Radioterapia contra cegueira

Jornal Diário da Manhã, 02/08/2007

Radioterapia contra cegueira

Wanda Oliveira

A radioterapia com estrôncio-90 é a mais nova esperança para o tratamento da degeneração macular relacionada à idade (DMRI) no Brasil. A técnica, usada ainda em fase experimental nos Estados Unidos, já produz resultados satisfatórios em pacientes acima de 55 anos. O método será uma das principais novidades do XXXIV Congresso Brasileiro de Oftalmologia, em Brasília. O evento acontecerá de 3 a 6 de setembro, no Centro de Cultura e Convenções de Brasília, e será presidido pelo oftalmologista Marcos Ávila, pioneiro no estudo da técnica em Goiás e pesquisador da Universidade Federal de Goiás (UFG).
Segundo ele, durante o congresso são esperados cinco mil participantes. Entre os palestrantes, estarão especialistas dos EUA, da Europa e da América do Sul. Este é o segundo maior encontro da classe oftalmológica mundial. Marcos Ávila comemora o resultado em relação à aplicabilidade da radioterapia e aposta que o método poderá ser empregado em breve nos principais países do mundo, inclusive no Brasil. “A esperança é de que o trabalho seja promissor no tratamento da doença, embora os resultados sejam preliminares.”
A Universidade Federal de Goiás (UFG) é responsável pelo desenvolvimento do estudo. Durante dois anos, 34 indivíduos participaram da pesquisa. Destes, 80% voltaram a enxergar o que viam antes de maneira distorcida. A radioterapia visa a substituir aplicações injetáveis.
A nova técnica emprega a irradiação para impedir o crescimento de uma mancha escura – espécie de miniferida – na retina. A aplicação é feita através de uma cânula no formato de caneta esferográfica. O isótopo de estrôncio-90 leva de três a quatro minutos para penetrar no centro da membrana neovascular e realizar a sessão radioterápica. A anestesia é local.
O paciente volta no mesmo dia para casa com o olho coberto por curativo. Ao todo, a microcirurgia demora 40 minutos. Geralmente, nenhuma mudança na coloração é observada no final do tratamento. Os retornos são feitos no dia seguinte e uma semana após, para análise médica.
Atualmente, a degeneração macular atinge cerca de 5 milhões de brasileiros. Quando trata-se da população mundial, os números são alarmantes. Cerca de 300 milhões de pessoas são afetadas pela atrofia da retina, responsável pela captação da imagem enviada ao cérebro pelo nervo óptico. A enfermidade relacionada à idade é uma das principais causas de cegueira no planeta. O tratamento em fase precoce pode evitar a perda ocular e estagnar a formação e o avanço da neovascularização.
A doença deverá ter um crescimento alarmante devido ao aumento da expectativa de vida da população. No Brasil, calcula-se que 100 mil novos casos surjam a cada ano. Segundo o médico e pesquisador da UFG Marcos Ávila, com o novo tratamento, 80% dos pacientes que tinham degeneração macular em estado avançado apresentaram estabilização ou melhora da visão central. “Eles conseguiram detectar cores e números, letras, e até mesmo voltaram a ler e dirigir, tarefas que antes eram difíceis de serem realizadas”, diz.
Ele explica que inicialmente portadores desta lesão vêem os objetos distorcidos, o que prejudica leitura e visão de detalhes e cores. A professora do curso de Música da UFG Neve Ione Ribeiro Guimarães, 61, faz parte do grupo de 34 pacientes testados com a técnica de estrôncio-90. O caso foi bem-sucedido. Hoje ela consegue enxergar perfeitamente. “Parece que nunca tive problema na visão. Voltei a enxergar perfeitamente.”
Neve descobriu que era portadora da DMRI há dois anos. Do olho esquerdo, perdeu a visão, mas, com ajuda da radioterapia, recuperou do direto. Com o problema resolvido, voltou a fazer tarefas que tanto gosta, como ler, tocar piano e dirigir. Marcos Ávila explica que, embora seja doença incapacitante, não provoca perda total da visão. “A radioterapia serve para destruir essa miniferida que cresce e forma uma fibrose cicatricical.” A doença atinge mais pessoas de pele clara e com histórico familiar.