Cotas ainda têm baixa adesão de estudantes da escola pública

 

Número de inscritos ao vestibular da UFG oriundos da rede pública aumenta a cada ano, mas está longe do ideal. para pró-reitora, alunos desconhecem as propostas de inclusão

 

Patrícia Drummond

 

A cada vestibular, desde que foi aprovado, em agosto de 2008, o Programa UFG Inclui, da Universidade Federal de Goiás (UFG) - que estabeleceu o sistema de cotas na instituição, a partir do processo seletivo 2009-1 - vem aumentando o número de candidatos inscritos. Mas ainda está longe do ideal, segundo avalia a pró-reitora de Graduação da universidade, Sandramara Matias Chaves. Segundo ela, ainda é minoria o número de estudantes oriundos da escola pública - aos quais as cotas são direcionadas - que ao menos se inscrevem para tentar o vestibular da UFG.

"As ações afirmativas propostas pelo UFG Inclui têm o objetivo de estimular a participação de estudantes de escolas públicas no nosso processo seletivo. Entretanto, consideramos que, em relação ao número de concluintes do ensino médio, na rede pública, o porcentual daqueles que se inscrevem no vestibular da universidade ainda é pequeno", destaca Sandramara.

A pró-reitora cita, por exemplo, que dos cerca de 54 mil concluintes do ensino médio em escolas públicas, em 2009, pouco mais de 8 mil, apenas, se inscreveram para o vestibular 2009-1 da UFG. "Esses números fizeram com que a UFG decidisse intensificar a divulgação de suas propostas de inclusão, o que fizemos neste ano", acrescenta, lembrando os projetos UFG vai à Escola, Conhecendo a UFG e Espaço das Profissões, em que o Programa UFG Inclui é apresentado a alunos e professores da rede pública.

Sandramara Chaves diz acreditar que boa parte dos estudantes da rede pública de ensino, em Goiás ainda desconheça as propostas de inclusão da UFG. Talvez por isso, pondera, eles não se sintam estimulados a tentar uma vaga na universidade. "Por que esses alunos optam pelo vestibular das particulares e não vão direto procurar o vestibular da instituição pública? Nossa intenção é proporcionar condições para que essa realidade se transforme", argumenta a pró-reitora de Graduação.

No vestibular 2009-1, de um total de 31.493 inscritos, 7.963 optaram pelo sistema de cotas oferecido pela UFG - são 20% das vagas reservadas a estudantes de escola pública e 20% a negros de escola pública. Um ano depois, o vestibular 2010-1 teve 30.579 candidatos, dos quais 8.509 se inscreveram pelo UFG Inclui. Para 2011-1 - cujas provas da primeira fase serão realizadas no próximo dia 21 -, 9.446 candidatos farão o exame por meio das cotas no maior vestibular da instituição, com 34.739 inscritos.

Aluna do 3º ano do ensino médio no Colégio Estadual Senador Teotônio Vilela, no Conjunto Vera Cruz 1, Rosyanamar Régis Pereira, de 17 anos, não se inscreveu para fazer o vestibular da UFG. Ela fez, sim, há uma semana, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para tentar uma bolsa pelo Programa Universidade Para Todos (ProUni), do governo federal, caso consiga entrar em uma faculdade particular.

"Não me sinto preparada psicologicamente nem em termos de conteúdo para enfrentar a concorrência na Federal, mesmo sabendo que existe esse sistema de cotas", alega a estudante. "Pelo menos por enquanto me sinto insegura. Talvez eu tente a UFG no meio do ano; agora, vou tentar, mesmo, uma particular", completa, apontando a frequente substituição de professores, o atraso no conteúdo das disciplinas e a "falta de interesse" geral com a escola pública como os motivos de sua insegurança.

