“Não somos capazes de controlar a dengue sem o apoio de todos”

 

(Malu Longo) 25 de março de 2014 (terça-feira)

O médico João Bosco Siqueira Júnior concluiu residência, mestrado e doutorado em Medicina Tropical no Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás (UFG). De 2000 e 2005 assessorou o Programa Nacional de Controle da Dengue conduzido pelo Ministério da Saúde. Ao POPULAR, o epidemiologista alerta: dengue ainda é um grande desafio.

O que mais chamou a atenção dos pesquisadores nos dois estudos do qual o senhor fez parte?

O primeiro estudo, que é a revisão da literatura publicada no Brasil sobre dengue até 2012, mostra a imensa tendência de aumento da dengue no país, especialmente na segunda metade da década de 2000, seguido pelo aumento do número de óbitos e internações. Isso reflete que cada vez mais as pessoas estão sendo afetadas pela doença.

A que outras conclusões vocês chegaram?

Parece que o principal responsável por isso foi a circulação do vírus tipo 2. A gente não teve a circulação desse vírus no Centro-Oeste. Nós pulamos o ciclo de dengue 2 aqui em Goiás, mas por outro lado o ciclo de dengue 1 que começa na segunda metade de 2009 e leva à grande epidemia de 2010, começa no Centro-Oeste. Goiás foi um dos grandes afetados naquele ano.

No ano passado, nessa época, Goiás vivia uma epidemia de dengue. Isso não ocorre agora. Qual foi a mudança?

Isso é algo esperado quando há grandes epidemias nos anos anteriores. Como boa parte da população já entrou em contato com o vírus, adquiriu a imunidade para aquele vírus específico, a chance de ter epidemia por dois anos consecutivos é menor. Entretanto, várias cidades no Brasil tiveram dois anos consecutivos de epidemia, como Rio Branco (AC), que foram três anos seguidos. Não dá para contar isso como sendo um fator que vai reduzir a transmissão no ano seguinte. Tivemos o fator climático, com menos chuva, que contribui, mas é uma combinação de alguns fatores.

Goiânia está preparada para epidemias de dengue?

Goiânia tem tido esforços interessantes na prevenção e controle de dengue. A Secretaria Municipal de Saúde tem apoiado estudos em busca de alternativas. A partir deste ano a pasta vai utilizar em áreas localizadas, como escolas e hospitais, cortinas impregnadas de inseticida. O produto não traz dano à população, mas se o mosquito pousa na cortina ele será eliminado. Esse é um estudo que está sendo feito em colaboração com os Ministérios da Saúde do Brasil, do México e de países da Ásia junto com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Goiânia também é uma cidade que avançou muito no processo de fazer a triagem dos pacientes, a classificação de risco como é chamado no sistema público.

Dengue ainda é um grande desafio?

Muito grande. Se conhece muito, mas há muito para conhecer, especialmente em relação ao impacto de novas tecnologias, a dinâmica de transmissão da doença na população, entender porque as epidemias ocorrem, a gravidade em crianças e pessoas mais velhas.

Por que a população fica tão vulnerável à doença e à gravidade dela?

Para a doença é por causa da possibilidade de retorno. São muitos mosquitos. Não tem nenhum local no mundo que tem esse exército que trabalha com prevenção da dengue como no Brasil. Mas a gente não é capaz de controlar a dengue sem a participação de todo mundo. A população inteira sabe o que tem de fazer, mas transformar conhecimento em prática é muito desafiador.

E a vacina contra a dengue, há notícias promissoras?

Essa uma notícia que o mundo inteiro está esperando para o segundo semestre deste ano. A candidata mais avançada é da Sanofi Pasteur, de cujo estudo Goiânia participou. São quase 30 mil pessoas de diversos países da América e da Ásia.


Fonte: O Popular