Jovens pobres estudam menos que os ricos

Jornal O Popular, 08/07/2007

Jovens pobres estudam menos que os ricos

Estudo do Ipea revela que está caindo o número de matrículas no ensino médio, principalmente nas classes mais baixas

Rosane Rodrigues da Cunha

Um estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre a freqüência dos adolescentes brasileiros à escola mostra um dado preocupante quanto ao futuro dos jovens no Brasil. Embora revele que nos últimos anos o País tenha experimentado um aumento no número de matrículas e indique que, em 2004, 82,2% dos jovens de 15 a 17 anos freqüentavam a escola, o Ipea aponta que apenas 45,1% desses jovens, ou seja, menos da metade deles, cursava o ensino médio, que é a fase que deveriam freqüentar nessa faixa etária. O levantamento - incluído no relatório divulgado no início da semana pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação - revela que a presença no ensino médio desses jovens pertencentes à classe com renda familiar per capita mais baixa é cerca de 75% menor do que a registrada entre adolescentes da classe com renda mais alta.

Aos 23 anos, casado e pai de um bebê de dois meses, Maurício Cintra sente na pele essas conseqüências negativas da falta de estudo. Em 2003, sem conseguir conciliar a puxada rotina de trabalho em um lavajato durante o dia e as aulas da 7ª série no período noturno, Maurício abandonou a escola. Sonhava em ingressar no ensino médio, mas não chegou sequer a concluir o fundamental. Desempregado, esbarra na baixa escolaridade para conseguir um bom emprego. Recentemente, candidatou-se a uma vaga em uma fábrica de embalagens. Pleiteava um salário mínimo e um cargo de embalador.

“Não fui contratado porque não tenho a escolaridade exigida”, diz, citando apenas um dos nãos que recebeu na busca por um trabalho. Ele lamenta ter deixado a escola, mas recorda que não tinha outra opção. “Chegava muito cansado às aulas e não conseguia prestar atenção”, diz Maurício, que ainda pretende voltar a estudar. Morador do Residencial Real Conquista, ele, por enquanto, sonha apenas com um trabalho que lhe permita sustentar a família.

Menos oportunidades
O drama de Maurício é mais um problema provocado pela defasagem entre a idade e a série cursada mostrada pelo Ipea. De acordo com o instituto, desde de 2005, vem ocorrendo uma queda nas matrículas no ensino médio, que tem atingido, principalmente, os alunos de classes socioeconômicas mais baixas. Considerando que o mercado de trabalho está cada vez mais exigente quanto à formação escolar dos trabalhadores e que, há muito, a conclusão do ensino fundamental, que inclui o antigo primário e o ginásio, deixou de ser um passaporte para o acesso aos empregos, jovens sem o ensino médio têm reduzidas chances de conseguir um trabalho formal e menos ainda a oportunidade de conquistar um bom salário.

O resultado dessa equação pode ser desastroso: sem estudo, o jovem de baixa renda não consegue um bom emprego e sem uma remuneração e um trabalho adequados não consegue romper o ciclo de miséria em que se encontra.


Problema similar ao de 50 anos atrás

Priorizar a Educação, destinando ao setor não apenas os porcentuais mínimos exigidos pela legislação, mas investindo no ensino para transformar a realidade e impulsionar o desenvolvimento do País. Essa é a receita que a educadora Maria do Rosário Cassimiro acredita que os governos federal, estaduais e municipais deveriam seguir para mudar a Educação no Brasil e romper o ciclo que afasta a população de baixa renda da escola e inibe seu acesso aos melhores empregos e à melhoria das condições socioeconômicas.

Com 56 anos dedicados à Educação, a ex-reitora da Universidade Federal de Goiás (UFG) e atual presidente do Conselho Estadual de Educação não esconde uma dose de irritação quando avalia a educação no Brasil. Ela conta que vê hoje problemas similares aos que via há meio século. “Nesse período, a Educação no Brasil poderia ter melhorado muito, mas ainda temos problemas graves”, diz.

Um deles, que está por trás da evasão dos alunos de baixa renda, segundo Maria do Rosário, é a falta de atrativo no ensino. Desestimulados, os alunos ou deixam a escola, abandonando os estudos e alimentando tríade baixa escolaridade-desemprego-miséria, ou persistem e chegam despreparados ao ensino superior, também sustentando o ciclo que gera professores malpreparados que vão preparar mal seus alunos.