesma intensidade, prejudicando o bioma que, a princípio, deve ser protegido pelo parque.

Na existência de nascentes, o problema é ainda maior, como nos parques Cascavel, Flamboyant e Vaca Brava, mas também é prejudicial para parques apenas com arborização, como será o Parque do Cerrado. Isto ocorre porque as torres mais altas bloqueiam as correntes de ventos e modifica o sombreamento. “Muitas vezes uma parte do parque fica sem receber o sol diretamente, como seria o natural para as espécies”, explica Oliveira.

Em contrapartida, há solução, segundo o urbanista, como a possibilidade de exigir prédios mais baixos na proximidade dos parques, de até cinco andares, cujos empreendimentos de torres mais altas deveriam ser mais afastados e, de qualquer forma, permitiria a vista aos outros moradores. “Em parceria com a iniciativa privada fica mais difícil, pois gera um desequilíbrio, necessitando de galerias maiores para o escoamento e um projeto diferenciado.” Apesar de atribuição do Poder Público, Oliveira acredita que não pode ficar esperando a realização das administrações, sendo necessária a participação de entidades, organizações não-governamentais e conselhos populares.

Tamanho reduzido devido à desafetação

 

Gerente de Arquitetura da Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma), Deusmar Aleixo da Silva estima que apenas a finalização do projeto básico do Parque do Cerrado demore cerca de seis meses. A intenção da Prefeitura é aproveitar a área verde localizada entre o Paço Municipal e os condomínios horizontais Alphaville Flamboyant e Araguaia. “Não teremos um lago no local, isso já está descartado, mas é certo que haverá uma pista de caminhada e uma ciclovia.” Há cerca de cinco anos, um projeto do parque vislumbrava até a existência de um teleférico, o que hoje é descartado.

Neste período e em razão da lei de desafetação de 18 áreas públicas, incluindo estas do Park Lozandes, o Parque do Cerrado perdeu sua extensão, como aponta um estudo do Instituto de Estudos Socioambientais (Iesa) da Universidade Federal de Goiás (UFG). Realizado durante a discussão pública sobre a desafetação das áreas, o estudo informa que, originalmente, o Parque do Cerrado existiria em todo o entorno do Paço Municipal, ou seja, começaria nas imediações dos condomínios fechados e chegaria até em frente ao Estádio Serra Dourada.

No entanto, dentre as áreas a serem vendidas, há duas localizadas nesta porção leste, mais próxima ao Estádio e, logo, com melhor acesso da população, via BR-153. Com as vendas, o Parque do Cerrado se restringe à sua porção sul, em que o acesso só poderá ser feito pelo Paço Municipal, pela região dos condomínios fechados, ou pela Avenida PL-02, justamente onde os empreendimentos particulares estão sendo construídos e o mercado imobiliário poderá adquirir os lotes atualmente públicos. O acesso mais fácil, deste modo, será pela GO-020.

Silva afirma que ainda não é possível determinar como será o parque e seus acessos, já que não se sabe como será o projeto dele. “Ainda estamos verificando qual será as dimensões do Parque do Cerrado, não sabemos nem o seu tamanho ainda”, revela. Segundo o gerente da Amma, de todo modo, o Parque do Cerrado está em uma área nova, com pouco espaço para o crescimento de outros empreendimentos, justamente por ser limitada pelos condomínios. Em caso de valorização, deste modo, a outra opção aos investidores seria no Conjunto Riviera, já distante quase 800 metros da área destinada ao parque.