Edward Madureira: “Com FHC vivemos um dos piores momentos da Universidade”

Confira o link da entrevista

4/01/2014 - Jornal O Hoje

 

Depois de 8 anos na reitoria da Universidade Federal de Goiás, o professor Edward Madureira volta à sala de aula em 2014. Mas só no primeiro semestre. Nesta segunda-feira (6) o neo petista ‘passa o bastão’ ao novo reitor, professor Orlando Amaral, e começa a se preparar para as eleições de outubro. EmO Hoje de Frente com o Poder, Edward apresenta números para comprovar o crescimento da UFG e diz que ‘a princípio’ tentará vaga na Câmara dos Deputados. Na entrevista a Murilo Santos, disparou críticas a FHC e Fernando Collor que “quase desmontaram as universidades”.

Nestes dois mandatos (8 anos) o que o senhor gostaria de ter feito mas ficou para a próxima gestão?

Talvez uma coisa emblemática, o investimento muito grande para concluir as obras do novo Hospital das Clínicas. Foi toda licitada, os recursos estão assegurados para o término da obra. Mas as três licitações – por problemas com as construtoras – não permitiram que se chegasse ao fim no nosso mandato. Mas fica a tranquilidade de que transcorrendo tudo bem com essa atual empreiteira que trabalha na obra, dentro de no máximo dois anos, os goianos estarão servidos com um dos melhores hospitais do país.

Qual foi o momento mais complicado?

Foiem 2007, quando submetíamos à apreciação do Conselho Universitário o maior projeto de expansão da história da Universidade Federal de Goiás, o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). Por duas vezes tivemos o Conselho Universitário invadido por pessoas, que sob argumentos inconsistentes e equivocados, porque o tempo mostrou o quanto essas pessoas estavam equivocadas, tentavam barrar a adesão da UFG ao programa. O Conselho se viu impedido, inclusive com agressões físicas em uma segunda tentativa de reunião. Mas fizemos a reunião em outro ambiente e conseguimos aprovar. Sei que a decisão foi a mais correta possível e os resultados estão aí para quem quiser comprovar.

O Reuni foi salutar para UFG?

De maneira explícita este foi o maior programa e a maior política pública da Universidade brasileira. Salutar não só para a UFG, mas para o Brasil. Um número talvez seja suficiente para afirmar isso. Nós tínhamos 500 mil matrículas antes de 2007 no sistema federal e hoje nós passamos de 1 milhão de matrículas. Isso é inclusão e qualidade. Nós fizemos toda essa expansão melhorando os indicadores de qualidade.

Quando A UFG começa a atuar em Aparecida de Goiânia e Cidade Ocidental?

Provavelmente até o segundo semestre deste ano, nós começamos a funcionar com um curso em cada campus. Sendo que as obras de construção desses campus estão em fase de licitação e estarão concluídas até 2015. Iremos começar em uma estrutura locada para as primeiras disciplinas e logo passaremos para a estrutura definitiva na área que nos foi doada nos dois municípios.

O curso de Medicina em Jataí começa ainda este ano ou só em 2015?

Teremos um vestibular no meio do anoe o início das aulas para a primeira turma do curso de Medicina da UFG em Jataí. Com concurso para professores em andamento, obras licitadas e apoio muito grande da Prefeitura de Jataí, estaremos preparados para iniciar as aulas no segundo semestre deste ano.

E a abertura demais vagas para Medicina?

O Governo Federal fez um plano de expansão das vagas de Medicina em todo o país. São 16 mil vagas. E nas instituições públicas essas vagas serão distribuídas para aquelas universidades, municípios e regiões que preencham as condições estabelecidas pelo governo, ou seja, condições de funcionamento, população, localização geográfica, e em Goiás pelo menos dois campus da UFG discutem a implantação. Em fase mais adiantada está Catalão. O campus de Catalão apesar de ter iniciado o movimento para a criação do curso após a Cidade de Goiás, fez um projeto que já foi aprovado em todas as instâncias da Universidade e também foi submetido ao Ministério da Educação.

Professor, as cotas são um caminho sem volta?

Até conceitualmente e filosoficamente as cotas devem ter data para acabar. As cotas são uma medida compensatória que devem ter princípio, meio e fim. Ela contempla uma geração que foi excluída da Educação Básica de qualidade na idade escolar. A solução é uma Educação Básica de qualidade com investimentos maciços, que eu espero que ocorra nos próximos anos com os recursos do Pré-Sal, Fundos Sociais e dos Royalties. Assim a Universidade poderá abrir mão das cotas. É uma medida que ainda deve durar 10 anos e esperamos que o problema da Educação Básica esteja resolvido.

O senhor acredita nisso?

Eu acredito que 10 anos é pouco para se resolver um problema tão grave como este. Mas tivemos muitos avanços. Precisamos resolver um problema crucial que é o reconhecimento profissional do professor. Nós vivemos uma crise nos cursos de Licenciatura. Na UFG anualmente tem centenas de vagas, que às vezes chegam a casa de milhares, que ficam ociosas nos cursos de formação de professores nas áreas de Biologia, Letras, Física, Matemática, entre outras. E sem professor na Educação Básica é difícil resolver o problema. Então passa pela remuneração.

Mas estamos muito longe…

Vamos exigir que a Legislação a ser aprovada seja implementada de fato. Em 2001, o Brasil aprovou um Plano Nacional de Educação onde se previa em 2011 chegarmos com 30% dos jovens de 18 a 24 anos no Ensino Superior. Chegamos com apenas 14%. Agora novamente estamos prometendo daqui a 10 anos chegarmos com 30%. Vamos fazer com que isso aconteça de que forma? Cobrando das diferentes esferas de governo e fazendo com que estes recursos da Educação cheguem de fato na sala de aula e na Universidade. Eu acredito que isso seja possível e factível, e para dizer a verdade é a única esperança que nós temos como país de sermos uma nação desenvolvida.

