Goiânia é 10ª mais desigual no mundo

Goiânia é 10ª mais desigual no mundo

Relatório da onu revela que a capital é a pior em desigualdade social em todo o País

Adriano Marquez Leite

20/03

Relatório divulgado ontem pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) revelou que, mais uma vez, Goiânia é a cidade brasileira mais desigual do País e, pior: desta vez figura como a décima com distribuição de renda menos igual do mundo. Em 2008, no dia do aniversário do município, levantamento semelhante da instituição mostrava que a capital era a mais desigual de toda a América Latina.

No total, 138 cidades de 63 países em desenvolvimento foram analisadas. O triste ranking que destaca o município como uma cidade que concentra poucas pessoas ricas e muitas pessoas pobres gera polêmica. O prefeito Iris Rezende, que em 2008 foi surpreendido com a notícia, discordou mais uma vez da metodologia e resultado finais divulgados pela ONU (veja reportagem nesta página). Contudo, especialistas apontam condições históricas que podem ter deixado Goiânia nessa situação, no mínimo, constrangedora.

Além da capital de Goiás, outras três cidades brasileiras aparecem com altos níveis de desigualdade. São elas: Fortaleza, Belo Horizonte e Brasília, antecedidas por cidades localizadas em grande parte no continente africano, que apresentam desigualdade econômica entre seus habitantes ainda pior. Na metodologia utilizada, a desigualdade social é medida por um índice que varia entre 0 e 1 - sendo 1, o ápice da desigualdade. Todas as cidades brasileiras apresentam esse número superior a 0,6, que é considerado extremamente alto.

É importante ressaltar que o documento, que será divulgado na íntegra apenas na próxima semana, não trata sobre questões relativas à pobreza, mas à desigualdade. Por exemplo, um município cuja população esteja toda abaixo da linha da pobreza certamente terá condições de moradia piores que as de Goiânia, que ainda continuará mais desigual.

Alguns economistas e especialistas na área de estudos sociais ouvidos pelo POPULAR discordam dos resultados da organização, mas, como o acesso aos dados ainda não foi liberado, afirmaram apenas que pesquisas realizadas há menos tempo pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) colocavam Goiânia na décima posição entre as capitais mais desiguais do Brasil.

Contudo, todos admitem que a metodologia aplicada - Coeficiente de Gini (veja quadro) - é mais utilizada em todo o mundo. “É preciso saber quais foram os dados utilizados para o cálculo, se é por amostragem e há quanto tempo foram colhidos. Todos esses fatores podem afetar no resultado final da pesquisa, disse um especialista.

Análise

O custo de ser referência

Adriano Marquez Leite

Mesmo sem os dados do relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), para a realizar uma análise mais detalhada, o professor do Instituto de Estudos Socioambientais (Iesa), da Universidade Federal de Goiás (UFG), João Batista de Deus, arrisca uma avaliação da conjuntura que pode ter deixado Goiânia em situação tão desastrosa.

De acordo com João, desde que era planejada, Goiânia já seria criada dentro de um programa de ocupação do interior do Brasil, como uma ponta de lança para a interiorização de áreas remotas do País, como Centro e Norte. Por causa disso, acaba virando referência e mantém liderança em toda a Região Centro-Norte, o que acaba atraindo um fluxo muito grande tanto de empresas e agropecuaristas de grande porte, como de migrantes.

O resultado, ainda segundo o professor do Iesa, é que uma pequena parcela da população que aqui vive ganha bons salários, enquanto outra parcela, sem qualificação profissional, tenha baixo poder aquisitivo. Em regiões como a de São Paulo, mesmo as populações mais carentes recebem salários melhores que os radicados em Goiás.

Para mudar esta situação, João de Deus aposta na melhoria da educação. “Como os adultos pobres que moram em Goiás, em geral, têm pouca qualificação profissional, é preciso, além das ações de governo que já visam reduzir essas discrepâncias, investir nas escolas. Temos de ter como meta salvar a geração seguinte e a educação é fundamental”, explica o professor.

Na avaliação do coordenador do relatório e diretor do Centro de Estudos e Monitoramentos das Cidades do ONU-Habitat, Eduardo Lopez Moreno, existe vínculo direto entre desigualdade e criminalidade. Mais do que custos sociais, o abismo entre ricos e pobres também provoca prejuízos econômicos. “É muito possível que a cidade mais desigual gere muito mais facilmente distúrbios e problemas sociais. As autoridades desses países vão deslocar recursos que deveriam ir para investimentos para conter esses movimentos sociais. O custo social acaba se traduzindo em custo econômico”, afirmou Moreno.