Em descrédito, partidos crescem

Mesmo vistas com receio, siglas aumentaram em 33% número de filiados desde 2009

 

Caio Henrique Salgado 02 de fevereiro de 2014 (domingo)

 

Impulsionada pela junção de uma série de interesses pessoais, especialmente em cidades pequenas, a política partidária cresceu 33% em Goiás nos últimos quatro anos. Contrastando com o fortalecimento de movimentos que querem se distanciar da política “convencional”, como o visto nos grandes protestos iniciados no ano passado, levantamento feito pelo POPULAR mostra que, mesmo em descrédito, os partidos conseguiram filiar 152.279 eleitores entre dezembro de 2009 e dezembro de 2013.  

O cruzamento de dados disponibilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que às vésperas das eleições de 2010 os partidos registrados no Estado somavam 461.780 filiados. O número saltou para 614.509 no fim do ano passado, representando um crescimento muito superior ao do eleitorado goiano. No mesmo período, o número de eleitores cresceu de 3,9 milhões para 4,3 milhões (10%) (veja quadro).  

Como o resultado desta evolução, atualmente 14,21% dos eleitores goianos têm filiação partidária. Um índice superior à média nacional (no Brasil todo, 11% são filiados), considerado elevado por especialistas consultados pelo POPULAR e que cresce de forma inversamente proporcional ao tamanho das cidades goianas.  

Os números analisados pela reportagem revelaram que o município de Anhnanguera, a menor cidade do Estado com 1.082 habitantes, localizada a 272 quilômetros de Goiânia, é também a cidade com o maior índice de filiados. Em dezembro, o TSE registrava a existência 514 filiados, o que representa 52,66% dos eleitores. Sendo assim, mais da metade das pessoas aptas a votar na pequena cidade localizada na divisa com Minas Gerais têm filiação (leia reportagem nesta página).  

Em uma análise ampliada, a tendência se mantém. Enquanto nas cidades com até 3 mil habitantes 33,29% dos eleitores são filiados, o índice cai para 6,7% nos municípios que têm entre 200 mil e 1 milhão de habitantes. No meio do caminho, Goiânia tem 10,47% de eleitores com filiação partidária.  

Paralelamente aos indícios de fortalecimento das estruturas partidárias em Goiás, pesquisas recentes demonstram o descrédito do brasileiro com este tipo de instituição. No ano passado, pesquisa Ibope divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo demonstrou que pela primeira vez desde 1988, o número de brasileiros que se declara apartidário superou o daqueles com preferência por alguma sigla, ficando em 56%.  

Motivações

O cientista político e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) Pedro Célio, procurado pela reportagem para analisar os números, defende que os fatores responsáveis pela evolução dos filiados a partidos políticos são os mesmos que “criam” e fortalecem os movimentos apartidários.  

“O crescimento dos partidos acontece muito mais como organização de poder. É o crescimento das burocracias partidárias. Cresce uma máquina de poder e ele fica reduzido a esse aspecto”, diz o professor, segundo o qual “o descrédito dos partidos ganha corpo principalmente a partir dos anos 1980, quando eles aceleram a perda da capacidade de mediar os conflitos e interesses centrais nas sociedades democráticas”.  

Pedro Célio explica que atualmente os partidos são formados por “grupos que somam as suas forças e passam a agir a favor de seus interesses” e, como consequência, as filiações são dissociadas do interesse na militância e “altamente episódicas”. “As pessoas se filiam por um motivo qualquer, sem qualquer identificação ideológica ou identificação programática”, analisa o cientista político.  

Segundo ele, as filiações muitas vezes se resumem a interesses imediatos como a eventual candidatura de um parente, amigo, chefe ou colega de trabalho. Da mesma forma, o motivo pode ser a busca por um emprego público. E isso seria mais evidente em cidades menores, justificando os números levantados pela reportagem. Quando membros de determinadas famílias entram na política há repercussão quase automática no conjunto da família e de suas redes de relacionamento. Nas pequenas comunas isto significa quase toda a cidade”, diz.

Fonte: O Popular