Pedestre ainda não é prioridade

Data: 06 de agosto de 2014

Veículo: O Hoje

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Na segunda reportagem da série “Transporte em Foco”, especialistas atestam que políticas públicas de mobilidade não atendem os pedestres

 

Cristiane Lima

 

Calçadas mal planejadas e ocupadas por carros mostram que pedestre não tem vez nas ruas  (Danilo Bueno)

 

O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê que o pedestre seja sempre prioridade. Mas não é o que se observa nas ruas de Goiânia. Levantamento do Ministério Público, apresentado mês passado, mostra que 90% das calçadas estão irregulares. Entre os problemas estão buracos, galhos e lixo amontoado, placas de publicidade e desníveis. Existem também carros estacionados, exposição de mercadorias, vendedores ambulantes e lojistas nas calçadas. Além de tudo isso há a imprudência dos condutores de veículos contra quem anda a pé.

 

Engenheiro civil e professor da PUC Goiás, Sérgio Botassi dos Santos, ressalta que a infraestrutura urbana voltada à mobilidade é responsabilidade de toda a sociedade civil, porém onde há maior fluxo de pessoas e veículos, como ruas, calçadas, parques e vias em geral, são de responsabilidade específica da prefeitura. “Assim, é de fundamental importância que o poder público municipal cumpra seu papel, já bem definido nas leis e decretos municipais, realizando obras que priorizem o pedestre, tão fragilizado em um trânsito cada vez mais selvagem”.

 

 

 

Prioridade ao coletivo

 

Arquiteta urbanista e doutora em transportes, Erika Cristine Kneib entende que a melhoria da mobilidade se faz a partir da prioridade aos modos coletivos e não motorizados de deslocamento (a pé e bicicleta) e pressupõe maiores e melhores oportunidades de deslocamento.

 

Ela acrescenta que todos são pedestres em algum momento de seu deslocamento. “Destaca-se que o andar a pé é adequado para distâncias até mil metros. A cidade precisa estar organizada e funcionando em rede, regulando e fiscalizando cada modo. O pedestre é o mais sensível, pois estamos falando na pequena escala, na acessibilidade micro, onde os detalhes importam muito”, diz ela.

 

Érika ressalta que a sinalização vertical, horizontal e semafórica para proporcionar segurança, calçadas acessíveis, mobiliário urbano e paisagismo adequado são fundamentais para a segurança do pedestre. “Cidades ‘maduras’ em termos de mobilidade tratam o pedestre como prioridade”.

 

 

 

Direitos

 

Botassi acrescenta que é importante lembrar que o pedestre é um cidadão que pode exercer seus direitos diretamente a partir de vários mecanismos constitucionais, como abaixo-assinados, cobrando do gestor público e votando corretamente. Há ainda a possibilidade de solicitar o apoio do Ministério Público estadual, que pode avaliar se está havendo algum ato ilegal quando a prefeitura deixa de cumprir seu papel de garantir mobilidade urbana eficiente e segura.

 

Para Érika, os gestores precisam iniciar um processo adequado e participativo de mudança, que, com o tempo, a sociedade apoiará. “Todavia, melhorar para o pedestre, às vezes, significa retirar a prioridade dos veículos, o que, nem sempre é bem aceito pela população usuária de carros”.

 

 

 

Mortes no trânsito dobraram em Goiânia

 

A impunidade e a falta de educação podem ser as grandes causas das muitas tragédias no trânsito da Capital. Pelo menos para a titular da Delegacia de Investigação de Crimes e Acidentes de Trânsito (Dict), Nilda Lima de Andrade, que defende leis mais rigorosas para quem não respeita as regras de trânsito. “O desrespeito às normas de trânsito, o descumprimento à sinalização e a falta de conscientização podem ocasionar mortes em locais muito movimentados”, observa.

 

A imprudência de uma condutora foi, por exemplo, a causadora de mais uma tragédia diária no trânsito de Goiânia. Enterrada ontem a estudante de jornalismo Jéssyca Nunes Marques, de 23 anos foi atropelada sobre a faixa de pedestre na noite da última segunda-feira (4). A jovem saída da faculdade quando foi atingida por um veículo em alta velocidade. A condutora chegou a prestar socorro, mas a estudante não resistiu aos ferimentos e morreu na madrugada de ontem.

 

A morte de Jéssyca irá a aumenta as estatísticas da Dict. Segundo dados da Especializada o número de acidentes de trânsito em Goiânia que resultaram em morte mais que dobrou na comparação entre janeiro e agosto de 2013 e o mesmo período deste ano. No ano passado foram 27 óbitos, em 2014 já são 52 mortes causadas em acidentes com veículos automotores em Goiânia.

 

 

 

 

Locais perigosos

 

O setor Central é o campeão na quantidade de acidentes fatais, só este ano foram registrado sete casos na região. O perímetro da BR 153 que passa por Goiânia é outra região campeã de ocorrências com mortes, este ano foram apenas quatro registro de acidentes fatais, mas em 2013 foram 16 casos.

 

Conforme a delegada Nilda, a pena para o condutor que atropela, e mata, na faixa de pedestre é de até quatro anos de prisão. “Ou seja, significa impunidade já que o condutor não vai preso, ele responde ao inquérito em liberdade”. Conforme a delegada, a legislação é clara nesse sentido: nos casos de homicídio, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê detenção de dois a quatro anos e suspensão de se obter a permissão ou a proibição para dirigir veículo automotor.

 

 

 

Mais rigor

 

Já em casos de homicídio “normal”, o motorista pode pegar de dois a quatro anos. “Mas se o acidente for na faixa, ou na calçada, aumenta a penalidade em dois anos e pode passar para 6 anos de prisão”, esclareceu.

 

Na opinião da delegada, trânsito é uma questão de comportamento. “O que mais causa acidentes com vítimas fatais são excesso de velocidade, desrespeito ao semáforo ou sinalização de pare e a embriaguez ao volante”, relatou, lembrando que o condutor, nesse último caso, fica mais vulnerável a causar desastres nas ruas. Ela afirma que “A prevenção passa pela intensificação de campanhas de educação de transito e o aumento da fiscalização, tanto por agentes quanto por sinalização eletrônica”.

 

Além disso, a Dra. Nilda defende que haja um aumento nas penas e efetivamente, o motorista que bebeu e conduz carros, seja preso e fique na cadeia. “A legislação deveria permitir que isso acontecesse para que as pessoas deixassem de sentir essa sensação de impunidade que existe nos casos de embriaguez ao volante”, finalizou.

 

Para o Chefe de gabinete da Secretaria Municipal de Trânsito, Transportes e Mobilidade (SMT) Jean Damas, o fato de os condutores não respeitarem a faixa de pedestres é uma questão cultural. “Vivemos em uma cultura em que o cidadão sempre dá um jeitinho para tudo o que vai fazer, é sempre o direito em primeiro lugar e nunca o dever”, afirmou. Ele explicou que o excesso de velocidade aliado ao álcool ou uma dessas duas coisas com a irresponsabilidade ao volante, estão gerando muitas mortes. “Precisamos conscientizar a população que o carro é uma arma poderosíssima”, advertiu. (Cynthia Costa)

Fonte: O Hoje

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