Calouros de licenciatura têm piores notas da UFG
Calouros de licenciatura têm piores notas da UFG
Levantamento da universidade revela que alunos oriundos das escolas públicas são maioria nos cursos
de licenciatura e ingressam na instituição com nota baixa
Carla Borges
É muito, muito difícil conseguir uma das 110 vagas do curso de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG). O ponto de corte no último vestibular da instituição (menor nota do último classificado) foi de 205,50 em 300 pontos possíveis. Mas também é muito, muito fácil ser aprovado para os cursos menos concorridos, principalmente as licenciaturas. O ponto de corte do curso de Letras/Português, no período vespertino, em Goiânia, foi 75,25, no mesmo universo de 300 pontos possíveis. No interior, é ainda mais fácil. Para conseguir uma vaga em Física no período noturno na UFG em Jataí, bastou ao candidato chegar a 34,25 pontos, ou pouco mais de 11% da nota máxima. No câmpus de Catalão, a nota mínima para aprovação em História no período noturno foi de 43,25.
Esses são os cursos em que os estudantes oriundos de escolas públicas são a maioria. Os dados foram revelados pelo levantamento socioeconômico-cultural realizado pela instituição no ato da matrícula com os calouros dos 87 cursos de graduação. No último domingo, O POPULAR mostrou a elitização da universidade: dos 531 alunos aprovados para os dez cursos mais concorridos da instituição, 87,9% fizeram o ensino médio em escolas particulares, realidade inversa à das graduações menos disputadas. Mas é nestas últimas que vão se formar os futuros professores das redes pública e particular. A situação preocupa a própria UFG, que estuda mecanismos para permitir a entrada dos egressos de escolas públicas em todos os cursos, inclusive nos mais concorridos, por meio de cotas ou bônus.
Um aluno que, hipoteticamente, decidir marcar uma mesma alternativa para todas as respostas das provas da primeira fase do vestibular, que é objetiva (de escolha de opções de “a” a “e”), pode acertar 20% do total de pontos nessa fase, que é de 90, e acumular 18 pontos. Chegando à segunda fase, onde as provas valem 210 pontos (somando-se as duas fases, o total é de 300), se ele conseguir fazer uma redação razoável e obtiver 20 pontos (ela vale 40), terá 38 pontos, o suficiente para aprovação em vários cursos de licencitura no interior do Estado (veja quadro). A concorrência elevada é um fator que desestimula estudantes de escolas públicas - por uma série de fatores menos preparados do que os da escola particular - a desistir dos cursos considerados nobres.
Concorrência
No último vestibular, 36,98 candidatos disputaram cada vaga para Medicina. No curso de Física, a proporção foi de 3,63; no de Letras, 2,21; Matemática, 3,13. O curso de Física no período noturno em Jataí, em que os estudantes tiveram as piores notas de todo o processo seletivo da UFG no ano passado, ofereceu 40 vagas, mas teve 20 candidatos inscritos. A proporção foi de meio candidato por vaga. Para o curso de Ciências Biológicas em período integral, também em Jataí, a disputa foi de 0,83 candidato por vaga. A queda na procura por cursos de licenciatura é realidade em todo o País. Em Goiás, ela ficou evidente no último concurso da Secretaria Estadual da Educação, em que houve dificuldade para contratação de professores de disciplinas como física e matemática.
Particular
Dos aprovados para Medicina na UFG, 90% fizeram o ensino médio somente em escola particular, 80% fizeram cursinho e 83,64% pretendem se manter no período de faculdade com dinheiro dos pais, realidade totalmente diferente para os calouros de licenciaturas. Os que cursaram o ensino médio apenas em escolas públicas são 60% no curso de Física em Goiânia, 57,17% no de Letras e 70,59% no de Física em Jataí, onde 88,24% não fizeram cursinho e 82,35% pretendem se manter trabalhando. Dos alunos de Letras, 65,71% nunca freqüentaram um curso de línguas e 57,14% pretendem trabalhar enquanto fazem a graduação. Entre os calouros de Física de Jataí, 88,24% não fizeram cursinho e 82,35% vão trabalhar enquanto estudam.
A renda familiar foi outro dado pesquisado pelo estudo socioeconômico-cultural da UFG. Entre os estudantes de Direito, por exemplo, 10% vivem em famílias com renda familiar mensal superior a 12 mil; entre os de Medicina, 68,1% têm renda familiar superior a R$ 3 mil. Entre os estudantes de Letras em Goiânia, 48,57% vêm de famílias com renda familiar entre 301 reais e 900 reais; entre os de Física em Goiânia, 33,33% enquadram-se na renda familiar de R$ 901,00 a R$ 1,5 mil; entre os calouros de Física de Jataí, 52,94% têm renda familiar de 301 reais a 900 reais. Questionados sobre o que gostariam que a UFG oferecesse como serviço complementar, mais de 50% dos calouros de licenciaturas (84,29% entre os de Letras) gostariam de receber uma bolsa de trabalho.