Redes sociais

REDES SOCIAIS

Jornal Opção - 16 a 22 de maio de 2010

Quem ficar de fora vai ver o bonde passar

Profissionais das áreas de comunicação e tecnologia dizem que os candidatos têm de estar presentes nas redes sociais, mesmo que elas ainda não sejam determinantes para ganhar votos

SARAH MOHN

Elas chegaram sem avisar e se infiltraram como cobaias voluntárias num meio em que quase ninguém sabia para que serviam. Tímidas, ganharam aos poucos atenção de adolescentes e jovens adultos afoitos por novos tipos de entretenimento. Iniciaram-se encorpadas em estruturas tradicionais de e-mails, evoluíram para portais de bate-papo instantâneo — como o inesquecível ICQ — até se fixarem na rede com o surgimento da inovação, que por muitos anos se manteve como o principal site de relacionamento do País,o Orkut. Inspiradas pelo estrondoso e rápido sucesso orkutiano, elas se desenvolveram em ferramentas cada vez mais modernas — como Facebook, Flickr, MySpace, blogs, etc — sempre em busca do ápice de interatividade entre internautas.

Em suma, as redes sociais não são nenhuma novidade — há anos garantiram espaço na internet e na rotina dos brasileiros. Atualmente, é possível encontrar uma rede social para cada nicho da sociedade. Exemplos são a Last.fm (voltada para a música), Scoutface (escoteiros), SuperConcurseiros (candidatos a concursos públicos), Yatta! (rede no mapa em que é possível ver a localização de outros usuários), Sonico (voltada para os povos de língua portuguesa, espanhola e inglesa), Wild Social (viagens e estilo de vida) e por aí vai. Mas uma parte dessa trajetória superou as inovações dos últimos anos: o advento do microblog Twitter mudou toda a forma de se pensar a importância de estar na rede.

Desde que foi criado, em 2006, o alcance, a instantaneidade, a facilidade, a visibilidade e a interatividade surpreendentes que são proporcionados pelo portal do pássaro azul vêm pautando o debate na sociedade e despertaram um novo jeito de se comunicar, trabalhar e, especialmente, fazer política no Brasil. Não há profissional gabaritado da área de comunicação que despreze o poder das redes sociais ou deixe de atestar a relevância que foi incorporada a elas com o surgimento do Twitter.

A começar pelo inquestionável sucesso das redes no Hemisfério Norte, que no último pleito presidencial garantiu a vitória do democrata Barack Obama, a evolução da internet e a aproximação proporcionada pelas redes entre candidatos e eleitores se transformaram em atrativos cobiçados por políticos e profissionais de marketing. Mas, por aqui, o assunto é dimensionado com características de experimento. Ninguém se arrisca a trabalhar com porcentuais de votos que as redes sociais poderão garantir na disputa eleitoral deste ano, tanto local quanto nacionalmente.

“É uma aposta de risco. Mas também é uma aposta fazer campanha no modelo tradicional se depois o candidato perceber que toda uma rede de pessoas está falando do seu nome de forma negativa, e ele não tem como se defender. E outra: ele não tem como interagir no novo modelo. O candidato pode se dar conta de que está aparecendo na televisão, mas que ninguém o está vendo; ou aparecendo no jornal, mas ninguém o está lendo; ou falando no rádio, mas ninguém o está ouvindo”, alerta Mário Rodrigues, diretor do Instituto Grupom de Consultoria e Pesquisas.

Mesmo que a eficácia delas ainda esteja questionada, as redes sociais, especialmente o Twitter, tendem a se tornar cada vez mais importantes na vida política e eleitoral, a partir deste pleito. Segundo profissionais de comunicação procurados pela reportagem, neste ano as redes serão importantes para a realização do debate político, mas não devem interferir de forma importante no voto. Em contrapartida, o político que descartá-las ou menosprezá-las durante a campanha tende a colher o ônus de prejudicar a própria imagem pública fora das redes.

“Não acredito que determinarão nenhuma eleição. Não têm essas redes ainda a profundidade e a capilaridade social necessária para isso. Mas, nortearão grande parte do debate político, que usualmente é feito nas camadas médias e altas da sociedade — que o pessoal ainda insiste em chamar de formadores de opinião”, analisa Luiz Signates, professor da UFG com pós-doutorado na área de comunicação e política e presidente do Instituto Signates de Consultoria e Pesquisa Política.

A mesma avaliação é feita por Rodolfo Stein, consultor de empresas na área de Tecnologia da Informação e proprietário da Solucion Web. Na análise dele, a internet não terá poder decisório nas urnas em 2010, mas a utilização adequada delas só tende a incrementar pontos favoráveis à viabilidade eleitoral dos candidatos. “Ele (candidato) tem que ter participação, interagir, trocar opiniões, ideias e informações com o eleitorado dele. É como uma relação entre empresa e cliente. O candidato que não tiver presença organizada e não souber utilizar a linguagem adequada a cada ferramenta da internet vai ficar para trás. Tudo isso vai compor os quadros favoráveis à campanha política”, sintetiza.