Rosyanamar conta que estudou bastante para as provas do Enem 2010, realizadas no último dia 6, mas, com as recentes falhas no exame - somadas às ocorridas no ano passado, com o Enem 2009 -, afirma estar "meio desanimada". "Embora tenha me saído até bem, com tudo o que aconteceu estou em dúvida; não tenho mais certeza se estarei, realmente, em uma faculdade no ano que vem", lamenta a secundarista, que sonha em fazer Psicologia, Terapia Ocupacional ou Musicoterapia.

Para os governantes, professores, direção e colegas da escola pública, ela deixa um recado: "Existem muitos problemas de infraestrutura, fazem greve por melhores salários e acho que tudo isso é importante. Mas falta buscar um novo significado para o ensino público, para que nós, alunos, possamos acreditar no nosso potencial."

Desigualdade se reflete no ensino superior

"Não tenho a mínima chance no vestibular da UFG; por isso, nem fiz inscrição", declara Morgana de Carvalho Souza, de 17 anos, aluna de escola pública que também tem no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) a esperança de ingressar no curso superior em uma faculdade particular, por meio de bolsa. Desestimulada por causa dos últimos acontecimentos envolvendo o exame, ela já pensa em adiar para 2012 o projeto de se tornar universitária. "Até lá, dá tempo de fazer cursinho", alega.

Para o professor João Ferreira, da Faculdade de Educação da UFG, que mantém estudos na área de políticas públicas educacionais, nem o sistema de cotas nem o Enem ainda são capazes de promover uma inclusão mais ampla no ensino superior, "na dimensão da diferença social" existente, historicamente, no Brasil. "O sistema de acesso à universidade é muito elitizado socialmente. A desigualdade é de origem econômica, social e cultural e se reflete no ensino superior", diz ele.

Na opinião do especialista, uma real inclusão do estudante oriundo da escola pública à universidade pública só ocorreria se o patamar da reserva de vagas fosse estabelecido na mesma proporção do que ocorre no Ensino Médio: "Hoje, 85% dos jovens brasileiros de 15 a 17 anos estão matriculados na rede pública e só 15% na rede privada. O ideal seria manter, nos sistemas de cotas, essa mesma proporção, o que acabaria gerando uma grande e polêmica discussão", reconhece.

José Ferreira acredita que, se ainda é pequena a procura dos alunos da rede pública pelos programas de inclusão universidades públicas, é porque os porcentuais destinados a essas vagas não estão interferindo tanto na realidade daqueles estudantes. "Tentar uma bolsa em uma faculdade particular acaba sendo uma chance mais real", argumenta, lembrando que a questão passa, também, pela construção de um ensino público - em nível fundamental e médio - com padrão de qualidade, além da expansão - com maior oferta de vagas - do ensino público superior. [ASS. RODAPE]

Quase 50% dos inscritos optaram pelo Enem

Dos mais de 34 mil candidatos que farão o vestibular 2011-1 da Universidade Federal, quase 50% optaram, no ato da inscrição, pelo aproveitamento da nota do Enem 2010 para a composição da média final no processo seletivo. São cerca de 18,7 mil inscritos interessados na prova de Conhecimentos Gerais do Ministério da Educação como tentativa de somar pontos no vestibular da UFG.

A esses candidatos, a pró-reitora de Graduação Sandramara Matias Chaves informa que não haverá prejuízo algum, em função do problema com os cartões de respostas e parte dos cadernos de perguntas. De acordo com ela, como a nota do Enem só é computada na média final, caso ocorram imprevistos "a nota do Enem simplesmente não será utilizada".

Sandramara explica que, conforme o edital da UFG, a composição de nota, no vestibular, para classificação dos candidatos, terá por base a soma dos pontos obtidos na primeira etapa, mais a nota do Enem (adequada ao mesmo padrão de pontos da primeira etapa), na escala de 0 a 90, exceto a prova de Redação, mais os pontos obtidos na segunda etapa. Mesmo assim, a nota do Enem só será utilizada caso seja maior do que a pontuação obtida nas provas da primeira etapa; será aproveitado, portanto, o melhor desempenho do candidato.

