Número de escolas rurais cai pela metade em Goiás

Data: 05 de janeiro de 2015

Fonte: O Hoje

Link da matéria: http://www.ohoje.com.br/cidades/numero-de-escolas-rurais-cai-pela-metade-em-goias/

 

“Nós só conseguimos manter a escola funcionando com a força de vontade dos educadores e dos vários parceiros que acreditam em nosso poder de transformação”, relata a coordenadora da Escola Municipal Serra Negra, localizada na Zona Rural de Piracanjuba, Neidia Maria da Costa. Ela revela que a única ajuda que a unidade de ensino recebe em dinheiro é o valor de R$ 7 mil por ano, repassado pelo Governo Federal. “Para uma escola que mantém 115 alunos isso é quase nada”, desabafa.

A Escola Serra Negra manteve as portas abertas graças ao empenho dos educadores e da comunidade, permitindo com que crianças como Marcela Santos (12) e Mariane Dias (12), (foto) continuem estudando perto de casa. Hoje, as dificuldades continuam. “Recebemos pouco incentivo financeiro do Governo Federal. A prefeitura disponibiliza serviços quando precisamos, por exemplo, em uma reforma. Mas o resto somos nós que arcamos. Para isso, promovemos eventos e festas para assegurar o ano letivo. É um se vira nos 30”, conta Neidia.

A escola rural é uma das cinco sobreviventes em Piracanjuba que precisam se virar para pagar os custos de manutenção. Essa é, justamente, a realidade da maioria das unidades em Goiás. Para especialistas, a falta de investimento é um dos principais fatores para o fechamento de escolas no campo. Nos últimos 10 anos, o número foi reduzido quase pela metade no Estado, de 1.146 para apenas 586, segundo dados do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais). Em média, 56 escolas rurais são fechadas por ano. No Brasil, o cenário é ainda pior: 3.250 encerram as atividades anualmente.

Para a professora da Universidade Federal de Goiás (UFG), Rusvênia Luiza da Silva, que coordenou um estudo sobre as escolas do campo em Goiás, as prefeituras preferem investir na migração dos alunos, o que provoca a queda brusca do número de unidades. “É mais fácil e barato investir no transporte dos alunos para as cidades do que melhorar as escolas do campo. Sem alunos e, na maioria das vezes, sem estrutura adequada, as escolas são obrigadas a fechar”, diz. Isso acaba gerando outro problema, que é o desgaste desses estudantes que chegam cansados por conta da longa distância que percorrem.

Falta de educadores dificulta aprendizado

As salas chamadas multisseriadas – várias turmas juntas – também influenciam no aprendizado na zona rural. “Alunos de séries diferentes aprendem o mesmo conteúdo porque não há professores suficientes para suprir a demanda, mais um problema enfrentado no campo”.

Ela cita as condições de trabalho como um dos fatores para a falta de educadores nessas regiões. “Em várias ocasiões, os professores fazem outros serviços para manter a escola. Ajudam a fazer a merenda e até a limpeza. Além disso, o salário não é atrativo”, diz.

De acordo com a pesquisadora, a soma desses fatores provoca também a queda do número de alunos que frequentam as escolas. De 2003 a 2013, 16.380 crianças e adolescentes deixaram de estudar em escolas do campo, segundo o Censo Escolar. “Os jovens do campo têm perspectivas de se formar, se profissionalizar e essa primeira escola é a base de tudo. Se ela tiver problemas, a educação também será afetada. Por isso, muitos acreditam que as unidades urbanas são mais eficientes”, acredita a Rusvênia. (PN/KR)

Governo culpa falta de recursos

O presidente da Agência Goiana de Municípios (AGM), Cleudes Baré Bernardes, afirma que faltam recursos para manter as unidades de escolas rurais funcionando. “É da responsabilidade de cada prefeito manter as escolas de ensino básico e fundamental, mas a questão é que não temos dinheiro para isso. O governo federal repassa R$ 0,33 centavos para a merenda escolar por aluno ao dia, por exemplo. É impossível manter um estudante nessas condições”, reclama.

Segundo ele, a migração dessas crianças para as cidades tem sido a melhor opção enquanto os municípios lutam por uma fatia maior da arrecadação do País. “O transporte desses alunos do campo até as cidades garante o estudo delas. É utopia dizer que precisamos manter os alunos do campo no campo. Não há recursos para isso. Nós fazemos o que está ao nosso alcance e precisamos com urgência de mais empenho do governo federal com a educação”, disse.

A gerente de apoio da superintendência de ensino fundamental da Secretaria de Estado da Educação (Seduc), Ana Paula Gomes Vieira Silva, afirma que desde 2011 a administração estadual intensificou investimentos na implementação dos programas de formação de professores, além de repasses para os Conselhos Escolares destas unidades educacionais com a finalidade de melhorar a infraestrutura. “Com o programa Nossa Escola, o Estado distribuiu mais materiais pedagógicos, adquiriu mais veículos traçados para o deslocamento dos alunos e ainda abrangeu o apoio e acompanhamento às escolas do campo”. O valor aplicado até este ano não foi divulgado. (PN/KR)

Impactos na economia

Segundo a coordenadora do programa Agrinho – uma iniciativa do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar Goiás) – Maria Luíza Batista, problemas como a necessidade de deslocamento de estudantes rurais até as escolas nas cidades geram impactos na produção rural, que está cada vez mais carente de mão de obra qualificada.

“Além da grade curricular normal de ensino não contar com matérias direcionadas ao trabalho no campo, o grande problema é a sucessão familiar. As crianças não querem mais ficar no meio rural e acham que a cidade é o local onde terão mais oportunidade de emprego. O que não é verdade. Várias profissões rurais têm salários melhores do que as urbanas”, adverte.

Segundo ela, não só Goiás, mas o País andou na contramão ao incentivar a migração de alunos. “Hoje é o agronegócio que sustenta o PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro. É a produção rural que abastece as cidades. Sem mão de obra qualificada, o produtor rural perde e consequentemente a economia também”, enfatiza. (PN/KR)