Expansão prevista pelo MEC ajuda na valorização profissional do aluno
Karine Rodrigues
Existem no País cerca de 200 mil vagas de emprego aguardando candidatos saídos de escolas profissionalizantes
O investimento de R$ 1 bilhão para a construção de 150 escolas federais de ensino técnico, anunciado pelo governo federal, deve acelerar o processo de valorização da educação profissional, acreditam os especialistas da área. O interesse pelo setor, aliás, só aumenta, já que entre 2003 e 2005 o número de matrículas subiu 27%, e o de estabelecimentos, 18%. Um incremento motivado pela crença de que este é o caminho mais rápido para se conseguir uma vaga no mercado de trabalho, mas não só: as instituições costumam ter como outro importante atrativo o ensino de qualidade.
“A sociedade brasileira vive sob uma forte carga bacharelesca. Por isso há muito preconceito com tudo que se relaciona ao mundo do trabalho, seja o ensino técnico ou tecnológico, que tem status de graduação. São vistos como de segunda categoria”, observa Eliezer Pacheco, responsável pela Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (Setec), do Ministério da Educação (MEC).
Segundo ele, tudo não passa de um equívoco, já que muitas vezes o aluno do ensino profissional é “tão bom ou melhor do que os demais”, por ser desafiado diariamente.
Os cursos não são tão rápidos como muitos podem imaginar, já que a duração gira em torno de seis semestres. Além disso, o estágio é obrigatório, e a carga horária, quando feita em concomitância com o ensino médio, exige dedicação em tempo integral.
RECONHECIMENTO DO SETOR
Ainda que estejam sendo ditadas pelo mercado, as mudanças no ensino técnico devem resultar no maior reconhecimento do setor, avalia Pacheco, lembrando que existem hoje no País cerca de 200 mil vagas de emprego aguardando candidatos. Por estar vinculada diretamente ao projeto de desenvolvimento nacional, a expansão prevê que as escolas vão oferecer cursos associados aos perfis econômicos dos municípios onde serão erguidas.
“A educação profissional é imprescindível para um país que quer crescer rapidamente”, observa o secretário. A opinião é partilhada por Carmen Perrotta, diretora de Gestão Estratégica do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet), no Maracanã, instituição federal onde o aluno consegue emprego dentro da sala de aula. Segundo ela, o Cefet hoje tem convênio com cerca de 2.700 empresas, que muitas vezes nem aguardam o estudante concluir o curso para contratá-lo. Não à toa mais de 8 mil candidatos tentaram conseguir uma das 930 vagas ofertadas.
“O porcentual de empregabilidade é muito grande. Não falta emprego. Mas é preciso estar atento às necessidades locais”, diz, contando que três novos Cefets devem ser abertos no Estado do Rio até o fim da gestão de Lula. O de Friburgo vai oferecer cursos de informática, produção têxtil e metal-mecânica. O de Angra dos Reis vai priorizar áreas relacionadas às usinas de energia nuclear e o turismo. E o de Friburgo ainda está em discussão.
CUIDADOS FUNDAMENTAIS
Para André Malhão, diretor da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a análise do mercado é fundamental, e deve ser considerado no processo de expansão, mas em momento algum pode se transformar no ponto principal, com o intuito de produzir mão-de-obra a toque de caixa, e preparada unicamente para um tipo de tarefa. “A escola não pode tratar o estudante como uma máquina, que está pronto apenas para um determinado tipo de tarefa”, ressalta.
Eliezer Pacheco complementa: “A tarefa da escola pública continua sendo a de formar cidadãos”.
Na Escola Politécnica da Fiocruz, que nos dois anos últimos anos obteve o melhor desempenho do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) entre as escolas públicas do Rio, o currículo vai além do pragmatismo, e dá espaço também para aulas de filosofia, além de atividades culturais. Há também exigência de monografia de conclusão de curso. Lá o ensino médio é ministrado junto com o ensino técnico, mas é possível também, assim como no Cefet, optar por fazer apenas as disciplinas da área profissional.
“O importante é oferecer uma formação mais humanista ao profissional”, salienta Cláudio Ribeiro, um dos coordenadores da escola politécnica.
Governo pretende duplicar unidades no País
Rodrigo Morais
O pacote para o ensino técnico do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, antecipado pelo Estado na quarta-feira da semana passada, tem por objetivo mais do que duplicar a rede federal - hoje são 138 unidades, devendo passar a ser 288.
Outra novidade será a transformação dos atuais Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefets) em Institutos de Ciência e Tecnologia, a partir de uma nova figura jurídica que concederá autonomia semelhante àquela de que gozam as universidades.
Isso permitirá, por exemplo, aos institutos, dedicados exclusivamente à formação técnica e tecnológica e ao ensino de ciências, criar cursos e campus sem pedir autorização ao MEC. Uma de suas funções será formar professores para o ensino básico nas áreas de ciências, física, química e matemática, em que há déficit de 200 mil profissionais.
As cerca de 30 escolas técnicas e agrotécnicas ligadas às Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes) também são alvo do pacote. Hoje praticamente abandonadas, em sua maioria, excluídas dos projetos pedagógicos universitários, elas seriam transformadas em autarquias.
Uma vez que a expansão do ensino técnico terá como conseqüência lógica uma maior número de estagiários e aprendizes, o governo criou uma estratégia para evitar que eles sejam usados como mão-de-obra barata.
Para isso, uma mudança na legislação deve limitar o período do estágio, o número de horas de trabalho e restringir os locais onde essas funções podem ser exercidas. Os estagiários e aprendizes não poderão trabalhar como operários ou produzir mercadorias para venda.