Parceria Público-Privada para presídio

Com processo de licitação em andamento, nova penitenciária será administrada por empresas. Especialistas contestam medida

 

domingo, 2 de fevereiro de 2014 | Por: Editoria  

Cristiane Lima

 

Prédios velhos, condições insalubres e superlotados. Assim são as instalações da Penitenciária Odenir Guimarães (POG), construída na década de 60. E se tudo correr como vem sendo planejado pela Secretaria de Estado da Administração Penitenciária e Justiça (Sapejus) de Goiás, um novo presídio deverá ser inaugurado em dois anos. A maneira encontrada pela secretaria foi firmar parceria com empresas privadas. O processo de licitação está em andamento e a expectativa é que as obras comecem no segundo semestre desse ano. Mas há quem discorde. Professora da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás (UFG), Bartira Macedo defende que o próprio Estado invista o dinheiro nas melhorias.  

O governo do Estado de Goiás aprovou no final de dezembro uma lei que permite delegar, por meio de concessão administrativa, a construção e a gestão do Complexo risional Odenir Guimarães. O documento concretiza a Parceria Público-Privada (PPP), proposta pelo governo do Estado de Goiás e discutida há pelo menos quatro anos, segundo a Sapejus. Segundo consta no projeto, a parceria permite a contratação de um empresa particular para a implantação, gestão e manutenção do novo presídio. A concessão será de 27 anos, sendo dois deles destinados à construção e os outros 25 para a administração.  

Diretor de Políticas Penitenciárias da Sapejus, Joseleno Borges explica que todos o procedimento para a licitação já foi feito e que, agora, está na fase final para lançamento do edital. Os investimentos serão de R$ 1,3 bi. O valor máximo inicial previsto por vaga é de R$ 113,00/dia, nos primeiros 12 anos, e de R$ 68,00/dia até o final da concessão. “O objetivo é substituir o prédio totalmente e implodir o antigo presídio”. Nesse novo modelo, além de novos alojamentos, está previsto que seja oferecido também suporte psicológico, profissional, assistência e capacitação.  

A publicação do Edital estava prevista para a última semana de janeiro, mas ainda não ocorreu. O promotor Haroldo Caetano da Silva recomendou ao titular da Sapejus, Edemundo Dias, a anulação da audiência pública de 27 de dezembro de 2013, que tratou das PPPs para o Complexo Prisional Odenir Guimarães. A justificativa é que a audiência pública, prevista em lei, ocorreu em dia de ponto facultativo. A orientação é uma nova data seja definida e que os debates sejam refeitos. A assessoria de imprensa da Sapejus informou que já foi notificada da recomendação e que o pedido foi encaminhado ao departamento jurídico da secretaria, que vai analisar. Caso seja confirmado que o ponto facultativo não poderia ser data para os debates, nova audiência será remarcada. Caso contrário, o processo deverá seguir normalmente.  

Medida visa minimizar problemas  

O promotor Haroldo Caetano decidiu pela recomendação porque o chamamento para audiência pública foi formalizado 11 de dezembro de 2013. A publicação no Diário Oficial ocorreu no dia seguinte, mas o Diário Oficial do Estado circulou somente no dia 18. “Mesmo que tivesse circulado no dia 12 o comunicado não teria atendido aos dispositivos legais, uma vez que houve feriado no dia 25, dois dias sem expediente nas repartições públicas nos dias 23 e 24, além de expediente reduzido no dia 26”, argumenta Haroldo Caetano ao portal do MP.  

Caso o processo siga, em até 120 dias após o lançamento da licitação, o vencedor é conhecido e deverá começar as obras imediatamente. Joseleno Borges destaca que, durante a construção do prédio, nenhum valor será desembolsado e os pagamentos só começam após a transferência dos presos. A partir do terceiro ano da gestão da empresa até o 14° ano, pagará o valor de, no máximo, R$ 113 por preso, sendo R$ 45 apenas para o custeio da construção. A partir do 14° ano, o valor pago por preso a cada dia passa a ser R$ 68. O Complexo Prisional Odenir Guimarães será construído no município de Aparecida de Goiânia, em uma área dentro do atual Complexo Prisional. E seguirá determinações legais, como a individualização da pena, com separação dos presos por grau de periculosidade.  

Joseleno afirma que as PPPs para construção do novo presídio não é o caminho para a solução do problema penitenciário, que é um tema complexo, mas é um caminho para minimizar os problemas já existentes hoje. O novo presídio, que também se chamará Odenir Guimarães, terá para 1600 presos, dispostos em quatro unidades penais, sendo duas unidades de 600 vagas, uma unidade de 400, e do total 70 vagas serão para triagem. O antigo prédio deverá ser demolido e no local, futuramente, ser construído outro presídio com verbas destinadas pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen).  

Levantamento do próprio Depen divulgado na última semana, mostra que nos últimos dez anos 15 estados e o Distrito Federal deixaram de usar R$ 187 milhões liberados pelo governo federal para construir e reformar presídios. Em Goiás, mais de R$ 13 milhões foram devolvidos. O valor deveria ser usado para reforma da Colônia Industrial do Semiaberto; construção de um Presídio de Segurança Máxima em Aparecida de Goiânia; reforma da Cadeia Pública de Santa Helena; presídio Regional em Senador Canedo. A Sapejus informou que que tanto a reforma na colônia industrial quanto a construção do presídio em Aparecida de Goiás foram canceladas por decisão unilateral do Depen, após mudança na política prisional do governo federal em 2011.  

Método gera polêmica e diversidade de opiniões

Professora da Faculdade de Direito da UFG, Bartira Macedo de Miranda Santos é contra as PPPs para esse tipo de serviço. Ela concorda que os prédios são insalubres e não oferecem condições para que os presos sejam reinseridos na sociedade, mas acredita que os valores devem ser geridos pelo próprio Estado. “É incoerente dizer que não tem dinheiro para construir, mas tem para pagar para alguém construir”. Ela acrescenta que não concorda em conceder esse tipo de gestão por tanto tempo, mesmo sem ter a certeza de que o serviço será prestado com o rigor que estabelecem em documentos. “E não adianta investir milhões em um único presídio se o problema da criminalidade não é atacado, não só na Capital, mas no interior”.  

A Ordem dos Advogados do Brasil em Goiás (OAB-GO) ainda não tem posicionamento sobre as PPPs nesse contexto. Uma visita no complexo de Aparecida de Goiânia está agendada para o próximo dia 6 de fevereiro. O presidente da OAB nacional, Marcus Vinicius Furtado Coelho, vai participar da visita. Depois disso, comissão da regional goiana deverá visitar um presídio em Minas Gerais para, depois, apresentar posicionamento sobre esse tipo de parceria.  

O desembargador do Tribunal de Justiça de Alagoas Tutmés Airan publicou artigo em que defende a terceirização.

Fonte: O Hoje