Apesar das falhas na aplicação do Enem, por duas vezes consecutivas, ela defende a iniciativa do governo federal. "Trata-se de um processo que está sendo construído gradativamente, com base em uma metodologia que apresenta amplo respaldo na literatura internacional", pondera, referindo à Teoria de Resposta ao Item (TRI). A Organização das Nações Unidas (ONU) no Brasil divulgou nota oficial a respeito, declarando que a TRI garante a isonomia das provas do Enem, ainda que aplicadas em períodos diferentes. A TRI se baseia em modelos matemáticos que permitem a elaboração de provas com o mesmo grau de dificuldade.

Candidatos desconfiam do exame

Petrolina- A desconfiança acerca da segurança envolvida na aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) está levando estudantes da região do Vale do Rio São Francisco, na divisa entre Bahia, Pernambuco e Sergipe, a pressionar a reitoria da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) a adotar outra forma de seleção. Desde o ano passado, o Enem é a única forma de ingresso da instituição.

"Da forma como é feito, o Enem acaba nos prejudicando", reclama a estudante Priscila Ulysses Medeiros, de 18 anos, de Petrolina. "Foi o segundo ano consecutivo com problemas. Não dá para confiar em um exame assim para definir a entrada na universidade. É horrível pensar em ter de fazer tudo de novo, até as coisas darem certo."

Na quarta-feira, estudantes do município, carregando cartazes, chegaram a promover uma passeata pelo centro de Petrolina, para tentar pressionar a Univasf. Um grupo foi recebido pelo prefeito, Júlio Lóssio (PMDB), que afirmou que marcaria uma reunião com o reitor da universidade, José Weber, para discutir a questão.

Uma nova manifestação de estudantes está programada para dezembro, quando a Univasf deve lançar seu calendário acadêmico 2011. "Queremos fazer uma mobilização que conte com o apoio das prefeituras do vale", diz a diretora do Curso Tema, de Petrolina, Vera Lúcia Medeiros.

Segundo o pró-reitor de ensino da Univasf, Marcelo Ribeiro, a instituição defende o uso do Enem como processo seletivo por ele, em tese, promover mais "democracia" no acesso à universidade. Porém, ele admite que a aplicação das provas deveria receber mais atenção, para evitar problemas.(AE)

UFF diz que vai manter o sistema

Rio- A Universidade Federal Fluminense (UFF) anunciou que vai manter 20% das vagas nos cursos de graduação reservadas para candidatos que fizeram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), apesar das disputas judiciais que põem em dúvida a validade da prova. A primeira etapa do vestibular da UFF, realizada ontem em quatro Estados e no Distrito Federal, teve abstenção de 8%, inferior à verificada no ano passado.

"Da maneira como as coisas estão colocadas atualmente na Justiça, não deixaremos de utilizar o Enem", disse o pró-reitor de assuntos acadêmicos da UFF, Sidney Mello, ao manifestar apoio ao Enem. "Nos comprometemos com 20% e acreditamos em um sistema federal que tem o Enem como um mecanismo de ingresso democrático à universidade. Somos incentivadores e continuaremos usando o exame", acrescentou.

Sisu

Através do vestibular, serão selecionados 6.273 candidatos. As outras 1.541 vagas serão preenchidas por meio do Sistema de Seleção Unificado (Sisu) do Ministério da Educação (MEC), que utiliza o Enem. Segundo Mello, se mantida a decisão judicial que considera válido o exame, as aulas devem começar em março.

Perguntado sobre como a universidade agirá em caso de anulação, ele afirmou que, nesse caso, as decisões serão tomadas pelo MEC. Atualmente são os candidatos a uma vaga na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que fazem as provas do vestibular. No processo seletivo deste ano, 60% das vagas serão preenchidas por meio do Sisu, das quais 20% pelo sistema de cotas.(AE)