Apesar de você...

Jornal O Popular, 02/10/2007

Apesar de você...

Vilmar Rocha

Em entrevista à Revista Piauí, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou como expressão de pessimismo e desesperança que o “Brasil é isso mesmo que está aí... continuaremos nessa falta de entusiasmo, nesse desânimo”. Diferente da China e da Índia que cresceram muito nos últimos anos.

Na inauguração de Brasília, depois de realizar o governo mais progressista e democrático do século 20, Juscelino Kubitschek disse: “Deste Planalto Central, desta solidão que em breve se transformará em cérebro das altas decisões nacionais, lanço os olhos mais uma vez sobre o amanhã do meu País e antevejo esta alvorada com fé inquebrantável e uma confiança sem limites no seu grande destino”. Quanta diferença! Fernando Henrique não conhece o Brasil profundo, a sua alma e o seu povo. É no fundo um scholar, um sociólogo.

Como deputado federal no período de seus dois mandatos (1995/2002), apoiei por convicção o seu governo, cujo saldo político e administrativo considero positivo, em especial a estabilidade monetária e o aperfeiçoamento democrático. Lembro-me de que no dia 12 de setembro de 1996, a convite do então deputado Franco Montoro, junto com quem participava da luta pelo parlamentarismo, participei de um longo almoço no Palácio da Alvorada com o presidente FHC e um grupo restrito de seis deputados: eu, Franco Montoro, Almino Afonso, Aloísio Nunes Ferreira, João Almeida e Bonifácio de Andrada.

Na conversa, disse ao então presidente FHC que ia votar a favor da reeleição, mesmo quebrando uma regra republicana da Constituição de 1891, por entender que a experiência internacional de mandatos mais longos – EUA, Inglaterra, Alemanha, Espanha –, foi positiva no sentido de que reformas profundas e estruturais precisam de tempo mais longo para a sua implantação.

Disse a ele que seria medíocre politicamente se não fizéssemos uma reforma política profunda no seu segundo mandato e, com a reeleição, ele estaria forte politicamente para liderar a reforma política que seria a principal para consolidar as instituições republicanas e aprofundar o processo de democratização do Brasil. Aparentemente ele concordou com a idéia.

Reeleito, Fernando Henrique descomprometeu-se. Não teve coragem e determinação para aprofundar e ampliar as reformas. Não liderou com convicção a articulação a favor da reforma política. Empregou grande parte do tempo do segundo mandato em viagens internacionais, palestras para estudantes em universidades do exterior, em receber títulos de doutor honoris causa.

Este não é o papel de um presidente da República, de um homem de Estado de um País grande, complexo e importante como o Brasil. Este papel seria adequado aos Prêmios Nobel, aos filósofos ou cientistas cujos estudos ou ações contribuíram verdadeiramente para melhorar a humanidade.

O Brasil avançou muito no último século. As estatísticas demonstraram que foi um dos países que mais cresceram no período. Está se modernizando. A qualidade de vida do povo melhorou significativamente mesmo com o impacto de um crescimento populacional explosivo – a população triplicou em apenas 50 anos.

A despeito da miséria, da violência e dos políticos medíocres, populistas e irresponsáveis, o País caminha e com certeza pela força e a alma de seu povo alegre, solidário e sem preconceitos. Por tudo isso, eu acredito e tenho esperanças de que o Brasil será uma das mais importantes

Nações do mundo no século 21.

Apesar de você... amanhã há de ser outro dia.

Vilmar Rocha é professor de Direito Constitucional da UFG