Transfusão provoca perda de qualidade
Jornal Diário da Manhã, 14/10/2007
Transfusão provoca perda de qualidade
Matheus Álvares Ribeiro
da Editoria de Cidades, Com Agência EFE
As transfusões de sangue podem ser prejudiciais para muitos pacientes, porque o sangue doado perde um gás que permite a transferência de oxigênio aos tecidos do corpo, segundo dois estudos divulgados na segunda-feira, 8. “Milhões de pacientes recebem transfusões de sangue cuja capacidade de levar oxigênio está comprometida”, assinalaram os pesquisadores do Centro Médico da Universidade de Duke, que publicaram os estudos na revista Proceedings of the Natural Academy of Sciences.
“O sangue pode salvar uma vida, mas não ajuda da forma como esperávamos e em muitos casos pode ser prejudicial”, disse Jonathan Stamler, pesquisador-chefe de um dos estudos. A chave está no óxido nítrico, um componente do sangue, dissolvido no plasma, que favorece a dilatação dos vasos sanguíneos abertos e assim permite a transferência de oxigênio dos glóbulos vermelhos aos tecidos.
O óxido nítrico (ou monóxido de nitrogênio) é produzido pelas células endoteliais, que recobrem o interior do vasos sanguíneos. É uma das muitas substâncias dissolvidas no sangue e que regulam a distribuição de oxigênio para as células. Os estudos demonstraram que este gás começa a se decompor quase que imediatamente depois que o sangue sai do corpo do doador. “Surpreendeu-nos a velocidade com que o sangue muda. Vimos sinais claros da diminuição do óxido nítrico nas primeiras três horas”, afirmou Timothy McMahon, que dirigiu um estudo que analisou durante intervalos regulares a composição química do sangue doado.
Além de abrir os vasos, o óxido nítrico dá flexibilidade aos glóbulos vermelhos. À medida que seu nível cai, essas células endurecem, o que torna mais difícil que se deformem para passar pelos minúsculos vasos capilares, segundo os especialistas da Universidade de Duke. Sem óxido nítrico, os vasos capilares não se dilatam, os glóbulos vermelhos se acumulam nas artérias e os tecidos não recebem oxigênio, segundo Stamler, cujo estudo descreve pela primeira vez a função desse gás. “O resultado pode ser um ataque do coração e inclusive a morte”, alertou o médico.
O biomédico do Banco de Sangue do Hospital das Clínicas (HC) e professor da Universidade Católica de Goiás (UCG) Pedro Ludovico de Goiás e Silva afirma que os resultados dessa pesquisa devem ser analisados de acordo com a forma como este sangue foi manipulado. Segundo ele, a coleta de sangue é feita em sistema fechado, ou seja, sem que nenhum dos componetes entre em contato com o ambiente externo. “É preciso entender em quais condições foram feitos estes estudos”, explica.
O professor relembra que hoje praticamente não se usa sangue total (com todos os seus componetes misturados). Isto garantiria uma maior duração dos componentes que se perdem em prazos distintos. Em condições adequadas de conservação, por exemplo, as hemáceas (glóbulos vermelhos) duram até 42 dias, as plaquetas (responsáveis pela coagulação), até cinco dias e o plasma, que corresponde à parte líquida do sangue, pode durar até um ano se congelado. “A separação dos componentes permite que os elementos sejam conservados de acordo com suas potencialidades”, afirma.
Em um experimento para tentar reverter o problema, Stamler e sua equipe acrescentaram óxido nítrico ao sangue injetado em cachorros, o que aumentou o fluxo sanguíneo que chegava ao coração. “Isto mostra que acrescentar óxido nítrico ao sangue humano poderia, em teoria, melhorar sua capacidade de dilatar os vasos sanguíneos e com isso prevenir os ataques do coração e inclusive a morte”, declarou o pesquisador Stamler. Só que cientistas recomendam mais testes em humanos.