O adeus a um homem das utopias

DIÁRIO DA MANHÃ

RENATO DIAS

O corpo do antropólogo Antônio Duarte dos Santos, morto no último domingo, no Hospital Naval Marcílio Dias, de ataque cardíaco, foi enterrado, ontem, sob forte comoção, no Cemitério Parque Memorial, em Goiânia. Registro: ele tinha 74 anos de idade. É o que revela a sua irmã Rita Duarte. 

Suboficial da Marinha, o professor foi um dos líderes dos marinheiros, no turbulento ano de 1964, da rebelião de 25 de março, ainda sob a presidência do nacional-estatista João Goulart. História: ele teria incorporado ao movimento o então jovem José Anselmo dos Santos e acabou preso à época da ditadura civil e militar.

Em uma ação espetacular, ele foi libertado com mais nove presos políticos. A operação política e militar, na Penitenciária Lemos de Brito, Rio de Janeiro (RJ), ocorreu em julho do ano de 1969, informa um dos participantes do grupo de fogo – ou Grupo Tático Armado –, José Duarte dos Santos.

Além de seu irmão, José Duarte dos Santos era um dirigente da Ação Libertadora Nacional (ALN), organização de luta armada criada pelo carbonário baiano, filho de um italiano com uma negra Haussá, Carlos Marighella, ex-deputado federal constituinte em 1946, dissidente do moderado Partidão [PCB].

Libertado na operação, Antônio Duarte dos Santos fugiu, então, primeiro, para a Bolívia. Depois, embarcou para o Chile. Na pátria do médico socialista Salvador Allende, morto em 11 de setembro de 1973, no Palácio de La Moneda, ele conheceu revolucionários cubanos e mudou-se para Havana, dos irmãos Castro.

Internacionalista, o militante revolucionário exilou-se por último na Suécia, referência na Europa em Estado do Bem-Estar Social (Welfare State). Em Estocolmo, formou-se em Antropologia e chegou até a aposentar-se, no país, como funcionário público, em uma estatal dos Correios, conta José Duarte dos Santos.

Com a Lei de Anistia, sancionada em 28 de agosto de 1979, pelo quinto general-presidente João Baptista Figueiredo, ele ensaiou o retorno ao Brasil. Mesmo assim, sempre regressava à Suécia, onde também haviam se exilado Cid Benjamin e César Benjamin, o ‘Menininho’. Os dois eram militantes do MR-8.

Casado e sem filhos, Antônio Duarte dos Santos nasceu no ano de 1940, em Pau dos Ferros, município do interior do Estado do Rio Grande do Norte. Ele era filho do oficial da Polícia Militar (PM-RN) Francisco Lázaro e da dona de casa Francisca Duarte. O casal Duarte teve oito filhos, apurou o Diário da Manhã. 

Revolução

Já José Duarte dos Santos, preso nos anos de chumbo,  acabou trocado pelo embaixador da Suíça no Brasil, Giovanni Enrico Bucher, capturado pela guerrilha urbana em dezembro de 1970. Ele embarcou para Santiago, Chile, em janeiro de 1971, com mais 69 presos políticos. Entre eles, Frei Tito de Alencar Lima, dominicano da ALN que suicidou-se na França, em 1974.

No Chile, José Duarte dos Santos conseguiu escapar da repressão política após o golpe de Estado deflagrado pelo general Augusto Pinochet ao refugiar-se na Embaixada do México. Com o líder estudantil Vladimir Palmeira, membro da Dissidência da Guanabara, que virou MR-8. Dias depois, seguiu para o México e, enfim, Europa. 

  •          Os meus últimos dias de exílio foram em Moçambique.

Como Antônio Duarte dos Santos, ele iniciou a sua atuação revolucionária na Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil, integrou o Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR), de linhagem brizolista, fez parte da Ação Libertadora Nacional e compôs ainda os quadros do clandestino MR-8.

  •          A mais charmosa organização da luta armada [Quem relata é o historiador Daniel Aarão Reis Filho, doutor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e autor de “Ditadura e Democracia no Brasil – 50 anos do golpe de 1964” (2014), Zahar Editora, e de “Modernização, Ditadura e Democracia – 1964-2010”, Editora Objetiva].

José Duarte exilou-se na Bélgica e depois foi para a África, onde auxiliou na construção do socialismo em Moçambique. Ao lado de Daniel Aarão Reis Filho (RJ), hoje celebrado historiador, e do jornalista Juarez Ferraz Maia, atual coordenador do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Goiás (UFG).

Ligado ao tucanato, José Duarte tem passagens pela Companhia Energética de Goiás (Celg), Agência Goiana de Comunicação (Agecom), Departamento Estadual de Trânsito (Detran), além da Agência Goiana de Regulação (AGR), onde ocupa, hoje, um cargo. Ex-Fundação Pedro Horta, mantém vínculos políticos com Marconi Perillo e Giuseppe Vecci.

Acompanharam o sepultamento, ontem, no Cemitério Parque Memorial, Marco Antônio Sperb Leite, Humberto Tannus, Nelson Guzzo, Júlio Cesar Duarte, Marcantonio Dela Côrte, presidente da Associação dos Anistiados do Estado de Goiás (Anigo), o editor-chefe do jornal Opção, Euler de França Belém, Guilherme de Freitas, assim como Luiz Fernando Magalhães.

Fonte: Diário da Manhã

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