O processo seletivo tradicional (vestibular)acaba em 2014? A UFG vai adotar de forma integral a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem)?

Vivemos neste momento o último degrau de escalonamento de adesão ao sistema Enem e Sistema de Seleção Unificada (Sisu), porque as duas coisas andam juntas apesar de não serem necessariamente ligadas. Algumas instituições optam só pelo Enem outras usam os dois. O Sisu é apenas um sistema universal para a utilização da nota do Enem. Mas qualquer Universidade pode utilizar o Enem de forma isolada. Mas pensando na combinação das duas políticas (Enem e Sisu) saímos de zero, passamos para 20% e chegamosà 50%. O próximo passo é 100%.

É a melhor forma de selecionar o aluno para a UFG?

É a forma mais justa, não para selecionar o aluno para a UFG, mas a mais justa para o país. Você ter uma prova única no país é também uma forma de igualar as condições das pessoas. Porque muitas vezes os filhos de famílias mais abastadas podiam fazer uma verdadeira peregrinação nos meses de novembro, dezembro e janeiro, realizando vestibulares nos quatro quantos do país. Com o Enem todos fazem uma prova em seu município e concorrem a vagas no Brasil inteiro. Então essa é uma forma de democratizar o acesso nas Universidades, especialmente nas Federais.

O senhor agora é político. Por que a preferência pelo PT?

Por uma questão de absoluta coerência com a minha trajetória na reitoria e aquilo que aconteceu na Educação Superior no Brasil eu não teria como definir por outra agremiação partidária que não fosse o Partido dos Trabalhadores (PT), que teve a coragem de inverter um processo claro de desmonte da universidade brasileira.

Se os dois mandatos de reitor da UFG fossem nagestão Fernando Henrique Cardoso, o senhor poderia ter optado pelo PSDB?

Fui diretor da Escola de Agronomia durante a gestão do ex-presidente FHC. Nós vivemos naquela época talvez um dos piores momentos da Universidade. Teve um ano que o orçamento de investimento da Universidade, que é o dinheiro para obras, e o capital destinado à Universidade, foi zero. Ou seja, como se pode pensar em crescimento de uma instituição onde não se investe nenhum real em um ano para o desenvolvimento daquela instituição. Então eu acho que por coerência, não. Eu não vivi como reitor este momento, mas outros viveram e me afirmaram que era uma dificuldade até de relacionamento com o ministro da Educação da época.

Os governos do PSDB então foram ruins para a Educação Superior?

Sim e para a Educação Superior isso é lugar-comum, todos afirmam e não tem nenhuma divergência entre qualquer reitor ou dirigente que passou naquele período, assim como em períodos anteriores. O período do ex-presidente Fernando Collor foi terrível para as Universidades, que foram quase fechadas e convidadas a demitir 30% do pessoal, mas em ato de resistência não fizeram isso. Ou seja, é uma miopia do ponto de vista de estratégia. Se enxergava como solução para o país resolver o problema da Educação Básica e depois o da Educação Superior. Se esquecendo que quem está na Educação Básica almeja chegar na superior e que quem está na Educação Superior forma professores para a Educação Básica. É um sistema que vai da creche ao pós-doutorado. Ele não pode sofrer rupturas, mas antes deve receber investimentos.

Aqui no De Frente com o Poderse discute muito a enorme sensação de insegurança vivida em Goiânia.De que forma a UFG poderiacolaborar? Há uma saída?

Temos vários problemas deste tipo que não são de Goiânia, são das grandes metrópoles. Tivemos uma lógica de desenvolvimento muito equivocada. O Brasil trouxe aquilo que tinha de melhor e mais atrativo para os grandes centros. Então as Universidades vieram para os grandes centros, as indústrias, os grandes hospitais, e os grandes espaços de entretenimento vieram todos para as grandes cidades. E houve uma conurbação muito grande das cidades. Sou goianiense, nasci e cresci aqui, quando eu era criança Goiânia tinha 300 mil habitantes. Hoje a Região Metropolitana de Goiânia tem 2,5 milhões de habitantes talvez…

Já está perto disso…

Então é inevitável que a insegurança chegue, que os problemas de mobilidade cheguem e que outros problemas que nós vivenciamos cheguem, que as inundações cheguem. Olhe as impermeabilizações dessa cidade, o nível que trouxemos em nome do conforto, que traz o problema das enchentes. Então a questão da segurança é gravíssima para o país, que precisa ser enfrentada e acho que a Educação ajuda. A Educação é uma maneira de formar o cidadão e com certeza criar oportunidades para que não haja a delinquência e os problemas de insegurança. Mas alguma coisa precisa ser feita de maneira emergencial. Temos bons exemplos pelo país. O Rio de Janeiro, com as UPP’s, e outras cidades conseguiram alguns avanços. É preciso se tomar uma decisão, que extrapola, assim como a Educação, as esferas de governo municipal, estadual e federal. É preciso um esforço conjunto para combater a criminalidade e dar a tranquilidade do tempo em que andávamos pelas ruas de Goiânia sem medo.

Hoje o senhor tem medo?

Sim, é claro. Quem é que não tem medo de andar pelas ruas hoje? Todos nós temos. Então o cuidado deve ser em excesso porque estamos expostos a todo o momento.

(apoio: Felipe Coz e Augusto Diniz)