Brasil perde força no cenário internacional, dizem analistas

Crises diplomáticas expõem fragilidades da política externa brasileira, apesar de alguns avanços, avaliam especialistas

 

A presidente Dilma Rousseff faz amanhã discurso de abertura da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em Nova York. Em entrevistas, ela disse que aproveitará o espaço para cobrar sobre a espionagem americana de autoridades brasileiras, inclusive ela, e da Petrobras. Dilma adiou visita de Estado a Washington, marcada para outubro.

Estes e outros casos envolvendo a diplomacia brasileira, como a fuga para o Brasil do senador boliviano Roger Pinto Molina, com ajuda do então encarregado de negócios brasileiro, Eduardo Saboia, põem em evidência a capacidade do governo Dilma de conduzir a política externa do País, cuja linha diplomática tem contornos históricos bem-sucedidos.

De acordo com o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Williams Gonçalves, a maneira como Dilma conduz as diretrizes da política externa coloca-a como uma inapetente. “É como se ela fizesse porque tem de fazer”, diz, citando o caso Molina como exemplo da fragilidade do governo, do ponto de vista diplomático.

No dia 23 de agosto, Roger Molina, que estava na Embaixada brasileira em La Paz havia 455 dias, deixa a Bolívia para entrar no Brasil, junto com o diplomata Eduardo Saboia. Este executou a ação sem nenhum aval superior, supostamente sem o conhecimento sequer do embaixador do Brasil na Bolívia, Marcel Biato, que estava de férias, ou de Patriota.

Segundo Gonçalves, o caso Molina foi um típico ato de indisciplina por parte de Saboia, tornando-se um episódio desastroso. “Isso mancha um pouco aquilo que sempre notabilizou o Itamaraty, que é a organização pela hierarquia e a disciplina”, avalia. Para ele, essa lambança cai na conta de Dilma.

Ordem internacional

Para o professor da UFRJ, a linha da política externa brasileira não mudou desde a redemocratização. O que ela fez foi se intensificar, definindo-se por uma preocupação de manter coeso o Mercosul, avançar na integração continental, por meio da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), criada em 2008, e na luta para reafirmar a ordem internacional, que o Brasil trava junto com os demais membros dos Brics (Rússia, Índia, China e África do Sul).

O que aconteceu com o governo Dilma foi que a maneira de implementar essas políticas se enfraqueceu um pouco, avalia Gonçalves. Mesmo assim, diz, no caso das espionagens americanas, que causaram mal-estar nas relações com os EUA, a fragilidade não é diplomática, mas de meios de proteção. Apesar de Dilma ter desmarcado o encontro com Obama em outubro, nada mais grave vai acontecer.

Do ponto de vista político e diplomático, o Brasil faz, sim, a diferença no cenário internacional. A opinião é do professor e coordenador do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de Goiás (UFG), João Henrique Ribeiro Roriz. Os episódios que aumentam a tensão diplomática com outros países, como o caso Molina, da Bolívia, e as espionagens americanas, não tiram o brilho dessa conduta.

Segundo Roriz, de forma geral, o Brasil ainda é mais influenciado do que influencia os rumos do sistema internacional. “Mas sua habilidade de articulação política em conjunto com outros países tem provocado mudanças importantes.” Exemplos não faltam, diz o professor, como a liderança brasileira nos fóruns do G20, do Ibas (Índia, Brasil, África do Sul) e do Brics. “Nesse sentido, o País investe mais no viés diplomático e comercial do que nas esferas militar e estratégica”, avalia.

Além disso, o Brasil vê na diplomacia a saída para os conflitos, apostando na multipolaridade e no direito internacional. De acordo com Roriz, esta maneira de resolver conflitos não é só discurso. No caso da espionagem americana, por exemplo, o País pode tirar uma lição importante. “Apesar de um pequeno estremecimento ou um mero mal-estar, no médio e longo prazos as relações entre Brasília e Washington voltarão à normalidade e as possibilidades de cooperação e trocas econômicas continuarão existindo.”

Um proveito prático que o governo brasileiro pode tirar também é na criação de uma definitiva política de segurança virtual. “Precisa adotar medidas efetivas e de alto investimento na proteção de informações” Segundo Roriz, nas relações internacionais, a espionagem é tão antiga e utilizada quanto a própria diplomacia. “E muito provavelmente, continuará sendo praticada.”

Fonte: O Popular