Redução de CO2 deve ter ajustes

Redução de CO2 deve ter ajustes

Adequações a serem feitas pelo país visam tornar possível cumprir meta de queda de emissões em até 38,9%

Vinicius Jorge Sassine

Definidas as metas de redução de emissão de CO2 que o Brasil vai levar para a 15ª Conferência das Partes da Organização das Nações Unidas (COP-15), em Copenhague, Dinamarca, o governo brasileiro precisa explicar como chegou às projeções apresentadas e, mais importante, como será possível reduzir as emissões em até 38,9%, conforme as metas acertadas. Uma tabela com os dados de emissão e redução de CO2 até 2020 – pelo uso da terra, pela agropecuária, pelo emprego da energia e por siderurgias – foi o único documento divulgado pelo governo até agora. Com base em pesquisas já publicadas, estudos em andamento e relatórios oficiais de setores do governo, O POPULAR constatou que boa parte das metas apresentadas precisará ser reajustada até 2020, em razão das discrepâncias entre o previsto e o real.

Ontem, o jornal revelou o que o governo esconde desde o anúncio do plano brasileiro de mitigação de CO2, no último dia 13. O Cerrado será amplamente devastado para que se cumpra a meta de redução de CO2 pela Amazônia, como está claro em dados oficiais que não foram apresentados juntamente com os números de toneladas de dióxido de carbono que deverão ser poupadas. Em 2020, a intenção é reduzir 80% do desmatamento da Amazônia, o que significa uma retirada tolerada de 3,9 mil quilômetros quadrados de vegetação. No Cerrado, a redução prevista é de 40% – as propostas de 80% ou 50% foram rejeitadas pelo governo – o que permite a devastação de 9,4 mil quilômetros quadrados de mata nativa, 141% a mais do que o previsto para o território amazônico. O que ocorre com o setor de agropecuária também resume bem as discrepâncias das metas que serão levadas para a cúpula de Copenhague, a partir de 7 de dezembro. Somente na Região Centro-Oeste existem 45 milhões de hectares de pastagens degradadas. Estudos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa Arroz e Feijão) em Goiás mostram que essa área, se recuperada, evitaria a emissão de 528 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera por ano. E isso levando em conta uma recuperação para uma qualidade “média”, e não “alta” ou “baixa”, como as pesquisas classificam a recuperação de pastos. A meta do governo para todo o País é cinco vezes menor. “Os dados são muito humildes”, ressalta o pesquisador da Embrapa Arroz e Feijão João Kluthcouski, doutor em Ciência Agrícola e autor dos estudos sobre recuperação de pastagens. Segundo ele, um pasto recuperado pode reter CO2 até setembro, e não somente até junho, quando seca e perde a capacidade de prender carbono. “O governo está fazendo muitos cálculos e se esquecendo dos pastos degradados”, critica. O pesquisador também considera tímidas as metas de redução de CO2 a partir da integração entre lavoura e pecuária, do plantio direto e da maior fixação biológica de nitrogênio. As três ações, somadas, podem reter até 62 milhões de toneladas de CO2 em 2020, conforme as metas definidas para Copenhague.

“Não sabemos nada sobre as pastagens, em relação à qualidade do pasto e o que está sendo emitido”, afirma o pesquisador Laerte Guimarães Ferreira, coordenador do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig) da Universidade Federal de Goiás (UFG). Segundo ele, o governo brasileiro precisará qualificar os números das metas de redução de CO2 nos próximos anos.

Assim, para que as projeções sejam minimamente fidedignas, será necessário mapear com exatidão o desmatamento, identificar se essas áreas estão sendo convertidas em fogo ou em pastagens que, futuramente, estarão degradadas. “O governo, de forma conservadora, está levando as metas para Copenhague. É um avanço gigantesco, pois existe agora um compromisso com essas metas”, diz Laerte. O coordenador do Lapig foi consultado pelo grupo que definiu as metas sobre o Cerrado a serem apresentadas ao governo. Para ele, é um erro usar dados de desmatamento do Ministério do Meio Ambiente. “Os números estão superestimados e, assim, fica fácil cumprir uma meta, pois ainda pode-se desmatar muito.”


Cerrado sofrerá com estratégia do governo

O pesquisador Laerte Guimarães Ferreira, do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig), da UFG, conta que o documento final apresentado aos ministros do presidente Lula não prevê uma queda linear ou exponencial do desmatamento do Cerrado, mas uma redução lenta. Como a previsão de redução é a metade do estipulado para a Amazônia, o Cerrado sofrerá uma pressão muito maior até 2020. “Essa pode ter sido uma estratégia do governo para cumprir as metas”, afirma o pesquisador Manuel Ferreira, também do Lapig. Ele estuda os ciclos do carbono no Cerrado e, conforme os cálculos realizados, o bioma chegará em 2020 emitindo 39 milhões de toneladas de CO2, menos da metade do que previu o governo na definição das metas para Copenhague. “A discussão só começa agora para o Cerrado. Mas, ainda bem que começa”, observa o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) Carlos Nobre, que integra o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), ligado à ONU. Carlos Nobre entende ser um avanço a inclusão do bioma nas metas de CO2 do governo brasileiro, apesar do recuo em relação ao que foi apresentado pelo grupo técnico. Para ele, o Brasil demonstrou “protagonismo”, “deu uma dentro” ao antecipar as metas de redução de CO2 que serão levadas para a COP-15. “A repercussão internacional foi muito boa.”