É unânime entre profissionais da área, que cada vez mais têm se especializado em estudar a interação das novas ferramentas, a constatação de que as redes sociais serão fundamentais no processo eleitoral para mensurar a qualidade de respostas da população. “As pessoas estão realmente ligadas à rede e observando o que é de interesse delas. Nós queremos interagir e hoje temos a arma que possibilita isso, que são as redes sociais”, sintetiza Renato Serra, publicitário e consultor em marketing de relacionamento; gestão em redes sociais e estratégia em web mídias para campanhas eleitorais.

“O que acontece é que os políticos estarão na rede de qualquer jeito. Na verdade, já estão. Querendo ou não, tendo perfil em Twitter ou em qualquer rede social, ele será achado em jornais na internet, na própria mídia, e estará tendo seu nome comentado. O que vai fazer diferença é ele conseguir se relacionar com as pessoas que falarão sobre ele ou tentarão falar diretamente com ele”, explica André de Moraes, gestor de webmarketing e comunicação digital. André ressalta que alguns políticos se esquecem que não estão presentes apenas em redes sociais, mas nos mais diversos portais de busca da internet, como o Google.

Assessoramento

Ao candidato que decidir investir em redes sociais, seja focado na busca direta por votos ou na inserção qualitativa da própria imagem nas ferramentas da internet, é fundamental a procura de profissionais qualificados para o manuseio das estratégias de campanha virtual. Do contrário, afirmam especialistas, são altas as chances de o político cometer deslizes banais e, como diria o bom e direto linguajar popular, meter os pés pelas mãos.

“O candidato que está na rede tem que montar um senhor assessoramento para isso. Ele tem, por exemplo, que desfazer em tempo real aspectos negativos que coloquem na imagem dele e ao mesmo tempo maximizar aspectos positivos. Isso é garantido de forma adequada por profissionais”, garante o diretor do Instituto Grupom. Mário Rodrigues explica que é essencial ao candidato não confundir a importância da interação e do diálogo direto com eleitores com a necessidade de acompanhamento estratégico por parte de assessores. “Ele tem que entender que precisa interagir, dialogar e se justificar, porque o lado positivo disso é poder mostrar o trabalho, as pretensões, o que se está fazendo agora e o que se pretende fazer daqui a pouco. Mas não se pode fugir das discussões. Nas redes sociais não há espaço para isso.”

O consultor de T.I. Rodolfo Stein sugere um exemplo interessante de desgaste na rede. “Vamos supor que o (apresentador) Luciano Huck, hoje o usurário do Twitter que possui mais seguidores no Brasil, escreva uma mensagem dizendo que acha que o (pré-candidato à Presidência da República pelo PSDB) José Serra está envolvido em algum desfalque ou maracutaia. Huck tem um poder de comunicação tão grande e consegue atingir um número tão alto de pessoas que pode facilmente prejudicar a imagem do (pré) candidato. Isso vai virar um turbilhão de informações trocadas e o candidato precisará saber se está sendo bem avaliado. Ele pode ser um excelente candidato, mas estar com a imagem péssima perante a população. E ele só vai saber disso através da própria rede”, salienta.

Fato é que a assessoria do político tem que ser bem preparada e bem feita. Assim como alguém popular pode dizer algo via Twitter e conseguir repercutir em ampla escala determinado comentário, um cidadão qualquer pode montar um perfil falso e, apesar de desconhecido nacionalmente, pode também conseguir prejudicar a imagem de outra pessoa. “Se o candidato reage a uma informação automaticamente sem seguir uma análise feita por trás disso, análise de tendência e de representatividade, o candidato pode entrar numa guerra desnecessária e aí a coisa pode ganhar a repercussão que não teria”, considera Rodolfo Stein. “E com fake não se briga, não se discute e não se retuita”, ensina Mário do Instituto Grupom.

Os jovens vão influenciar o voto dos pais

Se nos basearmos na estimativa feita por profissionais de marketing, chegaremos a setembro deste ano, um mês antes do pleito eleitoral, com 1,8 milhão de pessoas acessando internet em Goiás, seja via lan house, trabalho ou residência. Esse contingente, avaliam gestores de redes, será composto prioritariamente por eleitores de faixa etária jovem. “Teremos um intervalo que representará praticamente a metade da população em idade eleitoral acessando a internet. Não é a totalidade dos eleitores, mas é uma parcela significativa”, diz Mário Rodrigues, do Grupom.

