Sem-terra na universidade

Jornal Diário da Manhã, 04/09/2007

Sem-terra na universidade

Ivair Lima
Da editoria de Cidades, da Cidade de Goiás

Francisco Erivando Santos de Sousa, 28, nasceu em Quixermobim, no Ceará. Filho de pais camponeses sem-terra, é o segundo de uma prole vasta: 11 irmãos. O destino fará com que Erivando se destaque de seus parentes. Ele terá a chance de ter um diploma universitário, caso conclua, como pretende, o curso de Direito. Ele é um dos 60 estudantes de 16 Estados, provenientes de todas as regiões do Brasil, que estão na cidade de Goiás (135 quilômetros de Goiânia) para freqüentar curso especial para integrantes dos movimentos sem-terra oferecido pela Universidade Federal de Goiás (UFG).

Francisco diz que não teria nenhuma possibilidade de fazer um curso universitário sem as condições especiais que encontra em Vila Boa. “Sempre quis estudar as leis porque acho que os trabalhadores rurais perderam muitas causas por não terem advogados, mas não via como. Acho que nossa turma vai fazer uma ponte entre demandas e instâncias da Justiça,” sonha o calouro.

O coordenador do curso, professor de Direito Penal José do Carmo Alves Siqueira, diz que a grade curricular é idêntica à da Faculdade de Direito da UFG, em Goiânia. A duração do curso, as matérias e os professores são exatamente os mesmos. O calendário é diferenciado. Em Goiás, as aulas são em período integral e acontecem em março, abril e maio no 1º semestre e agosto, setembro e outubro, no 2º semestre. Outra particularidade é que as aulas vão ser realizadas de terça a sábado.

José do Carmo lembra que o curso cumpre a Constituição Federal e garante a todos trabalhadores do campo o direito à educação, inclusive o ensino superior. Os estudante que estão em Goiás recebem ajuda do goveno federal para alimentação e moradia. O processo de seleção envolveu 600 interessados. Destes, 210 passaram por um exame vestibular e 60 foram aprovados.

Os estudantes são militantes ou filhos de militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), oriundos de famílias atingidas por barragens, ou residentes em quilombos. Em Goiás, dizem, estão aprendendo a conviver com diferenças culturais deles próprios e descobrindo um mundo novo.

Diorlei dos Santos, 27, de Pitanga, no Paraná, filho de assentado da reforma agrária, afirma que a diferença de temperatura é de 30º C e o ambiente universitário foi uma surpresa. “Vivi no assentamento desde os quatro anos de idade e hoje atuo na área política do MST. Para mim, é tudo novo, é uma experiência nova e interessante porque estamos compreendendo a dimensão geográfica do Brasil e aprendendo a conviver com a diferenças.”