Transporte coletivo: esse balão vai agüentar?
Transporte coletivo: esse balão vai agüentar?
Almiro Marcos
Estupefato. Foi assim que fiquei quando foi concluído levantamento a respeito da quantidade de irregularidades em veículos do transporte coletivo da Região Metropolitana de Goiânia. De 142 veículos fotografados pelo repórter fotográfico Diomício Gomes, 69 apresentaram problemas como multas em aberto, muitas com mais de três anos, e atrasos no pagamento de licenciamento e do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). Os dados foram tema de reportagem do POPULAR de 5 de abril.
Em primeiro lugar pensei como motorista. Imaginei se conseguiria circular pela cidade, impune e livremente, com meu carro com anos de IPVA atrasado e carregado de multas. A resposta óbvia é não. Daí se imagina como é que muitos ônibus conseguem essa proeza? O comandante do Batalhão de Trânsito deu uma justificativa muito simples, a de que os veículos que transportam passageiros diariamente não podem ser parados por uma blitz. Ele não deixa de ter razão, afinal de contas se a polícia for começar a fazer fiscalização nos ônibus nas ruas o transporte de passageiros ficaria praticamente inviável. E os números da reportagem citada não me deixam mentir.
Por falar em passageiros, cheguei à segunda preocupação com relação à situação dos ônibus. Me imaginei, quando ainda utilizava o transporte coletivo, rodando por aí tranqüilamente como se estivesse na mais perfeita segurança. Nem de longe imaginaria, como os usuários hoje não imaginam, que muitos dos veículos que os carregam estão com tantas pendências. Outra questão é como confiar em um transporte com multas por avanço de sinal e excesso de velocidade? E onde fica a segurança? Antes que venham a colocar a culpa nos motoristas é preciso se lembrar que eles são contratados por empresas e que cabe a elas impor a sua política.
As empresas justificam que a existência de multas ou de IPVA atrasados pode ser um problema no sistema de informações on-line do Detran, que não teria dado baixa em infrações já pagas, ou mesmo resultado da transferência de veículos que são comprados usados, fora de Goiás, e que já estariam com multas. Neste último caso não foi encontrada nenhuma multa referente a outra unidade da Federação. Todas eram de Goiás.
E no outro caso, mesmo que o sistema do Detran tenha apresentado algum erro, é muito pouco provável que as informações de 142 veículos escolhidos aleatoriamente estejam totalmente incorretas. Mesmo que o número de 69 ônibus com multas e atraso de impostos seja menor, essa irregularidade não pode existir. As empresas exploram um serviço público e recebem para isso. Portanto, nada mais justo do que darem exemplo e andarem na linha (com perdão do trocadilho). Quem deveria se colocar como exemplo é a Metrobus, empresa que tem como principal acionista o governo. Mas ela é a que dá o pior exemplo. De 28 ônibus da empresa fotografados e que tiveram as placas checadas no sistema do Detran, 27 apresentaram problemas. A maioria dos impostos dos ônibus verificados foi paga pela última vez em 2004.
A quem interessa receber impostos como o IPVA? No caso goiano, interessa principalmente ao governo estadual. Esse mesmo Estado que não abre mão de cobrar tributos do cidadão comum, faz vistas grossas para os atrasos da Metrobus. Será que essa falta de preocupação só acontece porque a empresa pertence, em maior parte, ao próprio governo?
O presidente da Metrobus justificou que os problemas não são desconhecidos do governo, o qual estaria devendo R$ 300 milhões à empresa por conta do subsídio no Eixo Anhanguera. Então, como o governo deve à Metrobus e ela deve impostos ao Estado é só fazer um encontro de contas. Enquanto isso vem sendo adiado, os ônibus continuam circulando, irregulares, sem serem incomodados. Se a moda pega, qualquer cidadão que tiver uma conta a receber do Estado vai se ver no direito de adiar o pagamento de qualquer imposto até fazer um “encontro de contas”.
No meio de tantas justificativas injustificáveis volto à questão do usuário, fazendo referência também a um assunto da moda: o apagão aéreo. Os controladores de vôo, com reivindicações antigas, se acharam no direito de parar todos os aeroportos do País. O recado era para o governo federal. Mas adivinha quem sofreu na pele? Justamente ele: o usuário, aquele que paga a conta e paga o pato. No caso específico do transporte coletivo da Grande Goiânia também sempre foi assim. O usuário foi sempre o maior prejudicado por qualquer coisa que aconteça de errada, seja ela de ordem operacional (como atrasos) ou em crises como a do transporte alternativo.
A Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC) tem nas mãos um problema para resolver, como naquela brincadeira do balão que vai enchendo, enchendo até estourar. Ela pode escolher se vai resolver isso agora ou se vai esperar o balão encher mais. O momento crucial para a CMTC é a licitação que está sendo organizada para acontecer em meados deste ano. Com ela, a companhia espera zerar todos as questões pendentes do transporte coletivo, que já vêm se arrastando há décadas sem solução. Com novas ou com as mesmas empresas operando o sistema, a expectativa da CMTC é que problemas como os verificados pelo POPULAR não venham a ocorrer. Porque, a partir de então, existirão regras que hoje não têm como serem cumpridas. A questão é saber se até lá esse balão não terá explodido.
Almiro Marcos é jornalista do POPULAR