Jogos da modernidade

Em junho de 1894 foi criado o Comitê Olímpico Internacional, que deu início às Olimpíadas dos tempos modernos

Mariana Vaz

 

Esse ano, entre os dias 27 de julho e 12 de agosto, Londres será palco da 30ª edição dos Jogos Olímpicos da Era Moderna. Em 2016 será a vez do Brasil. Na terra dos reis, princípes e rainhas, os jogos serão disputados em 29 modalidades.  
Mas será que sempre foi assim? Claro que não! Antigamente, por volta de 2500 antes do nascimento de Cristo, os Jogos Olímpicos eram uma festa em homenagem a Zeus, que acabaram banidas em 392 depois de Cristo, quando os romanos retomaram a Grécia sob o comando do imperador Teodósio I, que proibiu todas as festas pagãs. 
Muitos anos mais tarde, o educador francês Charles Freddye Pierre, o Barão de Coubertin, foi decisivo para o retorno dos jogos. Em 23 de junho de 1894, ele ins­tituiu o Comitê Olímpico Internacional (COI) junto com representantes de 15 países. 
Apaixonado pelos costumes e crenças gregas, o nobre buscava resgatar a tradição olímpica dos jogos. Dois anos depois da criação do comitê, em 6 de abril de 1896, Atenas voltava a sediar as competições.
Nessa primeira edição, compareceram 195 atletas de 13 países. Detalhe: todos homens. As mulheres estrearam somente em 1900, em Paris, já que o regulamento, até então, só permitia a participação masculina e de brancos.
Naquela época, não havia medalhas. E os prêmios eram bem curiosos. Um pastor de ovelhas grego, que venceu a maratona, ganhou o direito de cortar o cabelo de graça até o fim da vida. O amadorismo também era característica obrigatória em várias categorias. 
Indivíduos que praticavam atividades esportivas constantemente poderiam ser desclassificados sob acusação de “profissionalismo”. Na primeira edição, foram disputadas provas de atletismo, ciclismo, luta, ginástica, halterofilismo, natação, tênis e esgrima, sendo essa última a única que admitia profissionais na época.
De acordo com o doutor em História Social e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Gilberto Cézar de Noronha, o profissionalismo nos esportes é recente e ainda hoje sofre resistência nos Jogos Olímpicos. “O limite de idade, como acontece no futebol, é uma forma de limitar, ao máximo, a experiência profissional dos competidores. Isso ainda é uma tentativa de manter os costumes de antigamente”, exemplifica. 

Parem a guerra!
Na Grécia antiga, a importância dos jogos era tamanha que até mesmo guerras foram interrompidas para a sua execução. Os eventos eram realizados a cada quatro anos na cidade de Olímpia, durante o verão, época em que se iniciava a contagem da "olimpíada", período cronológico usado para datar eventos históricos.
Noronha explica que antigamente os jogos assumiam um sentido inteiramente diferente do que é hoje. Havia a prática esportiva, mas tudo era parte de um imenso ritual de culto aos deuses e formação filosófica. “Era uma reunião das cidades-estados, que disputavam entre si, unindo a nação e formando os  indivíduos politicamente”, conta.
Na era moderna, essa visão mudou um pouco. Ainda que o barão de Coubertin tenha tentado manter essa característica “esportiva”, logo as edições tomaram um caráter bem menos poético.
Para o doutor em História Social, o significado das Olimpíadas modernas está ligado ao capitalismo e às disputas de mercado. “A tocha olímpica, por exemplo, representava na Antiguidade o fogo daquela cidade, a união de experiências de seu povo, e hoje esse símbolo perdeu completamente o significado”, pontua.
Em sua opinião, as Olimpíadas não podem ser entendidas somente como uma prática esportiva. “Elas se tornaram, bem como outras práticas esportivas, em momentos de politização e consumo capitalista. Hoje, podemos dar a elas um sentido muito mais ligado ao turismo e economia local, que em muito se diferencia da concepção original”, opina, ressaltando ainda o papel dos jogos nas disputas travadas na atualidade.

O esporte na Guerra Fria

Se na Grégia antiga, as atividades paravam uma guerra, no século 20 aconteceu o contrário. Durante as duas grandes guerras mundiais, as Olimpíadas foram interrompidas e, em inúmeras ocasiões, países inimigos ou que estavam em guerra com aqueles que sediavam as competições boicotaram os jogos.
“Durante a Guerra Fria fica visível a força do esporte para incentivar o confronto. Estados Unidos e, na época, União Soviética levavam a disputa para o pódio. Eles queriam provar qual era o melhor regime para se viver e para isso faziam uso da fascinação pelo esporte. Nessa época temos célebres casos de doping, motivados pela cobrança de ser o melhor”, alega.
Outro exemplo são as Olimpíadas de 1936, na Alemanha. Hitler já formava um exército para a Segunda Guerra quando incentivou os esportes e prometeu a melhor edição já vista daqueles jogos. “O evento foi uma clara ferramenta política usada por ele, que, naquela época, trouxe uma ideia dos gregos de forma muito mal interpretada: a busca da força e perfeição físicas”, relembra Cézar.

Fonte: Tribuna do Planalto