Pela sobrevivência do Rio Araguaia

Jornal O Popular, 18/10/2007

Pela sobrevivência do Rio Araguaia

Thiago Morato de Carvalho

O solo é um recurso natural indispensável para qualquer nação, não só para atividades econômicas mas também como indicador de processos e mecanismos de evolução da própria paisagem – ou seja, a dinâmica da paisagem está diretamente relacionada com a história do solo. Entretanto, o uso indevido pode contribuir para a degradação, com resultados nefastos à economia e à sociedade, podendo comprometer o desenvolvimento sustentável devido aos processos erosivos que cada vez mais são intensificados.

Os processos erosivos acarretam um aumento na produção de sedimentos (material particulado formador do solo, como areias e argilas – barro), os quais são transportados pelo escoamento para os fundos de vales e corpos d’água como sistemas lacustres (grande número de lagos), reservatórios de água e canais fluviais (rios e córregos). A produção em excesso de sedimentos (maior que a capacidade do sistema natural de transportar), traz grandes prejuízos ao meio ambiente por gerar a formação de depósitos, matar a vegetação ripária e mudar a qualidade dos recursos hídricos, comprometendo a fauna aquática e até mesmo provocando a morte de canais fluviais e de nascentes.

Como parte do planejamento de controle da erosão, a quantificação do potencial de perda de solo num processo erosivo é importante não apenas para a identificação de áreas suscetíveis e críticas em termos de riscos, mas também para o planejamento conservacionista regional e local dos recursos hídricos. Modelos de simulação – como os de predição de erosão hídrica, através dos quais pode-se estimar a taxa de produção de sedimentos para a bacia como um todo – são ferramentas importantes para o monitoramento dos recursos hídricos e das práticas de uso das terras adequadas, como as agropecuárias.

A intensificação da produção de sedimentos na alta bacia do Rio Araguaia, devido a práticas agropecuárias, já é perceptível no canal do médio Rio Araguaia. Pesquisadores quantificaram a taxa dos processos erosivos e de transporte de sedimentos no Araguaia, e constataram que a partir de 1965 a dinâmica da planície aluvial sofreu grandes modificações em sua morfologia. Essas modificações na morfologia do canal são evidentes: com o aumento em 150% das barras arenosas de 1965 a 1998, cerca de 233 milhões de toneladas de sedimentos foram armazenadas no canal do médio Araguaia, assim como houve um notável aumento da taxa de transporte de sedimentos no rio, com um incremento na ordem de 300 mil toneladas por ano no trecho de Aruanã e Luís Alves.

A equipe de pesquisadores (da qual faço parte ao lado da doutora Selma Simões de Castro, do Laboratório de Geologia e Geografia Física do Instituto de Estudos Sócio-Ambientais e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da UFG) vem realizando mais estudos para promover uma profunda caracterização dos processos erosivos e de transporte de sedimentos tanto na alta e média bacias hidrográficas do Araguaia como dentro do próprio canal do rio. Um maior conhecimento desses fenômenos é fundamental para entender a dinâmica desse belo sistema fluvial, o maior do Cerrado (embora fatores históricos tenham levado a crer que o Tocantins fosse o principal rio). O Araguaia navega por terras sertanejas até o grande domínio da mata amazônica, indo desaguar no Oceano Atlântico. Necessitamos, e devemos, com urgência, antes de querer dominar e alterar a natureza... compreendê-la!

Thiago Morato de Carvalho, pesquisador do Labogef e doutorando em Ciências Ambientais na UFG, é membro da Expedição Araguaia