Mário avalia que a maioria das pessoas que hoje acessam a internet possui níveis de cultura e educação mais elevados do que a parcela que não está inserida nas redes. Justamente com base nessa gama de informações acessada preferencialmente por jovens é que o diretor do Grupom acredita que adolescentes e jovens adultos acabarão colhendo mais dados sobre candidatos e influenciarão a escolha de voto do restante da família. “Podem perguntar: mas e os jovens da periferia? Não podemos ignorar que os jovens da periferia vão a lan houses, têm Orkut, MSN, e-mail etc. Não é a ferramenta que vai fazer a rede, mas o conjunto de ações que vão se somar às ferramentas”, afirma.

Já o publicitário Célio Rezende, da Agência Prisma Comunicação, diz ter dúvidas quanto ao aproveitamento das redes sociais para a campanha no Brasil. Na opinião dele, a sociedade brasileira não está preparada para aderir às propostas da campanha virtual. “Redes sociais foram feitas para quem sabe ler e escrever, não para o povão. Funcionam mais para facilitar trabalho de jornalistas do que como instrumento de massa”, acredita. O publicitário avalia que a utilização das ferramentas tende a cair nas graças dos políticos “porque se trata de modismo”. “Tenho experiência concreta dessa utilização na última campanha da OAB. Tivemos uma decepção muito grande, pois usaram IPs falsos, fakes no Twitter e fizeram de tudo para desconstruir a imagem do nosso candidato”, diz.

O proprietário da Stylus Propaganda, Hamilton Carneiro, acredita que as redes serão um instrumento a mais que virá para somar, mas que não ocuparão o espaço dos veículos tradicionais, como televisão e rádio. “Há uma ilusão muito grande quanto à internet garantir votos. O público potencial, a população em geral, ainda está à margem das redes sociais. Mas acho que todo candidato tem que aderir, pois além de ampliar o alcance, elas são uma forma de modernização. O contato com o eleitor passa a ser mais efetivo, mais direto. Mas é preciso ser feito um trabalho da forma mais interessante possível, com linguagem nova, dinâmica, breve e com atrativos, que chamem à atenção dos eleitores”, pondera.

Estratégia de campanha

Assessor na área de Tecnologia da Informação do pré-candidato tucano Marconi Perillo, Adauto Barbosa Júnior considera que as redes não serão determinantes para eleição de ninguém, mas se comportarão como fator indispensável para qualquer campanha que pretenda ser vitoriosa. “À medida que vai se aproximando o período eleitoral, há uma tendência natural de as pessoas ficarem mais conscientes e buscarem informação quanto aos candidatos. As redes sociais vão facilitar essa busca e vão promover a interação que se busca. Elas vão poder garantir votos nesse sentido. Principalmente o voto do navegante, que é naturalmente uma pessoa ávida por informação.”

Ponderação relevante feita por profissionais confirma o que pode soar como dúvida frequente na mente de candidatos que utilizam a rede: a campanha feita virtualmente não pode utilizar as mesmas estratégias que a campanha realizada nos meios tradicionais de mídia, como rádio e televisão. “É notório e há números significativos que mostram que as pessoas estão utilizando as redes sociais para trocar opiniões. Em outras palavras, elas não querem lidar com mensagens do tipo ‘vote em mim’”, explica Rodolfo Stein. Caberá, portanto, ao político encontrar a melhor fórmula para influenciar os eleitores por meio do comportamento nas redes.

“Por exemplo, vamos supor que saiu um escândalo envolvendo determinado político. A maneira com que ele mostrará se aquilo é ou não verdade será monitorada por pessoas que ainda não sabem se votam ou não nele. Esse ”, diz Rodolfo.

Mário Rodrigues alerta, todavia, para os modelos de campanha que pretendam ser utilizados por candidatos. “O efeito Obama desencadeou a eleição dele, mas não foi só isso que aconteceu. Ele utilizou as redes favoravelmente a ele. Ele montou uma senhora rede e isso tem que ser levado em conta.” Na avaliação de Rodolfo Stein a conjuntura sociopolítica nos Estados Unidos não pode ser comparada com a do Brasil no momento de elaboração das estratégias de campanha virtual.

“Obama conseguiu uma rede extensa de voluntários, conseguiu fundos para a campanha via essa rede, montou toda uma estrutura para dar suporte a esse modelo de trabalho e com isso conseguiu virar o jogo em relação ao poder de penetração na massa. No Brasil, nós não temos essa cultura. Não creio que a gente vá conseguir através da internet grande volume de recursos de doações para campanhas, não é da cultura do brasileiro fazer isso. Nós não podemos querer simplesmente repetir o efeito Obama, porque se fizermos no Brasil tudo o que Obama fez nos Estados Unidos estaremos jogando dinheiro fora”, avisa Stein.