Entrevista com o reitor Edward Madureira Brasil

Edward Madureira Brasil
Alessandro Copetti

Aliado ao seu segundo mandato como reitor da Universidade Federal de Goiás (UFG), o professor Edward Madureira Brasil também passa a presidir a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes). Com a missão de comandar a instituição de 2010 a 2011, o educador destaca que entre as bandeiras de sua gestão está o fortalecimento da autonomia das universidades federais, entre elas a financeira, e a busca por soluções que versam sobre a reestruturação dos Hospitais Universitários (HUs).
“Essas são duas grandes bandeiras nossas; as maiores vamos dizer assim. Mas paralelamente existem outras”, frisa o reitor.
Também ficará a cargo da atual gestão mediar a transição que irá ocorrer em função da eleição do novo presidente da República.
Para Edward, trata-se de um outro grande desafio, em que a intenção é continuar com o diálogo a respeito do processo de fortalecimento das UFs. “O objetivo é fazer a transição de maneira tranquila porque nós estamos no meio de uma expansão e temos que cuidar para que isso não seja prejudicado de forma nenhuma”, destaca o gestor, eleito no dia 16 de junho, para presidir a principal interlocutora do sistema das universidades federais
junto ao governo federal e demais instâncias.
Fale um pouco sobre a força representativa da Andifes?
A maior parte das conquistas do sistema se deve à existência da Andifes. Por exemplo, toda essa expansão que a gente vivencia nas universidades federais, em que nós saímos de 500 mil estudantes e vamos chegar a um milhão, teve origem em um documento protocolado em 2003 pelos reitores propondo essa expansão. Aí veio a primeira parte dessa expansão, que foi a forte interiorização do sistema, que aconteceu em 2005 e 2006. E o Reuni, outro grande projeto que veio em 2007 e 2008.

Quais os temas que o senhor pretende dar maior destaque à frente da instituição?
O avanço nas questões de autonomia orçamentária e financeira das universidades e também na gestão de pessoal técnico-administrativo.

No último mês, dois decretos que versam sobre esses temas foram assinados pelo presidente Lula durante reunião com a Andifes. Especificamente na questão dos técnicos administrativos, que avanço isso traz?
Significa que, a partir desse decreto, a reposição dos nossos técnicos administrativos passa a ser feita sem a necessidade de uma autorização especial do Ministério do Planejamento. Então se perdemos um funcionário em um dia, no outro poderemos abrir concurso. Isso já existe com relação aos professores desde 2007 e foi uma conquista recente da Andifes.

E além da questão da autonomia?
Outra bandeira é relativa aos hospitais universitários. Os Hus são uma grande alternativa para a saúde no País, mas eles se constituem num grande problema hoje devido ao nível de endividamento, a falta de reposição de pessoal e uma série de outras questões que dificultam. Em janeiro desse ano, o presidente assinou um decreto que divide o financiamento dos hospitais. Em 2012 eles terão um orçamento global onde a saúde vai entrar com a metade e a Educação com a outra parte. Isso deverá solucionar o problema dos hospitais universitários. Essas são hoje nossas duas grandes batalhas; as maiores vamos dizer assim. Mas paralelamente existem outras.

Quais, por exemplo?
A expansão das universidades federais trouxe um quantitativo de professores para o sistema muito grande. E as pessoas que estão entrando no sistema têm uma qualificação muito elevada... Praticamente o sistema contrata em sua grande maioria doutores. E com a interiorização, nós entramos na questão da dificuldade de fixação desses profissionais em determinados locais. Nós temos uma proposta de um Programa de Apoio a Pós-Graduação (PAPG) no sistema que é justamente para consolidar a pós-graduação e a pesquisa em todos os locais onde temos campus. Isso fixa o professor-doutor no local com reflexo imediato no desenvolvimento regional porque abre a oportunidade para a implementação de projetos de pesquisa e muitas coisas começam a acontecer a partir disso. Lógico que não dá para fazer tudo de uma só vez e o governo ainda não teve condições de financiar esse passo. Mas a meta nossa é criar um espaço junto a esse governo, que talvez seja um pouco difícil por estar no fim, mas vai ser pautado para o próximo.

Há algum temor de que essa mudança de governo possa atrapalhar a continuidade desses e outros projetos já existentes e que estão dando certo?
É difícil saber. São propostas de trabalho que ainda não se tem clareza. Mas há uma constatação que é importante: a população brasileira entendeu que ter uma universidade federal é bom. O presidente Lula mesmo fala que, quando anda pelo Brasil, o que as pessoas mais pedem para ele é um campus de uma universidade federal. Então eu acho que qualquer que seja o nosso próximo governante vai ter que dar uma satisfação para a nossa sociedade em relação a isso. Eu acho que o grande desafio dessa gestão da Andifes, além dos que eu já coloquei, é cuidar dessa transição. Nós estamos terminando um governo e vamos estabelecer diálogo com um novo. Então o objetivo é fazer a transição de forma tranquila porque estamos no meio de uma expansão e temos que cuidar para que não seja prejudicada de forma nenhuma. Por isso estamos tomando o cuidado de estabelecer o diálogo breve com os candidatos, conversando e apresentando propostas. Já conversamos com a Marina Silva e queremos conversar com a ex-ministra Dilma Roussef e com José Serra, que são apontados à frente nas pesquisas. Mas não deixaremos de conversar com os outros.  

Outro item que é bastante solicitado das UFs já há algum tempo é uma aproximação com o Ensino Médio. Como isso pode se efetivar?
Eu acho que isso já está acontecendo. O próprio Ministério da Educação tem incentivado essa aproximação. Talvez aqui tenhamos uma situação privilegiada porque temos a frente da Secretaria Estadual de Educação uma ex-reitora. É lógico que tem uma inércia de afastamento de muito tempo e esse caminho precisa ser pavimentado com capacitação, formação e projetos de pesquisa que identifiquem os problemas.

Qual o papel da universidade nessa questão?
Acredito que a universidade pode dar uma grande contribuição na formulação de políticas públicas que tenham um efeito sobre o Ensino Médio e demais níveis. E temos feito muita coisa, mas devemos fazer mais. E há esse entendimento hoje nas universidades federais. E os avanços dependem muito dos gestores que estão em cada lugar. Agora, eu acredito que uma das coisas importantes para a Educação Básica é ter planos de carreira, ter perspectivas para os docentes do Ensino Básico porque o efeito é sentido no nosso vestibular. Temos vagas ociosas nas licenciaturas porque elas não atraem muitos estudantes e isso é preocupante porque quem vai formar os nossos filhos?

Com relação ao sistema de cotas, também existe um entendimento por parte das federais de que ele é necessário?
Eu posso dizer, e essa é uma opinião da maioria dos reitores da Andifes, que o estabelecimento de um único número percentual para o Brasil como um todo não reflete a realidade. Na UFG, depois de um ano de muita discussão, nós entendemos que ela é efetiva e a adotamos. Outras universidades acham que não, que tem de ser só cota social. Mas eu acho que definir nacionalmente um único parâmetro não é a melhor solução porque as regiões do Brasil são bastante distintas. Então acredito que cada universidade deve achar seu potencial, a sua forma. Eu entendo que a ação afirmativa é importante e ela tem um alcance limitado, mas a grande revolução vai acontecer no dia em que a escola básica alcançar um nível adequado em que não seja preciso adotar cotas.

Um mandato de um ano na Andifes não é um período muito curto para tantas demandas?
Na verdade, a pauta da Andifes é permanente. Quem entra já leva a pauta sem nenhum sobressalto. Tem que dar atenção para uma coisa ou outra que é mais emergencial, mas a direção já está definida.