Moda sempre é arte Entrevista Mirian Costa Manso
Jornal O Popular 07/03/2007
O estilista é o porta-voz do pensamento estético do seu tempo e deve ser consciente de que a moda não é a única manifestação artística que se adapta às imposições do mercado. A análise é da professora Míriam Costa Manso, que defende a moda como arte.
Na atualidade, qual o papel da moda na sociedade de consumo profundamente influenciada pela mídia?[
Moda sempre é arte. O produto de moda resulta de um processo criativo que trabalha com conceitos estéticos, procurando solucionar problemas de equilíbrio de volumes, harmonia de proporções, ritmo no entrelaçamento de formas, linhas, cores e texturas. Se a moda, na sociedade de consumo, curva-se diante das imposições da mídia, isso não significa que ela abdique de sua posição no mundo da arte. Aliás, a moda não é a única manifestação artística que se adapta às imposições do mercado. Hoje, as galerias promovem o lançamento de obras de arte valendo-se dos mesmos mecanismos publicitários usados para a promoção de qualquer produto. Não deixa de ser um desafio ao estilista a resolução da equação moda x mercado. Mas, como qualquer artista, ele é apenas o porta-voz do pensamento estético de seu tempo, antecipando, nas peças que cria para compor o corpo humano, uma tendência que se esboça no panorama geral da arte.
Que trajes que, ao longo da história da moda, foram marcantes?
Talvez seja mais interessante citar alguns momentos da história da indumentária. O marco inicial da moda deu-se na época medieval, na segunda metade do século 14. Até aquele momento, podia-se notar nos trajes um profundo significado simbólico, que revelava o pensamento estético dos diversos povos, mas era praticamente omisso quanto à individualidade de cada um. Cada povo tinha um modo particular de se vestir, calcado na imitação de seus soberanos ou chefes. No momento em que a moda fez sua aparição nas cortes medievais. Essa livre organização extrapola a rivalidade de classes, pretendendo-se às qualidades de originalidade e criatividade, à exaltação do individualismo e à procura incessante do novo. Reflete o caráter cultural e estético do instante histórico, variando mais no tempo e menos no espaço. Depois, em um terceiro movimento marcante da história do traje, surge a moda industrializada. Seu aparecimento pode ser datado de meados do século 20. Ela se torna a espinha dorsal da sociedade de consumo, um fenômeno global que introduz no vestuário a idéia do descartável.
Quais nomes deixaram sua história na moda da atualidade?
Desde o momento em que a moda surgiu, como a conhecemos na atualidade, volúvel e criativa, vários nomes deixaram sua marca na estrada, a começar por Worth, que mudou totalmente o modo de comercialização dos trajes e pode ser chamado de “o pai da alta costura”. A partir de então, foi possível a cada costureiro ditar seu gosto a suas clientes, pois cada um deles passou a organizar suas próprias coleções e, de uma certa forma, impor seus conceitos de elegância. Em seu rastro, apareceram Poiret, Chanel, Dior, Yves Saint Laurent e tantos outros que construíram a história do vestuário por estilos que se tornaram marcos em sua época.
A sociedade do efêmero foi um dos motivos por que a moda passou a ser mais valorizada?
O momento atual anuncia um conceito de vida bastante diferente daquele que dominou o passado. A humanidade repensa seus valores e tende a priorizar o meio ambiente, a qualidade de vida e a paz, sendo possível perceber um novo estilo de comportamento diante do consumo, mais consciente e crítico. A moda, como espelho do tempo, faz parte desse processo e certamente continua desempenhando um importante papel na evolução da maneira de ser do homem, suprindo seus desejos com novas e interessantes coleções, que possam satisfazer a um mundo que está se reestruturando econômica e industrialmente. Nessa busca é natural que os estilos variem em ritmo acelerado e as propostas pessoais dos estilistas se sobreponham umas às outras. Essa ebulição faz o efêmero da moda. Mas essa ebulição é também saudável. A moda não faz só o pior, como querem os que a denunciam como responsável pelo caráter descartável dos seus produtos. Faz também o melhor, como motor de uma indústria criativa e produtiva que emprega milhões de pessoas e alimenta os sonhos.