Falta espaço para os livros

Falta espaço para os livros

A matéria de capa da semana passada destacou o estado de abandono das bibliotecas públicas de Goiás. Essa realidade é vista com indignação e revolta por parte dos biblioteconomistas. Eles reclamam que há pouco espaço de atuação no mercado, mesmo nos espaços onde são necessários, e o estado físico e de acervo das bibliotecas goianas tornam a profissão ainda mais distante do que é ensinado nas universidades.
Professora na Universidade Federal de Goiás (UFG), Eliany Alvarenga de Araújo convive diariamente com essa realidade. Segundo ela, as bibliotecas públicas localizadas em Goiânia, por exemplo, estão carentes e sofrem com a falta de investimentos. O que acontece porque os agente políticos, normalmente, não dão a elas a devida importância. “Nós não temos políticas específicas para essas bibliotecas”, enfatiza.  
Por telefone, ela contou à jornalista Raphaela Ferro, do caderno Escola, um pouco sobre a realidade das bibliotecas não só públicas, mas também escolares. Muitas delas, inclusive, vivem atualmente um conflito de personalidade, sendo chamadas de salas de leitura. “Temos uma lei federal que garante, exige a presença da biblioteca escolar, mas essa legislação não é cumprida”, critica a professora.

 

Como é o estado das bibliotecas públicas do Estado hoje?
A situação é de carência absoluta, porque nós não temos políticas específicas para essas bibliotecas. Existe um grande desconhecimento da importância da biblioteca. Por exemplo, na biblioteca pública municipal de Goiânia, na Praça Universitária, o prédio sofre com rachaduras e infiltrações e nenhuma providência é tomada.
O acervo, livros e outros materiais, está desatualizado. Outro grande problema é a ausência do profissional competente para trabalhar na biblioteca, que é o bibliotecário. Esse cargo não existe no Estado nem na prefeitura.
Nas bibliotecas escolares, o cargo também inexiste. Trata-se de uma grande luta. Falta consciência dos gestores públicos para colocarem esta como uma questão importante.

As bibliotecas escolares também estão em situação ruim?
Nós tivemos um programa anterior, o Leia Goiânia [entre 2001 e 2004], que criou quase 150 bibliotecas escolares nas escolas públicas municipais de Goiânia. Com a nova gestão, essas bibliotecas foram transformadas em salas de leitura.
Para mim, sala de leitura é a antessala de odontólogo, de médico. Biblioteca é uma instituição que envolve informação, que tem diferentes formatos, acervo diferenciado e que tem um profissional preparado para trabalhar com isso.  
Então, o drama da biblioteca escolar é tão grande ou pior do que o da biblioteca pública. Afinal, trata-se de pessoas que estão em um processo de ensino aprendizagem, numa faixa etária em que tudo pode ser feito, tudo pode ser ensinado.
A biblioteca escolar é fundamental. Temos uma lei federal que garante, que exige a presença da biblioteca escolar, mas ela não é cumprida.  
O Conselho Estadual de Educação (CEE) também tem uma resolução equilibrada da importância, da obrigatoriedade da biblioteca escolar. Isso não é cumprido.
Por isso, essa é outra grande luta nossa. A luta para que os estudantes possam ter, além do discurso do professor e dos diversos autores, a oportunidade de criar com autonomia intelectual o seu próprio discurso.
E o que permite isso é a biblioteca com os vários autores que estão em seu acervo. O nosso sonho é de que um dia o Brasil seja a sexta economia não só por questões financeiras, mas porque seu povo é informado, educado e tem autonomia intelectual.

É difícil chegar a esse estado com as bibliotecas que temos hoje?
Sim. No prédio da Praça Universitária há, inclusive, rachaduras na parede. A biblioteca do Centro Cultural Marieta Telles [Pio Vargas] sofre com falta de espaço físico. Temos ainda um outro caso muito famoso: a biblioteca do Centro Cultural Oscar Niemeyer, que não é aberta. Uma grande biblioteca está prevista ali, provavelmente será a maior da cidade, e nada é feito, nada é encaminhado.  
Nós sabemos de recursos que são destinados, mas isso não é utilizado de maneira correta. Então, onde está a biblioteca do Centro Cultural Oscar Niemeyer? A população tem direito a esse recurso de povo civilizado, nação de primeiro mundo. As melhores bibliotecas desse planeta, coincidentemente, estão nas maiores economias do mundo.  

E por que existe essa correlação?
Porque realmente um povo civilizado é capaz de construir uma economia forte e constantemente criativa. Somos ricos financeiramente cada vez mais. Que bom, desde que sejamos ricos também em termos de informação e de Educação.

Quem é o que fez?

Eliany Alvarenga de Araújo é doutora em Ciência da Informação pela Universidade de Brasília (UnB) e mestre em Biblioteconomia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Autora do livro A Palavra e o Silêncio: a Biblioteca Pública e o Estado Autoritário no Brasil, Eliany graduou-se em Biblioteconomia pela Universidade Federal de Goiás (UFG) em 1986. Hoje leciona nesse mesmo curso. Antes, entre 1992 e 2008, atuou como professora da mesma área na UFPB.