Sexo sem identidade
Jornal Diário da Manhã, 05/11/2007
Sexo sem identidade
Moacir Cunha Neto
DA EDITORIA DE CIDADES
O sonho de ter o sexo psicológico em conformidade ao anatômico leva os transexuais a empreender verdadeiras batalhas, inclusive na Justiça. Primeiro, para a realização da cirurgia, que pode custar na rede particular até R$ 20 mil. Depois, na hora de lutar pelo direito de mudar o nome no documento de identidade. Mas o preconceito ainda é forte barreira à inclusão social de transexuais que optaram pela cirurgia de transgenitalização para a mudança do sexo biológico.
Com 25 anos, a transexual Clara Bela de Azevedo aguarda há três o direito de ter o corpo que sempre desejou, o de mulher. Após passar por tratamento e acompanhamento de profissionais de psicoterapia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC-UFG), ela conta os dias para a cirurgia, marcada para 2008. O preconceito, segundo ela, ainda é a barreira que os transexuais têm de enfrentar. Na rua ou agência bancária, a discriminação marca quem deseja mudar de vida.
NOME
Para mudar o nome na identidade, os transexuais têm de buscar o direito na Justiça. A maior dificuldade é registrada em Goiás, sendo que, na identidade, após a mudança, deve constar que a alteração ocorreu devido à mudança cirúrgica de sexo.
Segundo a psicóloga Bete Fernandez, transexual, os juízes das varas de Fazenda Pública municipais erram ao exigir que seja estampada a inscrição “sexo feminino cirurgiado.” “Só reforça o preconceito contra o transexual.” Até o fechamento desta edição, não foi possível localizar juízes das varas de Fazenda para tratar do assunto.
Preconceito é o desafio
A advogada Helena Maria Ribeiro diz que Goiás é considerado o Estado mais homofóbico e a atitude dos juízes leva a crer que regiões mais politizadas já venceram a barreira do preconceito.
A cirurgia de mudança de sexo é feita em Goiás desde 2001. Só este ano já foram realizados seis procedimentos. A intervenção cirúrgica, realizada pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás, é de alta complexidade. Mas o Sistema Único de Saúde (SUS) cobre apenas a amputação do pênis e testículos. A transgenitalização é realizada por profissionais voluntários empenhados em mudar a realidade dos transexuais.
A professora de ginecologia Mariluza Terra Silveira, coordenadora do programa de transgenitalização do HC-UFG, lembra que o maior desafio é vencer o preconceito, especialmente durante a mudança do nome. Antes da cirurgia, o maior desejo dos transexuais é o procedimento, que efetiva a adequação do sexo. Em seguida, vêm os transtornos para mudar o nome no documento de identidade.
Segundo ela, a cirurgia pode ser feita na rede particular a um custo estimado de até R$ 20 mil. Lamenta que o SUS pague apenas a amputação dos órgãos, ficando a cargo da equipe do HC a construção de clitóris, vulva e amputação da uretra, entre outros procedimentos de alta complexidade.
A cabeleireira Cristiany Santos, 28, há quatro anos se inscreveu para a realização da cirurgia e há dois anos iniciou o tratamento psicológico. “Só depois, sentirei feliz e terei uma vida pessoal e profissional dos meus sonhos, além de conquistar um relacionamento completo.”